Por quanto tempo o Spotify vai sobreviver?

Previsão do tempo para os serviços de streaming de música: fortes tempestades

Paulo Higa
Por
• Atualizado há 1 ano
Spotify

Ou melhor: por quanto tempo os serviços de streaming de música continuarão existindo? Pode soar uma pergunta muito apocalíptica, feita no calor do momento, baseada apenas no recente pedido de falência do Rdio, um dos pioneiros do setor. Mas a verdade é que todos os concorrentes estão na mesma situação e sofrem dos mesmos problemas, em maior ou menor grau.

O Spotify, principal nome que vem à cabeça quando o assunto é streaming de música, nunca conseguiu lucrar e sobrevive com a grana de investidores que acreditam no futuro do negócio. Com a expansão do serviço para novos países, incluindo o Brasil, as receitas obtidas com assinaturas aumentaram, mas o prejuízo também aumentou. A cada ano que passa, o Spotify sangra ainda mais dinheiro.

Em 2011, quando o Spotify ultrapassou as fronteiras da Europa e se internacionalizou, o serviço obteve 187,8 milhões de euros em receita, montante que não foi suficiente para cobrir os gastos: o ano fechou no vermelho, com prejuízo de 45,4 milhões de euros. Não foi diferente nos anos seguintes:

  • Em 2012, faturamento de € 430,3 milhões, prejuízo de € 86,7 milhões;
  • Em 2013, faturamento de € 747 milhões, prejuízo de € 57,8 milhões;
  • Em 2014, faturamento de € 1,08 bilhão, prejuízo de € 165 milhões.

Considerando os prejuízos de 2009 (€ 18,8 milhões) e 2010 (€ 28,5 milhões), o Spotify já acumula perdas de mais de 400 milhões de euros, ou quase 1,7 bilhão de reais. É muito dinheiro e, por mais que os investidores continuem injetando recursos no Spotify, eu me pergunto por quanto tempo eles ainda aguentarão as sucessivas perdas (e por quanto tempo eles continuarão acreditando no negócio). Quem investiu no Rdio, confiando que o serviço um dia se tornaria lucrativo, deu com a cara na parede.

O Deezer, principal concorrente independente do Spotify, não divulga seus relatórios financeiros tão abertamente, mas sabemos que o serviço também não gera lucro, mesmo estando presente em 186 países (o Spotify opera apenas em 58 mercados). Os franceses tiveram faturamento de € 93 milhões no primeiro semestre de 2015, mas prejuízo de € 9 milhões.

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Esses números foram obtidos nos documentos preparados para a abertura do capital do Deezer na bolsa de valores, que foi misteriosamente cancelada, em cima da hora, sem muitas explicações — a justificativa foram as “condições de mercado”, o que é tão esclarecedor quanto dizer que não vou mais escrever para o Tecnoblog devido a “condições de trabalho”.

É curioso notar que 92% (!) da receita do Deezer no primeiro semestre de 2015 veio dos 3,7 milhões de assinantes. Apenas 3,7% do montante foi decorrente da publicidade veiculada para não pagantes, que representam uma minoria no serviço de streaming de música francês — no total, o Deezer afirma possuir 6 milhões de usuários ativos. Em outras palavras: plano gratuito dá prejuízo, e propagandas não cobrem as perdas.

As fontes de receita do Spotify são as mesmas: 91% do faturamento em 2014 veio de assinaturas. E os suecos têm o problema dos números grandes com proporções piores: apenas 20 dos 75 milhões de usuários pagam pela assinatura do Spotify Premium. Como vimos, quanto mais usuários gratuitos, maior o prejuízo, já que os serviços pagam royalties por execução de música, independente do usuário ser assinante ou não.

Taylor Swift

Mesmo com os altos gastos, os serviços de streaming de música não estão agradando justamente os responsáveis pela mercadoria que eles vendem: os artistas. Taylor Swift, o mais famoso entre os inúmeros casos, retirou todas as suas músicas do Spotify alegando que o dinheiro recebido era muito baixo — o Spotify paga entre US$ 0,006 e US$ 0,0084 por execução de música. Diminuir ainda mais o pagamento de royalties não me parece uma solução viável.

Se os custos não diminuem, as receitas precisam aumentar para que as empresas gerem algum lucro. Como? A única alternativa que surge na minha mente é fazer os usuários gratuitos pagarem. É por isso que vemos frequentemente rumores de que o Spotify vai acabar com o serviço gratuito, embora a empresa negue os planos. Só que a própria empresa admite que o plano gratuito é importante para atrair novos pagantes: uma parcela dos usuários decide assiná-lo após perceber a utilidade do serviço. Muitos dos que estão lendo este texto se tornaram pagantes apenas depois de usar o Spotify Free por um bom tempo.

Seria apenas futurologia dizer o que realmente penso sobre o futuro dos serviços de streaming — acredito que Spotify, Deezer e Pandora serão os próximos a morrer, enquanto as opções ligadas a grandes empresas, como Apple Music, Play Música e Groove, sobreviverão pelo simples fato de terem uma companhia lucrativa por trás (os serviços podem até não gerar dinheiro, mas os lucros dos outros produtos da Apple, Google e Microsoft cobrem o rombo e equilibram as contas).

Uma certeza é que, cedo ou tarde, todo mundo precisará se adaptar e mudar seus modelos de negócios, porque o dinheiro não é ilimitado e os prejuízos não se sustentarão por tempo indeterminado (e a falência do Rdio nos mostrou isso da pior forma possível). A outra certeza é: quando o modelo mudar, não será para melhor.

Façam suas apostas.

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Paulo Higa

Paulo Higa

Ex-editor executivo

Paulo Higa é jornalista com MBA em Gestão pela FGV e uma década de experiência na cobertura de tecnologia. No Tecnoblog, atuou como editor-executivo e head de operações entre 2012 e 2023. Viajou para mais de 10 países para acompanhar eventos da indústria e já publicou 400 reviews de celulares, TVs e computadores. Foi coapresentador do Tecnocast e usa a desculpa de ser maratonista para testar wearables que ainda nem chegaram ao Brasil.

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