O que é blockchain? [indo além do bitcoin]

Conheça a história, o funcionamento e as vantagens dessa tecnologia

Jean Prado
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• Atualizado há 1 ano e 2 meses

Falamos muito sobre o blockchain e suas possibilidades aqui no Tecnoblog — mas do que isso se trata, exatamente? Talvez a primeira coisa que venha à sua mente seja o bitcoin, mas o blockchain vai muito além das criptomoedas. Entenda o que é blockchain, como funciona e quais são as suas aplicações.

O que é blockchain e como surgiu?

Apesar de hoje a aplicação do blockchain estar se dissociando do bitcoin, essa tecnologia começou junto com a criptomoeda. O conceito do primeiro blockchain público nasceu em 2008, no artigo acadêmico Bitcoin: um sistema financeiro eletrônico peer-to-peer, publicado por uma pessoa ou grupo sob o pseudônimo de Satoshi Nakamoto (suposto criador do bitcoin).

Criado em um cenário de crise econômica mundial e bolha imobiliária, o bitcoin nasceu para, entre outras coisas, prevenir o gasto duplo dos valores e aumentar a confiança das transações financeiras, levando-as para a internet.

No ambiente digital, os dados podem ser copiados, alterados e trocados. O blockchain foi a solução para eliminar as duas primeiras características: uma pessoa não pode gastar 1 BTC duas vezes ou dizer que te enviou 10 BTC mas transferir apenas 0,01 BTC, por exemplo.

Criptomoeda Bitcoin

Em termos simples: como blockchain funciona?

Eu sei que os termos técnicos não são muito convidativos para o público amplo entender o que é blockchain; só o nome da tecnologia já causa estranhamento. Mas prometo que vou tentar explicar da forma mais simples possível, sem distorções. Vamos lá.

O blockchain é uma rede que funciona com blocos encadeados muito seguros que sempre carregam um conteúdo junto a uma impressão digital. No caso do bitcoin, esse conteúdo é uma transação financeira. A sacada aqui é que o bloco posterior vai conter a impressão digital do anterior mais seu próprio conteúdo e, com essas duas informações, gerar sua própria impressão digital. E assim por diante.

Pronto. Isso é blockchain.

Para ilustrar, veja essa imagem usada por Ronan Damasco, diretor nacional de tecnologia da Microsoft, em sua palestra sobre blockchain na conferência Web.br 2017:

hash bitcoin blockchain
“As grandes invenções às vezes foram muito simples, né?”, comentou Damasco.

Na imagem, já dá para ver alguns termos técnicos, como hash. Não dá para se aprofundar no blockchain sem cair em tecnicalidades, então vamos entender como que esse negócio funciona de verdade.

Aprofundando: qual é a do blockchain?

Antes de falar sobre a cadeia de blocos (blockchain, sacou?), temos que entender como funciona o hash. Agora que podemos encarar termos técnicos, posso dizer que o hash é uma função matemática que pega uma mensagem ou arquivo e gera um código com letras e números que representa os dados que você inseriu.

Essencialmente, o hash pega uma grande quantidade de dados e transforma em uma pequena quantidade de informações. É a “impressão digital” de algum arquivo, ou, no caso do blockchain, de um bloco. Nesse sistema de blocos encadeados, essa impressão digital é fundamental.

O hash vai assinar o conteúdo do bloco; caso qualquer informação seja alterada, o hash muda. Quando você gera um novo bloco que também contém o hash do anterior, cria uma espécie de selo: é possível verificar e sinalizar se algum bloco foi alterado, para então invalidá-lo.

Essas informações de blocos são escritas no ledger, que pode ser traduzido para livro-razão; é onde todas as transações, no caso do bitcoin, ficam gravadas. Depois de escritas, elas não podem ser apagadas.

Cada rede de blockchain também tem “nós”, que agrupam participantes que têm o mesmo interesse; no bitcoin, é transferir dinheiro. Esses nós podem ser tanto transacionais, que escrevem ou geram blocos, quanto mineradores, que verificam se o bloco escrito é válido.

quem valida o bloco recebe uma recompensa

Como você deve ter imaginado, é daí que vem o termo minerar bitcoin. Desde o começo, o blockchain é tão seguro por um mecanismo de consenso de prova de trabalho (PoW, na sigla em inglês), que usa poder de processamento para resolver cálculos matemáticos muito complicados para assegurar que o hash criptográfico do bloco é válido. Quando alguém resolve a operação e consegue validar o bloco, recebe uma recompensa – as outras pessoas da rede também conseguem confirmar que o resultado é correto.

Alex Braz, CTO da Star Labs, explicou na Web.br que esse mecanismo de consenso é comparável ao jogo de puzzle Sudoku: é difícil resolver o problema, mas é fácil verificar se ele está resolvido.

Agora que você já conhece os principais elementos do blockchain, posso dar a definição mais técnica que André Salem, pesquisador do IBM Blockchain, apresentou em sua palestra:

O blockchain é uma rede de negócios segura, na qual os participantes transferem itens de valor (ativos), por meio de um ledger (livro-razão) comum distribuído, do qual cada participante possui uma cópia, e cujo seu conteúdo está em constante sincronia com os outros.

As vantagens do blockchain

Legal, mas quais as vantagens do blockchain? Já é hora de fazer as instituições do país ruírem? Botar fogo na República? Não tão cedo.

o blockchain também é chamado de protocolo da confiança

Tanto o blockchain quanto o bitcoin eliminam intermediários, mas há algumas diferenças entre ambos. Na minha visão, o bitcoin ganhou um viés mais cyberpunk, de derrubar o sistema financeiro e as instituições através da criptografia. Enquanto isso, o papel do blockchain é mais prático: assegurar a confiança entre as empresas — não à toa é chamado também de “protocolo da confiança”.

Além de confiança, outras palavras que ouvi muito nas palestras sobre blockchain que eu frequentei foram responsabilidade, transparência e segurança. Principalmente por conta desses quatro conceitos principais de blockchain, apresentados por Salem:

  • Ledger distribuído: o livro-razão, sistema de registro das transações e blocos, é compartilhado por toda a rede e todos podem ver;
  • Privacidade: é possível garantir a visibilidade adequada para a rede, já que as transações conseguem ser verificáveis. O termo “adequado” é importante; no bitcoin, todas as informações da transação são públicas. No blockchain, partes sensíveis do ledger podem ser ocultadas (como o endereço de alguém), sem prejudicar a verificação do bloco;
  • Contrato inteligente: um documento que não pode ser alterado depois de escrito. É possível firmar contratos e autorizar (ou não) transações de acordo com os termos estabelecidos;
  • Consenso: as transações são verificadas pelos participantes da rede e não podem ser fraudadas;

Graças a toda essa tecnologia, as vantagens e aplicações do blockchain são imensas. Por exemplo, já noticiamos um sistema que agiliza pagamentos internacionais. Como o blockchain elimina intermediários, as transações acontecem em tempo real, com menos custos e sem perder em segurança, já que elas podem ser verificáveis e auditáveis. O risco de fraudes é reduzido por meio de contratos inteligentes.

Sem ir tão longe, o setor financeiro já se beneficia com a característica principal dos blocos que evita gastos duplos e fraudes na escrita; o dinheiro não pode ser copiado, diferentemente de um arquivo. Mas o blockchain tem aplicações além das finanças; veja toda a logística de uma venda funcionando:

“A nova rede da IBM pode possibilitar que um agricultor na Samoa [país da Oceania] faça uma transação com um comprador na Indonésia. O blockchain seria usado para registrar os termos do contrato, gerenciar a documentação do comércio, permitir que o agricultor forneça uma garantia, consiga letras de crédito e finalize a transação com pagamento imediato”, exemplificou a IBM quando apresentou o sistema de pagamentos internacionais.

Inclusive, o setor de logística foi o que teve os maiores exemplos na Web.br. André Salem, pesquisador da IBM, falou sobre a parceria da empresa com a operadora de logística Maersk. O transporte de mercadorias e contêineres ainda é catalogado no papel, o que atrasa diversas entregas e cria inconsistências no processo.

Com o blockchain, seria possível fazer essa operação de forma segura, integrada e descentralizada. As autoridades de exportação conversam digitalmente com os portos e a alfândega e seus termos e documentos são assegurados por contratos inteligentes

Seria possível, por exemplo, firmar um aluguel de imóvel integrando um contrato inteligente do blockchain a uma fechadura inteligente. “No mundo de blockchain, o Airbnb nasceu morto, porque precisa de um intermediário”, disse Ronan Damasco, diretor nacional de tecnologia da Microsoft. Basta a pessoa desbloquear a fechadura que parte do valor pode ser transferido para a conta do proprietário.

E aí?

Antes de ir à conferência Web.br, eu conhecia o blockchain mas não fazia ideia de que a tecnologia já havia sido aplicada em diversos testes. A Microsoft, IBM e outras grandes empresas de tecnologia têm suas próprias iniciativas e consórcios para financiar pesquisas e desenvolver soluções corporativas em blockchain.

Enquanto o bitcoin é criticado como uma bolha sem fundamentos sólidos, muito se fala em uma revolução blockchain. A tecnologia introduzida com a criptomoeda tem milhares de aplicações práticas em diversas indústrias. O blockchain provavelmente não vai tomar conta do mundo, mas uma coisa é certa: a tecnologia não parece ter prazo de validade, como o bitcoin.

*Jean Prado viajou a São Paulo a convite da Conferência Web.br 2017.

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Jean Prado

Ex-autor

Jean Prado é jornalista de tecnologia e conta com certificados nas áreas de Ciência de Dados, Python e Ciências Políticas. É especialista em análise e visualização de dados, e foi autor do Tecnoblog entre 2015 e 2018. Atualmente integra a equipe do Greenpeace Brasil.

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