Cidades do futuro terão ciclovias que acendem e postes inteligentes

De um futuro não muito distante: essas ideias já estão sendo testadas

Emerson Alecrim
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• Atualizado há 9 meses
Ciclovia acesa

Carros autônomos, prédios moderníssimos, sistemas de transporte público altamente eficientes, redes de comunicação de grande capacidade. Cogitamos tudo isso e mais um pouco quando pensamos em como as cidades bem evoluídas serão nas próximas décadas. Mas um detalhe importante às vezes passa despercebido nesses exercícios de futurologia: mais do que nunca, as cidades precisarão ser sustentáveis.

Por ser recorrente, esse assunto soa até maçante, eu sei. Mas, se analisarmos as ideias que levam a questão da sustentabilidade bem a sério, veremos que muitas delas passam longe daqueles discursos social e ecologicamente chatos. Eu trago dois exemplos interessantes aqui: o das ciclovias que “acendem” de noite — ou brilham no escuro, se você preferir — e o dos postes de luz inteligentes que economizam energia e, de quebra, dão uma ajudinha na segurança.

Pedalar é preciso

Já ouviu falar de Lidzbark Warmiński? Nem eu, até recentemente. Esse é o nome de uma cidadezinha no norte da Polônia que ganhou o noticiário nos últimos dias por conta de uma ciclovia que, à noite, fica iluminada. Mas não por postes ou refletores: a própria pista emite luz.

O efeito é bem bonito. Lembra um pouco as decorações natalinas ou mesmo pistas de aeroportos. Se eu tivesse uma fazenda, acho que usaria essa tecnologia para dizer aos ETs onde pousar para eles não estragarem a minha plantação.

Ciclovia acesa

Mas o objetivo dessa ideia é bem mais nobre: proteger os ciclistas à noite ou quando há baixa visibilidade. A iluminação indica exatamente por onde eles e os pedestres devem passar. Se a ciclovia estiver na rua, penso que os motoristas terão mais cuidado com as bicicletas só de notar a luz. Em ciclovias mais movimentadas, tons de iluminação distintos podem ser usados para separar os fluxos de ciclistas que trafegam em sentidos opostos.

Sim, é possível usar luzes com cores diferentes. A TPA Instytut Badań Technicznych Sp. z o.o. (não bati com a testa no teclado, o nome é assim mesmo) afirma que usou luz azul em Lidzbark Warmiński para combiná-la com os lagos da região.

Ciclovia acesa

E como é que a superfície fica iluminada? O truque está nos luminóforos, materiais que emitem luz após a absorção de radiação visível ou invisível. No caso da ciclovia, o material usado é um fósforo que pode brilhar por até 10 horas seguidas ao absorver luz solar durante o dia.

Os idealizadores do projeto não escondem que a ideia foi inspirada na ciclovia iluminada montada na cidade holandesa de Nuenen em 2014, que por sua vez é uma homenagem à obra Noite Estrelada, de Van Gogh.

Mas há uma diferença importante entre os dois projetos: enquanto a ciclovia da Polônia usa luminóforos, a pista da Holanda foi toda revestida de pequenas pedras cintilantes que recebem luz de LEDs alimentados por energia solar.

Qual ideia é melhor? Bom, isso depende das condições de cada lugar e dos objetivos. O projeto da Polônia tem autonomia de até dez hora e o material que reveste a pista terá que ser renovado com certa frequência. Por outro lado, a iluminação obtida ali aparenta ser mais suave. Já a ciclovia holandesa tem implementação mais complexa e, portanto, cara, mas deve oferecer mais durabilidade.

Inteligente como um poste

A principal vantagem das ciclovias que brilham no escuro é que elas conseguem delimitar bem a pista durante a noite sem depender da rede elétrica. Desse modo, é possível diminuir a instalação de postes de luz, por exemplo. Diminuir, mas não eliminar, afinal, as pistas não estão sendo testadas para substituir a iluminação pública.

Isso não quer dizer, todavia, que os postes de luz devem ser encarados com um mal necessário. Há universidades e empresas trabalhando para deixá-los inteligentes e, assim, reforçar a segurança do local ou diminuir o consumo de energia.

Sistema de iluminação da Silver Spring Networks em Glasgow, Escócia: luz e monitoramento de veículos
Sistema de iluminação da Silver Spring Networks em Glasgow, Escócia: luz e monitoramento de veículos

A Silver Spring Networks é uma das várias companhias que já oferecem soluções para a criação de redes de iluminação inteligentes. À França, por exemplo, a empresa entregou um sistema de sensores em postes que determinam, com bastante eficácia, qual o momento ideal de ligar as luzes em certas regiões de Paris.

Sensores desse tipo estão no mercado há tempos, mas os mais modernos são muito mais precisos, conseguindo determinar o momento ideal de acionamento das luzes com base em um grande número de critérios, não só a diminuição da iluminação natural.

Funciona. O governo local não quis simplesmente substituir lâmpadas convencionais por LEDs para não alterar a “cor” da cidade, mesmo assim, consegue obter economia de 30% no consumo de energia com esse sistema.

Paris à noite

E, olha, não precisa ser só com energia. Há projetos de postes que também podem monitorar o fluxo de veículos em determinados pontos para auxiliar no tempo de abertura e fechamento de semáforos, assim como identificar ruídos de disparos que ajudam a polícia a traçar os locais violentos da cidade.

Também dá para diminuir, ao menos um pouco, os impactos da atividade urbana na natureza. A rotina das cidades pode interferir nos hábitos dos animais de formas que a gente nem imagina. Em vários pontos da região metropolitana de São Paulo, por exemplo, um biólogo descobriu que o sabiá-laranjeira trocou as manhãs pelas madrugadas para soltar o seu canto — essencial para atrair fêmeas — porque, durante o dia, o barulho dos carros é alto.

Pelo menos o sabiá-laranjeira conseguiu se adaptar, mas há animais tão sensíveis às mudanças ambientais que podem, por exemplo, ter o seu ciclo de reprodução prejudicado se uma luz artificial acender nas áreas em que eles vivem. É o caso das tartarugas gigantes que aparecem em algumas regiões da Flórida: nesses lugares, a intensidade da iluminação é reduzida em certas épocas, pois as tartarugas precisam se guiar pelas fases da lua para se reproduzir.

tartarugas gigantes

Esse é outro tipo de controle que pode ser auxiliado por postes inteligentes. Se equipados com sensores que detectam atividade animal, eles podem ajustar as condições de iluminação automaticamente ou ajudar órgãos ambientais no monitoramento dos bichos.

Do futuro, mas um futuro próximo

Algumas propostas, como as ciclovias que acendem, precisam ser aperfeiçoadas ou testadas com mais afinco. Mas muitas das tecnologias que podem ajudar uma cidade a reduzir o impacto ambiental e proporcionar mais qualidade de vida estão bastante avançadas.

Como, de modo geral, essas ideias não são caras e têm benefícios claros, acredito que é questão de tempo para elas deixarem de ser projetos pontuais para se transformarem em recursos que, de tão presentes, nem notaremos que existem. No final das contas, o maior desafio que teremos paras as cidades inteligentes não será de ordem tecnológica, mas política.

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Emerson Alecrim

Emerson Alecrim

Repórter

Emerson Alecrim cobre tecnologia desde 2001 e entrou para o Tecnoblog em 2013, se especializando na cobertura de temas como hardware, sistemas operacionais e negócios. Formado em ciência da computação, seguiu carreira em comunicação, sempre mantendo a tecnologia como base. Em 2022, foi reconhecido no Prêmio ESET de Segurança em Informação. Em 2023, foi reconhecido no Prêmio Especialistas, em eletroeletrônicos. Participa do Tecnocast, já passou pelo TechTudo e mantém o site Infowester.

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