O cérebro humano tem um total estimado de 100 bilhões de neurônios. Cada um deles pode se conectar a milhões de outros neurônios por meio de sinapses. Calcula-se que existam alguns bons quatrilhões de sinapses neurais no cérebro. Embora estejamos na vanguarda de incríveis avanços tecnológicos, estamos bem longe de imitar funcionalmente esse tipo de potencial.

Entretanto, com apenas 400 transistores e tecnologia CMOS padrão de manufatura de circuitos integrados, um grupo de cientistas do MIT obteve êxito em criar o primeiro chip que imita o processo análogo de comunicação do cérebro e que opera fundamentalmente sob o mesmo modelo de comunicação controlada por íons.

Sinapses
Cada neurônio possui milhares de sinapses. Essas últimas, são estruturas posicionadas em um espaço entre duas células que permitem a condutividade de sinais elétricos e químicos entre outras diferentes células do sistema nervoso. No caso do cérebro, ficam entre dois neurônios, ligando-os.

Esses dois tipos fundamentais de sinapses tem um grande aporte de eletricidade controlado por um fluxo dinâmico de íons; moléculas continuamente carregadas de sódio, potássio, clorido e cálcio. A pré-sinapse libera neurotransmissores (glutamato e ácido gama-aminobutírico) que se ligarão à membrana da célula neural (pós-sinapse), ativando assim os canais de íons.

É a concentração destes íons que, quando alterada, interfere no potencial com que os pulsos elétricos são propelidos para fora da célula neural (neurônio). Tudo isso, associado a uma série de proteínas e inúmeros outros processos, controla o potencial computacional do nosso cérebro.

Resumindo, não é fácil imitar os processos químico-elétricos à base de reações iônicas de um processador analógico tão potente quanto o nosso cérebro, via apenas o processamento digital.

Estrutura de uma sinapse química

Provavelmente porque que o princípio da Lâmina de Occam nunca sai de moda, a descoberta dos cientistas do MIT se deu pela simplificação das metodologias de pesquisa atuais sobre o cérebro diante de tão gigantesco obstáculo. Hoje, existem basicamente três maneiras de modelar o cérebro humano no silício.

  • A primeira delas é a que cientificamente menos se aposta hoje, na qual se estabelece a mesma dinâmica simulada de processamento análogo do cérebro e adiciona-se cada vez mais poder de processamento (digital), até que o modelo se equipare às capacidades potenciais do cérebro. O que obviamente provoca um ‘trambolhamento’ de hardware em prol de muita força e pouco ‘jeito’.
  • O segundo caminho é adicionar uma curva de aprendizagem na sintaxe de processamento e assim simular o modo como o cérebro estabelece essas conexões. Em outras palavras, esse modelo imita a formação de uma sinapse da mesma maneira que associamos diferentes tags a um mesmo post, por exemplo. O problema com esse modelo é que ele expande para montantes brutamontescos de registros, disponíveis de modo compulsório à todo o momento, ocupando grandes espaços e em bem pouco tempo.
  • O terceiro e último modelo possível envolve empreitar diante do mais complexo, ou seja, mimetizar os próprios canais de comunicação análoga estabelecidos a partir do fluxo iônico que corre entre as sinapses. Traduzindo: forçar o potencial de processamento disponível no silício a imitar o funcionamento químico-elétrico do cérebro. É nessa categoria que o inovador projeto do MIT se encaixa.

Avanços

Engenheiros e pesquisadores têm trabalhado ao longo dos anos em modelos de redes neurais. A óbvia problemática é que a lógica de comunicação transistor-transistor é fundamentalmente digital. Já a do nosso cérebro, como mencionado, é química-elétrica e a nossa máquina, para complicar, tem um funcionamento completamente analógico.

Entretanto, os neurônios não são como meros interruptores que migram de “0” para “1” e depois para “0”. Muito mais complexamente, eles operam a partir de micro-escalas praticamente infinitas de valores entre eles.

É possível aproximar esse potencial analógico de função das sinapses através do uso de uma lógica conhecida como Fuzzy Logic, amplamente utilizada até o esgotamento em áreas como o estudo da inteligência artificial, os valores dessa escala são previamente dispostos sempre de maneira aproximada e nunca exata.

Entretanto, a formatação de conexões por meio dessa lógica só chega até um certo limite e essa alternativa não é mais utilizada em processos de modelagem do cérebro humano porque… bem, não funcionam essencialmente como ele, nem tampouco podem atingir sequer uma parte relevante do seu potencial.

Nova CPU do Massachussets Institute of Technology (foto: MIT)

Esta belezura aí acima é o tal novo processador de 400 transistores criado pelo MIT. Diferente de tudo o que já foi feito, o novo CPU procura modelar como cada uma das condições biológicas que interferem em uma única sinapse acontece. A partir daí, segundo Chi-Sang Poon (um dos cientistas envolvidos na pesquisa), o protótipo torna possível pela primeira vez compreendermos como cada processo iônico que ocorre dentro do neurônio e em que momentos cada um deles realmente opera.

Futuro

É óbvio que, com a conquista de processadores analógicos realmente poderosos, venham modelos reais de inteligência artificial. Com os primeiros passos dessa fase já dados, o próximo é fazer com que o processador consiga escalar sozinho a criação de novas sinapses.

O pior já passou e embora haja muita pesquisa pela frente, é bastante razoável concebermos que o protótipo seja o primeiro modelo estável capaz de uma simulação neurobiológica do cérebro com processamento analógico.

O que isso quer dizer? Bem, basicamente que conseguimos chegar ao ponto em que um processador pode produzir bilhões de sinapses (conexões) de maneira não digital, ou seja, um modelo de processamento estável e auto-multiplicável.

Com um processador capaz de reconstruir partes perdidas específicas do cérebro, digamos, o processamento de um córtex visual comprometido (cegos) ou no sistema de controle motor do trato cortico-espinal (deficientes físicos), pode-se contemplar com um pouco menos de fantasia a real inserção de componentes biônicos em qualquer parte da fisiologia humana.

Escute… Não é Asimov sorrindo?

Com informações: MIT

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San Picciarelli

San Picciarelli

Ex-redator

San Picciarelli é gerente de projetos e mestre em biotecnologia. Fez parte da equipe de redatores do Tecnoblog entre 2011 e 2012, produzindo artigos de assuntos relacionados à tecnologia, inovação e empreendedorismo. Trabalha com esse assunto desde 2006, mas também tem experiência em design e construção de sites.

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