Celulares mais caros: falta de chips continua e Brasil é atingido em cheio

Em cenário de escassez de semicondutores, preços médios de smartphones e feature phones cresceram ao longo dos últimos meses

Bruno Gall De Blasi
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• Atualizado há 11 meses
Celular caro por causa da escassez de chips
Saiba por que o Brasil foi tão impactado pela falta de chips, que deixou celulares mais caros (Imagem: Guilherme Reis / Tecnoblog)

A escassez de semicondutores afetou os mercados do mundo inteiro, independente do setor. E o Brasil, é claro, não ficou de fora: boa parte das empresas brasileiras encararam alguma dificuldade para adquirir componentes eletrônicos de outros países. E os reflexos são vistos diretamente nos preços, como aconteceu na indústria de celulares, que presenciou diversos aumentos no valor de smartphones e feature phones nos últimos trimestres.

Em termos de celulares, a principal analista para a América Latina da Counterpoint Research, Tina Lu, apontou ao Tecnoblog que a escassez de chips e outros componentes afetou especialmente o mercado brasileiro no bloco latino-americano. As motivações se concentram no requisito de fabricação local e porque o país está fora dos grandes centros de fabricações de smartphones, como a China e o Vietnã.

“No segundo e no terceiro trimestre de 2021, o Brasil foi o país mais impactado da América Latina”, afirmou.

Escassez de chips dificulta aquisição de componentes por empresas brasileiras (Imagem: Brian Kostiuk/Unsplash)
Escassez de chips dificulta aquisição de componentes por empresas brasileiras (Imagem: Brian Kostiuk/Unsplash)

Empresas encaram dificuldade para adquirir componentes

Os impactos da crise são amplamente relatados na indústria brasileira. A Sondagem Conjuntural do Setor Elétrico e Eletrônico de outubro feita pela Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) ressalta que 67% das empresas entrevistadas relataram dificuldades para adquirir componentes. O problema fica ainda mais aguçado quando se leva em consideração a vinda de componentes eletrônicos de outros países.

Segundo o levantamento, 59% das empresas consultadas tiveram dificuldades para adquirir componentes eletrônicos provenientes da Ásia. O aumento é de cinco pontos percentuais em relação à setembro (54%). Quanto aos insumos vindos de outras regiões, apenas 39% dos entrevistados informaram algum tipo de empecilho.

A pesquisa ainda aponta que sete em cada dez empresas relataram que utilizam chips em sua produção. “28% das entrevistadas informaram que seus fornecedores não passaram nenhuma previsão de normalidade no abastecimento de componentes semicondutores”, diz o estudo. Boa parte das companhias espera que a situação só vá melhorar a partir de meados de 2022.

Enquanto isso, a crise atinge a produção das companhias brasileiras. De um lado, 78% das empresas afirmaram que perceberam pressões acima do normal nos custos de componentes e matérias-primas. Do outro, 41% dos entrevistados estão com dificuldade na produção e entrega encararam atrasos na produção e na entrega.

Porém, nenhuma fabricante informou paralisação total da produção devido à falta de componentes desde fevereiro, quando a pergunta foi incluída na pesquisa.

Fechamento de portos devido à pandemia de COVID-19 está entre os motivos por trás da crise de semicondutores (Imagem: Reprodução)
Fechamento de portos devido à pandemia de COVID-19 está entre os motivos por trás da crise de semicondutores (Imagem: Reprodução)

E de onde veio essa crise toda?

Parte dessas dificuldades de abastecimento originaram-se em 2020, quando começou a pandemia de COVID-19. Em conversa com o Tecnoblog, a analista de pesquisa e consultoria de consumo da IDC Brasil, Juliana Arouca, lembrou que os portos ficaram fechados devido à crise de sanitária causada pelo novo coronavírus. Assim, as entregas de semicondutores demoraram para chegar aos seus destinatários.

A analista conta que houve um atraso global pois, atualmente, esses componentes têm origem em locais da China. “O mercado brasileiro, assim como outros mercados, ficou desabastecido”, disse. Em consequência, as companhias fizeram adaptações nos últimos meses para manter seus estoques, incluindo destinar mercadorias do Brasil para outras regiões, como os Estados Unidos.

“Esses fabricantes estão, sim, remanejando entre áreas, por exemplo, Estados Unidos, Brasil e México, conforme o seu mercado de priorização do momento”, disse.

Além disso, o remanejamento está atrelado a outras demandas que surgiram em 2020. O último ano foi marcado pelo crescimento do mercado de PCs e tablets conforme a população mundial aderiu ao home schooling e ao home office. Portanto, as companhias passaram a se dedicar a outras categorias de produtos em detrimento do setor mobile, já quase tudo foi feito em casa nos últimos meses.

“De fato, a gente vê as fabricantes fazendo adaptações porque a falta de conectores é uma realidade”, afirmou Arouca. “Isso tanto para o mercado de smartphones como para outros mercados em que esses componentes comportam, como, por exemplo, o mercado automotivo.”

Preços de semicondutores são afetados devido à escassez (Imagem: Divulgação/Intel)
Preços de semicondutores são afetados devido à escassez (Imagem: Divulgação/Intel)

Em tempos de escassez, os preços sobem

O reflexo disso tudo ainda é sentido na carteira. E não é só no bolso dos consumidores: as companhias também vêm amargando com a escalada dos valores para comprar insumos, como foi relatado pela pesquisa da Abinee. O analista de mercado de TIC da IDC Brasil, Daniel Voltarelli, também ressalta o mesmo impacto.

“Uma consequência disso é o aumento de preços, que não se deve só à questão de semicondutores, mas também a um cenário de inflação global”, afirmou ao Tecnoblog. “Isso é um problema global, mas também tem questões de desvalorização do real frente ao dólar.”

Juliana Arouca acompanhou a linha de raciocínio: “[é] aquela velha regra do mercado de oferta e procura imperando”, complementou. “Porque a gente viu aqui uma diminuição de vendas de unidades de celular e um aumento no preço médio”. E os impactos são observados em números: no primeiro trimestre, estimava-se um preço médio de celulares de R$ 1.290 (smartphones e feature phones). Depois, no segundo trimestre, houve um aumento de 8% na estimativa. 

“E agora, para o terceiro trimestre, em cima desse número do segundo trimestre, a gente já aumentou a expectativa em 5%”, disse. “Enquanto isso, a nossa projeção de volume só veio caindo de 2% a 3% em cada um desses trimestres.”

Produção do iPhone 13 e demais produtos da Apple é atingida por crise de semicondutores (Imagem: Darlan Helder/Tecnoblog)
Produção do iPhone 13 e demais produtos da Apple é atingida por crise de semicondutores (Imagem: Darlan Helder/Tecnoblog)

Ainda assim, isto não significa que o resultado é exatamente negativo para as empresas. Sobre o assunto, a analista levantou dois pontos: de um lado, pode-se dizer que o segmento está gerando até mais valor devido à escassez. Mas, do outro, em termos de volume, você vê uma queda no número de unidades.

“A escassez faz isso”, explicou. “Então, depende do ponto de vista. Se você for pensar que menor unidade é menor custo, até que para o fabricante o cenário não é tão ruim assim em termos de Ebitda [lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização].”

Ainda assim, os reflexos dessa crise se mostram presentes (e bem nítidos). Peguemos a Apple como exemplo: de acordo com o Nikkei Asiaa produção do iPhone 13 e outros produtos foi interrompida pela primeira vez nos feriados de fim de ano da China, em vez de dar hora extra. Não à toa, ao comprar um iPad Mini de 64 GB nesta quinta-feira (16), para São Paulo (SP) e pelo site da Apple do Brasil, a previsão de entrega é de 24 a 31 de janeiro de 2022.

Tina Lu também fala sobre as dificuldades de outras fabricantes. “As empresas menores só podem esperar obter alguns chipsets por meio de leilões abertos”, afirmou. “Portanto, seu custo aumentou substancialmente.”

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Bruno Gall De Blasi

Bruno Gall De Blasi

Ex-autor

Bruno Gall De Blasi é jornalista e cobre tecnologia desde 2016. Sua paixão pelo assunto começou ainda na infância, quando descobriu "acidentalmente" que "FORMAT C:" apagava tudo. Antes de seguir carreira em comunicação, fez Ensino Médio Técnico em Mecatrônica com o sonho de virar engenheiro. Escreveu para o TechTudo e iHelpBR. No Tecnoblog, atuou como autor entre 2020 e 2023.

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