A Intel anunciou recentemente a transformação do ACAT (Assistive Context Aware Toolkit) em projeto open source. Essa é uma notícia muito boa. Estamos falando do fascinante software que ajuda a dar voz a Stephen Hawking, um dos cientistas mais renomados da atualidade.

Hawking foi diagnosticado com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) aos 21 anos de idade. Degenerativa, a doença paralisa progressivamente as funções motoras, mas não afeta as atividades cerebrais da pessoa.

Isso fez com que, com o passar dos anos, Stephen Hawking perdesse a capacidade de andar, movimentar os braços, manter a cabeça erguida, entre outras atividades. Não bastasse o fato de a ELA também afetar a fala, Hawking enfrentou uma grave pneumonia em 1985 que o fez passar por uma traqueotomia de emergência. O procedimento acabou por danificar irreversivelmente as suas cordas vocais.

Desde então, o cientista se vê obrigado a utilizar um sintetizador de voz para se comunicar. A despeito de todas as dificuldades e limitações inerentes à ideia, esse sistema atendeu às necessidades de Hawking por pelo menos duas décadas. Nos últimos anos, entretanto, Hawking ficou muito debilitado (hoje ele tem 73 anos). Um novo sistema de comunicação se mostrou necessário.

ACAT - sensor

A vez do ACAT

É aí que o ACAT aparece. O software foi criado pela Intel em parceria com a Swiftkey, sim, aquela empresa que se tornou conhecida por desenvolver um app que facilita a escrita com o teclado virtual dos smartphones.

O sistema anterior consistia essencialmente na movimentação de um cursor em uma tabela com letras. Quando o cursor passava sobre determinado caractere, Hawking fazia uma contração com a bochecha para marcá-lo. O procedimento se repetia até uma palavra ser formada. O problema é que, por causa da sua debilidade, o cientista já não conseguia usufruir bem desse método — a formação de uma única palavra muitas vezes levava mais de um minuto.

Trabalhando com Stephen Hawking há mais de uma década, a Intel não fugiu da missão de encontrar uma solução. O desafio era grande: desenvolver um sistema do zero poderia exigir demais de Hawking, portanto, o método utilizado até então tinha que ser aproveitado de alguma forma. O próprio Hawking manifestou que essa era a sua vontade.

Assim foi feito. Sensores instalados nos óculos de Hawking continuam reconhecendo comandos a partir dos movimentos faciais do cientista. Quando o ACAT destaca a função a ser usada, basta que o gesto seja realizado para acioná-la (o vídeo abaixo mostra essa ação). Os dados são interpretados por um laptop rodando Windows cuja tela fica bem em frente à Hawking, tal como antes. As mudanças mais significativas aconteceram mesmo no software.

Em vez de começar do zero, melhorar a interface

Permitir apenas que o usuário escreva não basta. Ele também precisa de meios para realizar outras tarefas, como abrir o navegador de internet para fazer uma pesquisa no Google. Isso é fácil para quem usa teclado e mouse. Mas, para quem depende de um meio de entrada tão limitado, esse simples procedimento pode levar vários minutos.

Por essa razão, a Intel se preocupou primeiramente em contextualizar a interface. Para tanto, os engenheiros da companhia passaram algum tempo observando como Hawking usava o computador. Graças a isso, a interface foi adaptada para dar acesso fácil às atividades mais comuns, como pesquisas na web, leitura de PDFs e escrita de documentos.

Para cada uma dessas funções o ACAT exibe menus correspondentes. Por exemplo, os desenvolvedores descobriram que Hawking utiliza muito o Word, logo, há menus que dão acesso rápido às funções mais utilizadas do editor. Com o software antigo, Hawking teria que acionar o cursor, movê-lo (lentamente) até o menu desejado para somente então selecionar a opção desejada. Para quem usa contrações faciais para dar comandos, trata-se de um procedimento demorado e cansativo.

ACAT interface

A tecnologia da escrita

Coube à Swiftkey cuidar da função de escrita enquanto a Intel se encarregava da interface. A empresa decidiu aproveitar parte da tecnologia que fez os seus apps para dispositivos móveis tão consagrados.

Novamente, foi necessário observar as atividades de Hawking, desta vez para identificar estilos de linguagem. Assim, o ACAT se tornou capaz de sugerir palavras de acordo com o contexto, isto é, com o que estiver sendo escrito: um documento técnico tem vocabulário mais rebuscado; um email com linguagem informal leva a sugestões de palavras mais usadas no cotidiano.

Tudo começa com a exibição de uma janela que disponibiliza letras, números, sinais de pontuação e outros símbolos. À medida que os caracteres vão sendo escolhidos, a função de autocompletar do ACAT dá sugestões de palavras e até de sentenças. Na sequência, basta ao usuário usar a função de salvar o texto, enviar o email, acionar o sintetizador de voz ou o que for necessário no momento.

Se deu certo? O próprio Stephen Hawking responde: “agora eu sou capaz de dar palestras, redigir artigos ou livros e falar muito mais rápido”. Com o ACAT, o cientista só precisa informar de 15% a 20% dos caracteres das frases a serem escritas ou faladas pelo sintetizador. O resto fica por conta do software. Para completar, a execução de outras tarefas no computador ficou até dez vezes mais rápida.

Open source, como prometido

Foram mais de três anos de trabalho, mas desde o início o plano era disponibilizar o ACAT de graça e como projeto open source. Agora que a promessa foi cumprida, a Intel espera que o software possa ser aperfeiçoado para atender a outras pessoas com ELA ou que, por outra razão, tenham restrição severa de movimentos.

A abertura do código-fonte é importante (ainda que a tecnologia da Swiftkey continue fechada) porque cada indivíduo tem necessidades específicas – em vez da face, um portador de ELA pode precisar de um sensor na ponta do dedo indicador, por exemplo. O acesso ao código facilita consideravelmente os ajustes necessários para cada caso.

Obviamente, também há expectativa de que a liberação do software atraia gente capaz de tornar a tecnologia ainda mais avançada.

Para baixar o ACAT e obter mais informações, o link oficial é este aqui. O código-fonte pode ser obtido na página do projeto no GitHub.

Com informações: Wired, IQ

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Emerson Alecrim

Emerson Alecrim

Repórter

Emerson Alecrim cobre tecnologia desde 2001 e entrou para o Tecnoblog em 2013, se especializando na cobertura de temas como hardware, sistemas operacionais e negócios. Formado em ciência da computação, seguiu carreira em comunicação, sempre mantendo a tecnologia como base. Em 2022, foi reconhecido no Prêmio ESET de Segurança em Informação. Em 2023, foi reconhecido no Prêmio Especialistas, em eletroeletrônicos. Participa do Tecnocast, já passou pelo TechTudo e mantém o site Infowester.

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