Há espaço para novas operadoras de celular com a chegada do 5G no Brasil?

Além de Claro, TIM e Vivo, 13 empresas apresentaram propostas para o leilão do 5G; entenda as dificuldades para a criação de mais operadoras móveis no Brasil

Lucas Braga
• Atualizado há 1 ano e 6 meses
Pessoa segurando um celular (Imagem: Pexels / Pixabay)

O leilão do 5G está próximo, e no total 15 empresas entregaram propostas para a Anatel com o objetivo de disputar pelo menos uma faixa de frequência. Se tudo der certo, todas as capitais brasileiras terão serviços de quinta geração disponíveis até julho de 2022. Mas com a venda da Oi Móvel para Claro, TIM e Vivo, será que existe espaço para novas operadoras de telefonia celular no Brasil?

A concentração do mercado de telefonia móvel no Brasil

De acordo com os dados mais recentes da Anatel, o Brasil tem 246,8 milhões de linhas móveis. Isso dá mais de um chip para cada habitante, e mostra que o mercado está maduro. Pensando em clientes, não tem muito para onde crescer.

A maior parte dos contratos estão concentrados nas grandes empresas. Juntas, Claro, Oi, TIM e Vivo têm 97,9% das linhas móveis brasileiras. O cenário não deve mudar com o fatiamento da Oi Móvel, uma vez que o trio remanescente continuará com todos os clientes.

Mas isso não significa que não existam mais empresas de telefonia celular no Brasil. Existem duas operadoras regionais:

  • Algar: atua com telefonia móvel no Triângulo Mineiro e em parte dos estados de GO e SP. A tele tem 3 milhões de linhas;
  • Sercomtel: atua nas cidades de Londrina e Tamarana, no Paraná. A operadora foi recém-privatizada e possui 46,2 mil linhas móveis.

Além disso, há também as operadoras móveis virtuais (MVNOs), que utilizam as antenas das grandes teles. O grande problema é que planos costumam ser piores que das grandes teles, então não dá para dizer que elas são competitivas. A Surf Telecom, uma das principais empresas do setor, tem pouco mais de 690 mil linhas em todo o Brasil.

Temos boa competição na banda larga fixa. Chegou a hora do móvel?

Um dos principais fenômenos do mercado de telecom nos últimos dez anos foi o grande avanço de provedores regionais. Com a redução nos custos de fibra óptica e a flexibilização das regras por parte da Anatel, as operadoras competitivas fizeram um belo trabalho de formiguinha e ajudaram a levar banda larga de qualidade para áreas que foram esquecidas pelas teles tradicionais – especialmente do antigo Oi Velox.

Eu mesmo moro numa região atendida por sete operadoras de fibra óptica, e isso era impensável há alguns anos. Mas por que isso não é uma realidade na telefonia móvel? Existem várias razões para isso, e você vai descobri-las a seguir.

Cabos em poste (Imagem: Ralph Ravi/Unsplash)
Tem pouca fibra óptica nesse poste, coloca mais (Imagem: Ralph Ravi / Unsplash)

Espectro tem limite

Provedores fixos simplesmente puxam fibra óptica nos postes, e o limite técnico é o peso máximo suportado pela edificação. Tecnologias de telefonia móvel são diferentes porque utilizam radiofrequências, que possuem capacidade máxima disponível – é o tal do espectro.

Vamos fazer uma analogia da faixa de 3,5 GHz com medidas métricas. Imagine que o governo quer criar uma rodovia de 400 km, e toda essa extensão será dividida igualmente entre cinco diferentes concessionárias. Algo similar acontece no leilão de frequências: a Anatel dividiu a capacidade disponível em cinco partes, para permitir que diferentes empresas consigam oferecer seus serviços.

A física já nos ensinou que dois corpos distintos não podem ocupar um mesmo espaço ao mesmo tempo, e isso se repete com radiofrequências. Se diferentes operadoras utilizarem o mesmo espectro, interferências podem interromper o funcionamento pleno dos serviços.

De qualquer forma, uma das principais ambições da Anatel é que pequenos provedores também atuem com a quinta geração. Por conta disso, a agência terá blocos regionais para atender a necessidade dessas empresas, além da licitação nacional para atender empresas como Claro, TIM e Vivo. Mas….

Construir rede móvel custa caro

O modelo de operação com tecnologia sem fio é muito diferente da banda larga fixa. Em primeiro lugar é necessário considerar os custos de aquisição de frequência, que não são baratos: um lote regional de 3,5 GHz tem preço mínimo estipulado de R$ 33,17 milhões.

Torre de telefonia celular. Foto: Lucas Braga/Tecnoblog
Torre de telefonia celular (Imagem: Lucas Braga / Tecnoblog)

Diferente das redes fixas, as outorgas também carregam compromissos que precisam ser cumpridos pelas compradoras. Além das metas de cobertura, a Anatel estipulou que as operadoras deverão arcar com uma nova rede de uso privativo para o Governo Federal, expandir fibra óptica na região amazônica, migrar a TV aberta via satélite para outras frequências, cobrir estradas federais com 4G, e por aí vai.

Se todas as frequências forem arrematadas, o leilão deve movimentar pelo menos R$ 50 bilhões. Desse montante, R$ 3 bilhões devem ir para os cofres públicos, R$ 7 bilhões devem ser empregados na expansão de internet para escolas e todos os R$ 40 bilhões restantes estão relacionados aos compromissos exigidos pelo edital.

É mais difícil para quem é novato

Claro, TIM e Vivo têm certos “privilégios” na hora de apostar no 5G. Essas teles já têm sólidas bases de clientes, e boa parte da infraestrutura já usadas com 4G e tecnologias anteriores poderão ser aproveitadas para a quinta geração.

Sendo assim, os pequenos provedores não estão em pé de igualdade. Além de terem que construir redes do zero, essas empresas precisarão investir também em 4G caso queiram atuar no segmento de telefonia celular. A quinta geração ainda não possui padrão estabelecido para chamadas de voz (sem falar que o VoLTE, que permite ligações na quarta geração, nem “pegou” de vez nas operadoras brasileiras).

Com o dólar avançando para a casa dos R$ 6, o custo para instalar antenas de telefonia é alto. O investimento fica mais difícil de justificar quando se leva em conta que o brasileiro paga, em média, R$ 25,50 por mês com telefonia celular – são menos de cinco dólares por mês, o que nos coloca entre as tarifas mais baixas do mundo. Nos Estados Unidos, por exemplo, o gasto médio mensal com serviço de celular pode passar de US$ 40:

Gasto médio mensal em planos de celular em 2019
Gasto médio mensal em planos de celular (Imagem: Reprodução / Infogram / Tecnoblog)

Outro grande porém é com relação à cobertura: a construção de acordos de roaming com grandes operadoras nacionais é incerta. As pessoas se movimentam com seus celulares, e uma tele regional dificilmente conseguirá competir com Claro, TIM e Vivo se seus serviços não funcionarem fora da área de origem.

Mas afinal, existe espaço para mais operadoras móveis?

Como você pode perceber, o cenário não é muito animador para novas operadoras no Brasil. Com altos custos de investimentos e sem receita garantida, fica difícil vislumbrar aumento de competição no setor de telefonia móvel.

Chips da Claro, Oi, TIM e Vivo (Imagem: Lucas Braga / Tecnoblog)
Chips da Claro, Oi, TIM e Vivo (Imagem: Lucas Braga / Tecnoblog)

Do fundo do meu coração, eu espero estar errado, que esse texto envelheça mal e tenhamos mais competição de telefonia móvel no futuro. Além das operadoras conhecidas, o leilão da Anatel poderá liberar espectro para consórcios de pequenas operadoras, que juntas podem revolucionar o mercado brasileiro assim como fizeram com a banda larga por fibra óptica.

Uma alternativa que considero promissora é a criação de redes neutras móveis, que poderão ter a rede alugada por pequenos provedores. Existem grupos dispostos a atuar nesse segmento, como a Highline e Winity II: se elas conseguirem criar infraestrutura ampla e serem agressivas com preço, é capaz que incomodem Claro, TIM e Vivo.

Vale lembrar que também existe a possibilidade de pequenas operadoras comprarem licenças no leilão para utilizarem o 5G apenas para o serviço de banda larga fixa. Nesse caso a história muda, e cai a necessidade de atuar com tecnologias anteriores e criar acordos de roaming.

Leia | O que são dados móveis? Veja a diferença entre E, G, H+, 4G e 5G no celular

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Lucas Braga

Lucas Braga

Repórter especializado em telecom

Lucas Braga é analista de sistemas que flerta seriamente com o jornalismo de tecnologia. Com mais de 10 anos de experiência na cobertura de telecomunicações, lida com assuntos que envolvem as principais operadoras do Brasil e entidades regulatórias. Seu gosto por viagens o tornou especialista em acumular milhas aéreas.