Conceito: como eu imagino que deveria ser a TV do futuro

Uma prévia de quão melhor a experiência de ver televisão poderia ser

Autor Convidado
• Atualizado há 1 ano e 6 meses

Nota do editor: a TV vem perdendo espaço na vida das pessoas. O aparelho, que costumava ser um símbolo de reunião familiar, é visto pelas gerações mais novas apenas como uma tela gigante, desimportante perto de tablets e smartphones. A verdade é que o televisor precisa ser reinventado. Consumimos conteúdo juntos, mas cada um em sua própria tela. Qual o papel da tela grande, então? O Renan, que é designer, me enviou há alguns dias um email, mostrando como ele imagina a TV do futuro. Achei que esse era um bom momento para divulgar as suas ideias aqui no TB. Boa leitura! 🙂 – Thiago Mobilon

A história por trás desse projeto se inicia após participar de um curso online promovido pela Universidade Stanford sobre Design e Inovação, que me despertou interesse em projetar para resolver problemas e criar um futuro desejável.

Ao longo de um ano e meio, me desafiei a melhorar um produto que acreditava ser deficiente, a TV. Foi uma jornada incrível na qual, ao fim, imaginar um contexto melhor no futuro para apreciar entretenimento significou criar novas ferramentas, repensar sistemas antigos e promover mudanças em três principais campos: propósito, experiência do usuário e serviço.

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Precisamos mesmo de mais um dispositivo para navegar na internet?

Essencialmente, o objetivo de um produto é oferecer uma experiência melhor para que as pessoas possam realizar tarefas cotidianas mais facilmente. Poderíamos muito bem usar uma pedra para pregar algo numa parede, mas usamos um martelo porque ele simplesmente detêm todas as características que mais se adequam à realização de tal atividade. Afinal, ele foi projetado para isso.

O motivo dessa analogia em um texto sobre o futuro da TV é que os atuais produtos parecem ter perdido seu real objetivo e adquirido novas funções mesmo não possuindo características para executá-las com maestria. A adoção de um ecossistema inspirado nos smartphones confundiu o propósito da televisão. Será mesmo que precisamos de outro dispositivo (que não lida muito bem com navegação na internet) justamente para navegar na internet?

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O desenvolvimento de um produto deve almejar a perfeita harmonia entre forma e função, mas as funções que a TV ganhou não combinam com as tarefas que seus fabricantes a incumbem de executar.

Os aplicativos realmente úteis nas Smart TVs ou set-top-boxes se limitam a um único segmento: contar histórias.

O sucesso dos smartphones como uma plataforma multifuncional se deve a inúmeras características favoráveis que a TV não possui — o tamanho, contexto de uso e interação por meio de um segundo dispositivo a dois metros de distância da tela impõem sérias restrições. Por isso, os aplicativos realmente úteis nas Smart TVs ou set-top-boxes se limitam a um único segmento: contar histórias. Filmes, séries, documentários, notícias, esportes.

É isso que aquela tela gigante que culturalmente colocamos na sala de estar faz de melhor. Ela é uma janela para novos estímulos nos quais o entretenimento não é o foco principal, mas sim o resultado de uma experiência imersiva, com uma história sendo contada.

Por que a experiência de uso hoje é ruim

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Atualmente, a forma de se buscar entretenimento através da TV é mal concebida e projetada. Ao longo de décadas, a televisão evoluiu para ser melhor em reproduzir um vídeo com espectadores sentados confortavelmente num sofá. Imagem colorida, telas maiores, alta resolução e som de melhor definição tornaram esse estágio de interação com o produto mais agradável.

Mas escolher uma TV dentre centenas de modelos bastante similares, comprar produtos complementares como set-top-boxes para superar suas deficiências, escolher entre pacotes caros de TV a cabo e contratar um que pouco se adequa a nossas necessidades (além de futuramente ainda ser incentivado a também assinar um serviço de streaming) são alguns dos problemas mais comuns que enfrentamos.

Sem falar do uso: sofremos tendo que gerenciar diversos produtos e aplicações, lidar com interfaces e ferramentas de interação terríveis e um serviço cujo sistema de canais prejudica a descoberta de conteúdo e data da origem da televisão no fim dos anos 20.

Sem exigir contratação de serviços complementares

As atuais fabricantes de Smart TVs se desviam da responsabilidade de entregar elas mesmas um serviço próprio de conteúdo, que poderia oferecer uma boa experiência do começo ao fim. O sistema de “múltiplas entradas” que elas adotam é um meio de terceirizar essa entrega, lançando sobre outros produtos e serviços a obrigação de oferecer conteúdo de qualidade de forma atraente.

Isso é péssimo do ponto de vista de experiência do usuário, pois não permite que novas soluções se integrem perfeitamente à TV, criando a realidade do que parecem ser diversos universos diferentes coexistindo isoladamente dentro de um mesmo produto, cada um com sua própria lógica de funcionamento, controle, interface e modelo de interação, o que torna a experiência de uso do produto mais complexa e confusa.

Experiência proposta não exigiria a contratação de produtos e serviços complementares
Experiência proposta não exigiria a contratação de produtos e serviços complementares

Fim da bagunça de cabos

Dar fim às múltiplas conexões seria um meio de acabar com a fragmentação da TV. Com uma plataforma de oferta de conteúdo construída nativamente isso seria possível: ao acabar com a necessidade de ir em busca de soluções externas, uma única entrada (para conexão com consoles de videogame, por exemplo), somada a tecnologias como Wi-Fi e Bluetooth para integração com aplicativos de smartphones, seria suficiente para desencadear novas formas de uso do produto sem gerar bagunça e complexidade.

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Gerencie e controle músicas no smartphone enquanto são reproduzidas na TV

Tanto ao acionar a transmissão sem fio de audio e video quanto ao ligar o console de videogame, não seria necessário nenhuma interação com o controle remoto da TV. O uso ocorreria de forma totalmente independente, com a própria TV tomando a iniciativa de ligar automaticamente assim que detectar um pedido de conexão com o smartphone ou informações sendo enviadas via cabo HDMI.

Quando ambos forem interrompidos, a aba dedicada a conexões externas seria então fechada e ela desligada automaticamente após alguns segundos de inatividade.

Melhorando (ou diminuindo) a interação com a TV

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A nova interface e controle foram projetados em total sinergia, de forma que cada gesto realizado sobre o touchpad se assemelhasse perfeitamente à ação mostrada na TV. Bastaria deslizar o dedo a partir da borda direita do controle para acionar um menu escondido na borda direita da tela, por exemplo. Essa previsibilidade no desdobramento de cada gesto e lógica de interação, que se parece muito bem ao que já estamos acostumados, possibilitaria uma experiência de uso extremamente natural e intuitiva.

O controle remoto simples (de apenas um botão) e a interface minimalista que se esconde em cada canto da tela buscam encorajar os usuários a serem mais passivos em frente à TV e gastarem mais tempo assistindo em vez de se distraírem com interações. O objetivo é aumentar a imersão, colocando tudo a um deslizar de dedo de distância.

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Outra proposta é um método totalmente novo para resolver o problema da comunicação com a TV. A interação por meio de um controle remoto, distante da tela, impõe restrições que desafiam designers e desenvolvedores em busca de soluções adequadas para essa finalidade. A prova disso são os atuais teclados virtuais disponíveis em Smart TVs e set-top-boxes: eles são lentos, cansativos de interagir, e os sistemas de reconhecimentos por voz possuem tanto problemas técnicos quanto sociais de uso.

Em meio a esse contexto, a solução encontrada sugere transformar o touchpad do controle em um teclado eficiente assim que colocado na horizontal. Com o avanço de uma tecnologia já existente, que detecta movimentos sobre a superfície touch, o usuário poderia flutuar o dedo sobre o controle para selecionar a tecla e tocar para digitar. A animação das teclas sendo selecionadas e desselecionadas à medida que o usuário move o dedo torna o processo de digitação conveniente por ser ágil e natural.

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Experiência personalizada

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Apesar do estilo minimalista, o controle remoto ainda esconderia recursos poderosos. O único botão, que conteria um sensor de impressão digital, seria capaz de reconhecer o usuário no momento em que ele tentasse ligar a TV, trazendo imediatamente uma experiência configurada ao gosto pessoal de cada indivíduo.

Com esse recurso, a TV poderia organizar automaticamente o conteúdo para cada pessoa, colocando os gêneros preferidos do espectador de forma mais acessível, mostrando os conteúdos favoritos, exibindo recomendações de amigos e uma opção para salvar para assistir depois, por exemplo.

Ideias como essas permitiram que os usuários acessassem suas preferências sem confiar em um teclado numérico, que exige memorização de códigos e sobrecarrega o controle remoto com tantos botões.

O fim dos pacotes de conteúdo

Dar as pessoas a oportunidade de ter mais controle sobre seus catálogos de conteúdo sempre foi um dilema na indústria de TV por assinatura.

Os benefícios de escolher o tipo de conteúdo que deseja sem ter que levar junto outros indesejados parecem bem atraentes.

Porém, com centenas de emissoras em um sistema de distribuição por canais, isso poderia resultar em preços mais altos: a maioria das pessoas optaria por ficar apenas com as emissoras mais conhecidas, e os canais menores teriam problemas para captar dinheiro e continuar funcionando. Como resultado, os usuários acabariam tendo que lidar com menos opções de canais e ainda pagar mais por isso.

Para viabilizar a venda de assinaturas individuais, é preciso diminuir a dependência de tantas emissoras, permitindo que cada distribuidor de conteúdo possa contribuir de forma mais eficiente e significativa para o entretenimento do usuário — em vez de desenvolver novos canais, que são caros, cada emissora poderia transmitir mais do que apenas uma programação por vez.

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A partir da extinção dos pacotes, os clientes poderiam escolher seus distribuidores de conteúdo baseando-se no gosto especifico de cada usuário, criando um catálogo adequado a todos — não apenas em relação ao gosto, mas também ao orçamento, já que os preços seriam definidos de forma mais flexível, dependendo das assinaturas realizadas.

Ao longo do uso, caso surja o desejo de assinar um novo distribuidor ou abandonar algum dentro do seu catalogo, só seria preciso acessar o menu de configurações e usar a digital para efetuar a mudança.

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O fim dos canais e um novo meio de distribuir e organizar conteúdo

Além da péssima maneira como as pessoas são obrigadas a contratar conteúdo através de serviços de TV por assinatura, a forma como eles são apresentados também gera aborrecimentos. Os canais de TV atuais não são a interface correta para distribuição de conteúdo. São caros, limitados e não se organizam de forma adequada — são fragmentados em diversas emissoras e quase sempre não oferecem pistas sobre o que esperar deles.

Os canais de TV atuais não são a interface correta para distribuição de conteúdo.

Essas deficiências se estendem ainda mais com a determinação de apenas um conteúdo ser oferecido por vez e um guia de programação regrado no qual há horário certo para cada conteúdo a ser exibido.

Já os serviços de streaming, inversamente, confiam na metáfora de biblioteca para distribuir seus títulos. Mas apesar de uma organização mais clara, as infinitas listas de conteúdos apresentadas massacram os usuários e os guiam de forma ruim no processo de escolha do que assistir, alimentando a fadiga de decisão e os fazendo até desistir de sua busca por entretenimento. Junto a esse problema, ele também ignora tudo que faz da experiência de assistir TV excitante e única, incorporando uma experiência mais fria pela falta de vivacidade das transmissões em tempo real.

Por esses motivos, fui em busca de uma lógica que promovesse o melhor de cada um deles, permitindo a fácil descoberta de novos conteúdos, mas sob uma apresentação menos carregada.

Ao selecionar uma estação, ela começaria exibir automaticamente o último conteúdo posto no ar pelos distribuidores assinados, um meio de não forçar os usuários a sempre passar pelo processo de tomada de decisão para ter o que assistir, que pode ser frustrante.

A seguir, deslizando o dedo da borda inferior do controle para cima, seria possível ver o que está sendo exibido no momento, assim como conteúdos postados anteriormente naquela mesma estação. A aparição de poucas opções na tela é fruto da tentativa de não tumultuar o processo de escolha e dar ao usuário a compreensão exata de qual elemento da tela ele está interagindo.

Os conteúdos seriam colocados no ar de forma similar às redes sociais e carregariam esse rótulo durante todo o período correspondente a sua duração. Em qualquer momento seria possível escolher e reproduzir qualquer deles, mas o simples discernimento entre aqueles que ainda estão no ar e os que já foram exibidos criaria uma ajuda natural no processo de definição de algo a ser assistido.

Concluindo

Melhorar a experiência com a TV não significa ter vários aplicativos e serviços à disposição, mas tornar mais simples, intuitivo e direto aquilo que ela oferece de melhor. A proposta de não adotar jogos, música e video como uma função nativa da TV, por exemplo, vem da concepção de que melhores experiências viriam da integração suave com consoles e aplicativos de smartphones existentes, e não da tentativa de abraçar todas elas por si só.

Há muito mais a ser feito além de simplesmente lançar essas funcionalidades sobre o produto. É preciso construir um ecossistema adequado, oferecer uma ferramenta que comporte interações mais complexas e específicas (como a de jogos, por exemplo), além de absorver hardwares mais sofisticados que tornariam a TV mais cara até mesmo para quem não anseia por esses tipos de funções.

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Seria incrível concretizar uma experiência de ver TV mais simples e adequada. Felizmente, o atual cenário de inovações em serviços do tipo tem forçado empresas do ramo a saírem da zona de conforto e repensarem seus modelos de negócio, já ameaçados a ruir por não levarem muito em conta soluções mais bem projetadas.

É óbvio que a solução de alguns problemas impõe mudanças bastante sérias, que levarão tempo para acontecer, não tanto pela falta de tecnologia, mas para acalmar incertezas. Apesar disso, a concordância de que elas são necessárias e a mobilização de empresas gigantes como a Apple, perfeitamente capazes de a viabilizarem, já é um bom sinal de que grandes melhoras estão por vir.

Conheça mais sobre a ideia nesta página.

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Renan Feltri (sobre o autor)

Sou designer de 22 anos e sim, adoro buscar soluções criativas e inteligentes para problemas das mais diversas áreas. Nem mesmo sei quantas vezes me dispus a repensar a planta da casa onde moro. Gosto de achar que um designer se define pela criatividade e paixão em projetar e resolver problemas, não pelo domínio de ferramentas específicas que pode ser adquirido a cada novo desafio. Não prefiro Helvetica, amo tecnologia e sim, já colei post-its por todas as paredes do meu quarto em busca de ideias. Meus pais acharam estranho! 🙂

Você pode me encontrar no renanfeltri.com e twitter

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