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Americanos desenvolvem viagem no tempo e bombardeiam Afeganistão no passado

A manipulação de imagens, para surpresa de muitos antecede o Photoshop. Antecede os computadores. Antecede até a fotografia colorida. Hoje ela está pior do que nunca, é preciso um time CSI para identificar um bom fake, mas para desespero dos falsários, nós temos um: chama-se internet. Com milhões de olhos qualquer vacilo é apontado. Como descobriu o governo do Afeganistão, ao incluir em um relatório sobre um ataque americano em janeiro, imagens de um ataque feito em 2009. Será que Obama tem DeLoreans armados agora?

10 anos atrás

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Existe uma ilusão, que persiste mesmo em tempos de internet e Photoshop, de que imagens são confiáveis, são provas aceitáveis e inquestionáveis, e que realmente valem por mil palavras. Só se for um trecho da biografia da Ex-Vice Miss Bumbum. Na realidade imagens são perfeitamente manipuláveis, e não é de hoje.

Uns 10 minutos depois de a fotografia ter sido inventada, Daguerre pensou “humm vou photoshopar umas gostosas do meu lado nesse selfie e mandar pros brothers”. Uma foto famosa de Abraham Lincoln usou o corpo de outro sujeito. Na 1ª Guerra Mundial fotos compostas de elementos de diversas outras imagens para dar um tom épico e dramático eram publicadas como factuais. O Camarada Stalin por sua vez popularizou o ato de remover desafetos de fotos (e da existência, mas das fotos era mais complicado).

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“apaguem esse cara” “Sim, Camarada Stalin” “E da foto também!”

Na foto acima vemos (e depois não) Stalin ao lado de Nikolai Yezhov, ex-chefe da NKVD, uma espécie de Homeland Security da falecida URSS, que englobava um monte de outras forças, de polícia à futura KGB. Niko caiu em desgraça em 1940, e em um raro caso de karma instantâneo, foi preso torturado e executado pela mesma máquina anti-subversivos que ajudou a criar.

Manipulação de fotos é algo que foi muito usado em guerras. Na imagem abaixo, em uma louvável tentativa de fazer os nazistas parecerem maus, uma enfermeira soviética enforcada aparece adiante de um cruel soldado alemão, rindo. Só que acharam a foto original…

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A fotografia era mais aceita antigamente por ser complicada de manipular. Essas imagens eram feitas com tecnologia medieval, usando reagentes químicos, pincéis com guache, aerógrafos e outras tecnologias que hoje só existem como ícones na toolbar do Photoshop. Não era viável produzir rápido e barato um fake.

Claro, muitas vezes a manipulação se resume a um recorte, que muda totalmente uma imagem. Vide a polêmica envolvendo o Ex-Papa Bento XVI, o Panzer de Cristo, que foi da juventude hitlerista. Alguns dizem que ele era simpatizante, outros que era obrigatório para todos os jovens da época. Para defender seu argumento, o povo que não gostava nem do Papa nem de Hitler (de quem eles gostam?) distribuiu uma foto do jovem Bentinho fazendo a saudação nazista. Só que, de novo, acharam a original:

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A fotografia não é essa testemunha ocular da história toda que contam. Ela traduz o olho do fotógrafo, o olho do editor e o próprio olho do leitor. É preciso calma diante de uma imagem, quando uma simples tesoura pode mudar completamente seu sentido:

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A capacidade de alterar imagens vem aumentando e se popularizando, com a campeã absoluta sendo a Melhor Coréia, os photoshops deles são inacreditáveis, no sentido “não acredito que fizeram essa hagada”. O Irã também tenta, a China chega perto.

O grande inimigo da manipulação de imagens, entretanto, não é a tecnologia forense, mas o olho humano. Antigamente uma imagem era vista por um número limitado de pessoas, que não interagiam entre si. Hoje, quando milhões de pessoas examinam a mesma imagem, fica difícil convencer os outros que aquela pelada da foto É sua prima de Minas.

O último a descobrir isso foi o governo do Afeganistão. Em um relatório divulgado por eles, reclamando de um ataque dos EUA que teria supostamente matado com supostos mísseis 12 supostos civis supostos (céus, como é horrível escrever em jornalistês).

Que há ataques toda hora no Afeganistão, não é novidade. Que morre gente inocente, idem. A novidade aqui é que no suposto dossiê (aqui faz sentido) entre as fotos enviadas como prova do ataque, havia um funeral. Só que gente com olhos atentos percebeu que a foto era de um funeral de 2009, de outro ataque.

Isso é quase tão inútil quanto falsificar fotos de judeus sendo levados para campos de concentração, coisa que os russos fizeram, aliás. Sendo que falsificar algo real AINDA é falsificação. Semana passada a AFP demitiu sumariamente Narciso Contreras, fotógrafo renomado, com um Pulitzer nas costas, por alteração de imagens, algo que é terminantemente proibido em jornalismo. A foto criminosa? Esta, onde ele removeu a câmera de um colega que aparecia no canto da imagem.

Altered Photo

Nos velhos tempos o segredo de muito publicitário criativo se chamava Anuário. Sujeito encomendava nas livrarias anuários de festivais de propaganda, pagava uma fortuna e saía kibando anúncio tcheco o resto do ano. Hoje qualquer “inspiração” mais descarada é detectada pelos leitores, que correm para denunciar o roubo. Por isso nunca linko o pequeno blog da Romênia de onde roubo todos os meus artigos, incluindo este. #INCEPTION!

Há uma certa justiça poética aqui. As próprias pessoas que são alvo da fraude são a ferramenta que a desmascara e denuncia. Quanto mais gente tiver acesso ao material manipulado, coisa que antigamente seria objetivo e indicativo de sucesso para o falsário, mais provável será que ele seja descoberto.

Eu gosto disso.

Quanto aos afegãos, parabéns, champs, vocês desacreditaram um documento sério, com acusações reais de um crime de guerra, por pura ganância de deixar a coisa mais dramática. Dessa vez é Obama quem diz Thanks.

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