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Resenha: Sense8 — outro gol da Netflix, não recomendado pro Feliciano ou pro Pequeno Juan

A Netflix liberou Sense8, a nova série dos Irmãos Wachowski. É uma proposta ousada tanto em forma quanto conteúdo, mas devo dizer que acertaram a mão. Ficção Científica de primeira, só corre o risco de não agradar o fã-clube do Feliciano, visto que tem mais meninos pelados que peça de teatro universitário.

9 anos atrás

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Yes, é a Daryl Hanna

Sense8 não é uma série fácil. Não é uma série pra qualquer um, e definitivamente não é uma série que defende os valores morais da família brasileira, ao cometer a ousadia de tratar personagens gays e transgêneros como seres humanos.

Só que para desespero do Tumblr, Sense8 não é uma série GLS, é uma série onde alguns dos personagens fogem do padrão heterossexual da TV, mas essa não é sua motivação. Não é The L Word, é Heroes sem superpoderes.

A história foi escrita pelos Irmãos Wachoswski (The Matrix) e J. Michael Straczynski (Babylon 5, Moonshadow e um bilhão de outras coisas legais), e mais ousado do que mostrar jirombas e cenas de sexo quase hardcore, foi a proposta de contar oito histórias simultâneas e entrelaçadas, sem se perder. Pior: conseguiram.

O conceito de Sense8 é que por algum motivo misterioso oito pessoas passam a compartilhar sua consciência, eventualmente aparecendo umas para as outras, mesmo morando em lugares bem distantes. As “regras” são belas em sua simplicidade:

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A loirinha islandesa tem uma chave de fenda sônica…

1 — você transporta sua consciência até aonde a outra pessoa está, e “aparece pra ela” ou…

2 — você incorpora sua consciência na outra pessoa, usando suas habilidades, como por exemplo um exímio motorista assume o corpo de uma personagem que não sabe dirigir.

As oito pessoas são:

    1. um galã canastrão latino que não saiu do armário;
    2. um motorista de van em Nairobi;
    3. uma farmacêutica na Índia;
    4. uma banqueira carateca no Pior Coréia;
    5. um policial em Chicago;
    6. um ladrão e chaveiro na Alemanha;
    7. uma DJ islandesa em Londres;
    8. uma hacker transexual lésbica em São Francisco.

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O policial é inicialmente contatado por um tal de Jonas, interpretado por Naveen Andrews, o Sayd de Lost. Ele é uma espécie de Mohinder Suresh levemente menos incompetente, e quer salvar os Sensates da EvilCorp™ (ops, essa é outra série). Da empresa conspiradora malvada implacável.

Enquanto o vilão Whispers, um sensate do mal fecha o cerco atrás dos protagonistas, as vidas deles vão acontecendo, cada um em um canto do mundo. Inicialmente isoladas, eles vão aos poucos aprendendo a se comunicar. É linda a cena em que Capheus, o motorista africano vai atrás dos bandidos que roubaram os passageiros de sua van, a Van-Damn (ele é louco pelo Jean Claude). Ele inicialmente apanha, mas a coreana chutadora de bundas está no meio de uma briga também, se conecta e controlando o corpo de Capheus senta a porrada nuns 4 ou 5 bandidos.

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Essa japa daria trabalho até pra Agente May.

A série foi filmada em locação em vários lugares do mundo, em uma das cenas do Quênia foram 700 extras (figurantes) e 200 carros. Algumas cidades são lindas, outras paisagens, como a Islândia, fascinantes.

Como toda boa ficção científica, Sense8 não é sobre tecnologia, é sobre pessoas. Muito rapidamente você começa a se interessar pelas histórias, e não liga se ninguém passou meia-hora explicando como os Sense8 se comunicam, qual o alcance, quantos Midichlorians precisam.

Todas as subtramas são muito legais, mas se for pra destacar, eu separaria 2:

A história de Capheus, um sujeito com um profundo senso de honestidade, que dirige sua van para conseguir dinheiro e tratar a mãe com AIDS. Ele mora em uma favela em Nairóbi, e a parte dele da história foi melhor que todos os filmes brasileiros de favela já feitos.

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Em uma das cenas Kala, a farmacêutica indiana “aparece” no barraco de Capheus, ele está assistindo Lionheart. Ela repara que a TV é enorme e ele dorme no sofá. Comenta que visitou casas pobres na Índia, e as pessoas não tinham cama mas tinham uma TV grande. Capheus responde:

“Com a cama você permanece na favela, a TV te faz sair dela”.

A história de Lito, o galã mexicano de filmes de ação é meio que o alívio cômico da série, ao mesmo tempo é a mais passional e mais desconfortável pra muita gente que muda de canal quando passa comercial do Boticário. Ele vende pra todo mundo o peixe de garanhão, mas vive um romance secreto com Hernando, até que Daniela, a atriz do filme que ele está fazendo aparece de surpresa e descobre da pior maneira que o tal galã é um Antonio Banderas de Arco-Íris.

Ela sugere que eles formem um trio, é ótimo para a carreira dela um romance com Lito, e dará fachada para que ele saia na rua com Hernando, que seria um amigo ou guarda-costas. O relacionamento funciona muito bem até que o ex abusivo de Daniela aparece, chantageia Lito e tudo dá errado para nosso galã.

O filme que ele está fazendo é especialmente ruim, em varias cenas parece um Matrix exagerado, e por isso mesmo é muito bom.

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Jamie Clayton faz Nomi, mas sejamos sinceros, quantas hackers assim você conhece?

Os Sense8 não possuem superpoderes, só habilidades comuns, que se tornam úteis, essenciais em alguns momentos. Mesmo Lito usa sua capacidade de atuar em dois momentos-chave na trama. Sim, ele paga de Gary Johnston, Team America total.

Em uma das cenas a hacker está fugindo, com ajuda do policial de Chicago, quando entra em um carro, sob ordem dele. Ela fala “mas eu não sei dirigir”. Subitamente ela está no banco do carona, no volante o Capheus. “Eu sei” e sai mandando ver como só quem passou anos dirigindo no trânsito queniano sabe.

Conclusão

Sense8 foge do discurso panfletário e enfia goela abaixo do espectador a verdade que personagens de minorias pouco representadas podem funcionar tão bem quanto quaisquer outros, eles estão ali, fazem parte da trama, e se isso te incomoda, problema seu.

A série também é uma espécie de Anti-Vingadores, Anti-Heroes. Ninguém é especial, todo mundo é comum, mas a lição, que cai como uma tonelada de tijolos quando a gente percebe, é que pessoas comuns são capazes de feitos incríveis quando trabalham juntas.

Uma pena que 46 anos atrás 100 mil pessoas perceberam isso e mandaram um homem para a Lua, e hoje essa idéia de colaborar uns com os outros é tão alienígena que vira tema de uma série de ficção científica.

Sense8 tem 12 episódios na primeira temporada. Já está disponível na Netflix.

moviemaniacsDE — Sense8 | official trailer (2015) J. Michael Straczynski Tom Tykwer Netflix

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