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We Happy Few — Review

O enredo distópico é o ponto forte de We Happy Few, mas apreciar o game pode não ser uma experiência tão... feliz. Confira nossa análise.

5 anos e meio atrás

Quando a Compulsion Games apresentou We Happy Few ao grande público em 2015, o game chamou a atenção por sua temática retrô e um enredo claramente inspirado em obras distópicas clássicas. No entanto, após uma campanha de financiamento coletivo e a liberação do game via acesso antecipado em 2016, os jogadores contataram que ele tinha problemas. Muitos problemas.

Dois anos depois, We Happy Few chega de forma definitiva ao PS4, Xbox One e Windows e embora tenha sido melhor trabalhado, ele ainda está longe de oferecer uma experiência decente como um game propriamente dito. Acompanhe nossa análise e descubra onde a Compulsion errou.

Um roteiro cativante

A trama de We Happy Few se passa em uma realidade alternativa, onde o desfecho da Segunda Guerra Mundial foi bem diferente: o Reino Unido perdeu a Batalha da Grã-Bretanha, a Alemanha nazista invadiu e ocupou o país e os Estados Unidos não entraram no conflito. Em algum momento depois disso, os habitantes de uma cidadezinha insular chamada Wellington Wells fizeram "algo muito ruim", que fez os krauts a abandonarem mas isso deixou marcas profundas na população.

Para aliviar a culpa da população, um nova droga chamada "Alegria" foi criada e ela faz com que o usuário veja o mundo através de um filtro colorido, além de suprimir todas as memórias ruins e torna-lo suscetível à manipulação. Quem se recusa a ser um "Wellie", um cidadão feliz e conformado é marcado como um "Deprê" e uma ameaça ao status quo, bem como os que criaram imunidade à droga e foram expelidos da cidade.

Como consequência, Wellington Wells se tornou um estado policial distópico típico, uma mistura de 1984, Admirável Mundo Novo e a série britânica O Prisioneiro (que teve um remake em 2009, com Jim Caviezel e Ian McKellen). Em muitos aspectos o game se parece com um episódio perdido de Além da Imaginação.

We Happy Few oferece uma linha narrativa única, porém vista de três pontos de vista diferentes: o fio condutor da história é Arthur Hastings, um censor do governo que começa a se lembrar do passado e do irmão perdido Percival (yeah yeah, Crônicas Arturianas e tal), e ao se recusar a tomar sua dose de Alegria passa a ser perseguido pelos Wellies, e começa a desvendar aos poucos a verdade sobre a situação real da cidade e sobre a "coisa muito ruim".

Os outros personagens são Sally Boyle, uma assistente do cientista que criou a droga Alegria e Ollie Starkey, um veterano do exército britânico que faz parte dos rejeitados de Wellington Wells, cada um com seus motivos para fugir da ilha e trazer à tona à verdade sobre a cidade e seus cidadãos.

Embora clichê, a história do game é bem amarrada e as dicas sobre o que os habitantes da cidade fizeram vão surgindo não apenas com o desenrolar do game, mas também através de diversas dicas espalhadas pelo ambiente, como os diários e pichações dos moradores, elementos antigos deixados para trás pelos alemães ou as transmissões diárias do misterioso "tio Jack", o Grande Irmão da vez.

A execução, no entanto...

O grande, enorme problema de We Happy Few reside em todo o resto. Os gráficos são mal polidos e se assemelham muito ao nível de títulos do início da sétima geração de consoles, ficando abaixo de vários games para PS3 e Xbox 360. As animações são duras, o controle é rígido e pouco amigável e a jogabilidade em alguns momentos é fácil demais. Os NPCs são muito burros e num combate de um contra um é muito simples contornar o inimigo e neutraliza-lo.

O design do game como um todo é desastroso. Decisões esdrúxulas fazem com que você encontre toneladas de itens não tão úteis como alimentos podres (que matam sua fome, mas te deixam doente), bandagens sujas (contém sangramentos, mas também fazem mal), galhos de árvore enquanto os mais essenciais, como grampos de cabelo para fazer gazuas e kits de primeiros-socorros são terrivelmente escassos. E para piorar, há um limite de peso que você pode carregar.

O combate aberto também é terrível: lidar com uma turba de inimigos é pedir para ser morto, não apenas por conta dos controles pobres mas pela própria ineficiência de suas armas e técnicas de combate. Junte isso à quantidade limitadíssima de itens de cura e temos um game mal equilibrado, onde você estará sempre no limite (com fome, com sede, doente ou todos ao mesmo tempo) e com o inventário lotado de bugigangas.

Há também uma série de bugs no game: inimigos que saem voando ou que ficam presos no chão, NPCs que somem e levam missões com eles (sem contar que devem haver apenas uns três ou quatro modelos deles), tem de tudo. Eu inclusive fui atacado por inimigos cujos golpes atravessaram uma parede, quando eles na verdade não deveriam sequer me ver já que eu estava em outra sala.

Para completar, o trabalho de localização foi mal feito e não raras serão as vezes em que você verá frases em inglês, ou mesmo legenda nenhuma; o game também encontra dificuldades em destacar quais frases têm prioridade, muitas vezes sobrepondo uma fala aleatória de um NPC enquanto você conversa com outro mais importante. Por outro lado, as vozes são muito boas e os personagens principais da trama possuem bastante carisma.

Dá a impressão que a Compulsion Games esteve mais preocupada em contar a grana arrecadada via financiamento coletivo do que colocar os desenvolvedores para trabalhar no game em si, e olha que os bugs e glitches sempre foram a reclamação principal dos jogadores nos dois anos em que ele esteve em acesso antecipado. Se bem seu game anterior Contrast não era muito diferente, sendo também lotado de bugs.

A pergunta que fica é: teria de fato a Microsoft feito um bom negócio ao comprar o estúdio?

Conclusão

Não há dúvidas de que o enredo é o destaque We Happy Few. A Compulsion Games criou uma história muito interessante, ainda que pegue emprestado diversos clichês de obras literárias e para TV e cinema consagradas, mas a conta de uma forma única e Wellington Wells é uma cidade viva, com muitos segredos nefastos a serem descobertos e personagens bem carismáticos.

O tema "nem tudo é o que parece ser" pode ser um tanto batido, mas não dá para dizer que a desenvolvedora se esforçou para dar forma a uma realidade atraente para o jogador, que precisa remexer na camada superior de felicidade e cores para chegar ao centro podre daquela sociedade.

Infelizmente, tudo o que se aplica ao roteiro cai como uma luva sobre o desenvolvimento de We Happy Few: uma camada bonita que vende a ideia de um game excelente, mas que por baixo esconde um pesadelo de bugs, erros crassos e decisões ridículas de design, que tornam a experiência cansativa e frustrante. O mundo de Wellington Wells é intrigante e atrai o jogador, mas navegar por ele é quase uma tortura; você vai se pegar procurando uma pílula de Alegria para tornar a experiência de jogo mais agradável.

No fim, We Happy Few teria tido mais sorte como uma animação do que como um game: é uma excelente história para ser apreciada, mas terrível de ser jogada.

Nota:

Três de cinco happy pills.

Ficha Técnica

  • Título — We Happy Few;
  • Plataformas —PS4, Xbox One e Windows;
  • Desenvolvedora — Compulsion Games;
  • Distribuidora — Gearbox Publishing;
  • Preço — R$ 249,49 para PS4, R$ 249,00 para Xbox One e R$ 149,00 para Windows via Steam;
  • Pontos Fortes — enredo interessante, que bebe da fonte de diversas distopias famosas mas adiciona elementos originais; boa dublagem e personagens carismáticos;
  • Pontos Fracos — jogo mal programado e mal equilibrado, que o tornam excessivamente difícil de forma não intencional; gráficos pouco polidos, mecânica fraca, jogabilidade horrível e bugs bestas, causados por erros primários.

O Meio Bit analisou We Happy Few no PS4 Pro com uma cópia digital cedida pela Gearbox Publishing.

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