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Irã derruba drone americano de US$220 milhões. Isso significa guerra, certo?

5 anos atrás

O Global Hawk é o Rolls Royce dos drones, e por Rolls Royce entenda caro bagarai. Seu desenvolvimento custou US$ 10 bilhões e valeu cada centavo. Em 2001 um Global Hawk decolou da Base Aérea de Edwards, nos Estados Unidos e pousou 22 horas depois na Austrália, um voo sem escalas, de 13 mil km.

Projetado para voar a uma altitude de 100 mil pés por mais de 32 horas, com alcance de 22 mil km, ele consegue bisbilhotar uma área do tamanho da Islândia em um único dia, tirando todo tipo de fotos, imagens de radar, lasers e sabe-se lá quais outros sensores secretos que ninguém faz ideia que existam.

Existiam é a palavra-chave, não existem mais, ao menos não inteiros. Ontem o Irã derrubou um MQ-4C Triton, a versão naval do Global Hawk.

O ataque ocorreu, segundo os Estados Unidos, em águas internacionais e segundo o Irã, sobre seu próprio território. Foi usado um sistema Raad, uma bateria de mísseis antiaéreos com alcance de até 105 km.

O drone estava voando a 22 mil pés (pouco mais de 7 km) de altitude e não teve nenhuma chance. O ataque foi essencialmente um homicídio premeditado, os iranianos sabiam que o drone estava por ali e planejaram sua derrubada, com direito a vídeo de propaganda mostrando a ação, Allahu Ackkar e tudo.

Os dois lados deslocaram barcos para o local da queda do drone, mas o Irã chegou primeiro e mais tarde divulgou imagens de parte dos destroços:

Felizmente, para alívio de todo mundo, a aeronave não-tripulada não tinha tripulantes, ao menos segundo o brilhante estrategista que no momento ocupa o Salão Oval.

Os americanos divulgaram um vídeo do ataque também. O que levanta um monte de suspeitas.

O Mundo Real não é um filme ruim do SyFy, não existe como você direcionar satélites ou aeronaves de reconhecimento nos poucos segundos ou no máximo minutos entre um lançamento ser detectado e um alvo destruído.

O drone já estava sendo monitorado por um avião de reconhecimento P-8 Orion que, segundo informações, estava a menos de 10 km de distância, o que é BEM preocupante. Mísseis não costumam ser criaturas muito inteligentes, e havia o sério risco da trava do drone ser perdida e o radar do míssil identificar o muito maior alvo que era o avião de reconhecimento.

O próprio Irã disse que escolheu não atacar o avião, mas isso não evitou que a mídia nos Estados Unidos arrancasse os cabelos, e a própria Casa Branca ordenou uma retaliação imediata. Quando os aviões já estavam no ar e os navios posicionados, no último momento o POTUS cancelou o ataque.

Segundo postou no Twitter, Trump pediu uma estimativa das mortes e quando viu o número de 150 iranianos, achou que seria uma resposta desproporcional. O que é estranho, pois todo plano de ataque vem com essa estimativa descrita em alguma parte, a não ser que Trump não tenha lido nada, o que costuma ser o modus operandi normal dele, segundo um monte de testemunhas.

Outros estão especulando que o ataque foi cancelado por causa do tráfego aéreo e naval na região. O Estreito de Hormuz é uma das áreas mais movimentadas do mundo e se o Irã começasse a contra-atacar, sobraria pra um monte de gente.

Mais tarde a FAA emitiu aviso para as empresas aéreas americanas evitarem a região.

Como prova de "força" o Pentágono mandou dois bombardeiros B-52 com quatro caças F-15 de escolta para patrulhar o Estreito, em uma manobra ótima para propaganda mas sem nenhuma utilidade prática, visto que o B-52 é um enorme e lento alvo, aparecendo nos radares inimigos como algo do tamanho de uma cidade pequena.

Claro, isso não impediu a mídia de bater os tambores de guerra, quase literalmente:

Isso pode degringolar em uma guerra?

Alguns leitores vieram me perguntar qual a classificação do caso, na minha Escala VDM (Vai Dar Caca). Em estimei 4/10 mas já baixei pra 3/10, vão ser só alguns dias de gente brandindo espadas dos dois lados e depois tudo volta ao normal, e eu explico:

Uns dias atrás o Irã atacou dois petroleiros no Golfo de Omã, os vídeos mostram lanchas de ataque iranianas, e... não deu em nada.

Claro, um monte de gente em Washington xingou muito no Twitter, mas só. Ninguém vai se enfiar em uma guerra por causa de um navio, muito menos um drone. O próprio Trump foi o primeiro a falar que o ataque ao drone foi "um grande erro por parte dos iranianos", a mídia entendeu como uma ameaça e ele esclareceu dizendo que provavelmente foi algum militar com dedo nervoso no gatilho e o ataque não teria sido autorizado por Teerã.

Historicamente os Estados Unidos não escalam esse tipo de incidente. Se eles têm interesse em provocar um conflito, dão um jeito de provocar uma situação realmente séria. Caso não haja interesse, o outro lado pode fazer o que quiser, como no caso do Lockheed EC-121M Warning Star.

Em 15 de abril de 1969, durante uma missão de rotina o avião de reconhecimento foi abatido por um Mig-21 da Melhor Coreia, a 167 km da costa daquele país. Os Estados Unidos foram pegos de surpresa, era algo que ninguém imaginaria que acontecesse.

Até os russos foram pegos de surpresa, eles condenaram publicamente o ataque e mandaram dos destróieres pra ajudar na busca por sobreviventes, mas os 31 militares a bordo morreram. Foi a maior perda de vidas em uma única aeronave em toda a Guerra Fria.

A resposta de Richard Nixon? Uma manobra naval, basicamente um desfile de navios uma semana depois. Nem um único tiro foi disparado, nem um dólar foi pago como reparação, nem um único "foi mal" por parte dos coreanos.

Óbvio que Nixon era tudo menos pacifista, mas em 1969 os Estados Unidos estavam envolvidos num tal de Vietnã, e por mais que fosse grande a vontade de dar uns sopapos no Grande Líder, não é inteligente dividir seus recursos e provocar guerras desnecessárias.

Que Trump não é exatamente Napoleão não é novidade, mas aparentemente ele está mais pra Nixon, seu pragmatismo está vencendo seu amor pelo melodrama, e se uma guerra com o Irã ficaria ótima na TV, no papel ela não é tão interessante. Quando os aviões começam a voltar com os corpos dos rapazes (e agora das moças também, yay igualdade!) a popularidade cai e a reeleição fica meio complicada.

Vai durar essa "paz"? Dificilmente, Irã e Estados Unidos historicamente vivem se pegando, com casos sérios como aviões de passageiros derrubados e navios torpedeados, mas nunca se enfrentaram em um conflito tão moderno. Se o bicho pegar, nem o Ben Affleck vai conseguir resolver dessa vez, vai ser Argo we are all f*****.

A nós, só nos resta esperar, acompanhar as informações e prestar atenção nas fake news, pois o que mais tem é gente promovendo sua narrativa usando imagens e informações falsas.

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