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GTA: como um jogo politicamente incorreto se tornou sucesso mundial

Conheça a história por trás da franquia GTA, e entenda por que o "simulador de vida bandida" faz tanto sucesso entre os jogadores

4 anos atrás

A franquia GTA, ou Grand Theft Auto é uma das mais bem-sucedidas da indústria dos games, com mais de 235 milhões de unidades vendidas desde o primeiro título. A marca que é a menina dos olhos da Rockstar Games foi tema de inúmeros estudos ao longo dos anos, pivô de diversas polêmicas e já levou a desenvolvedora e seus criadores ao banco dos réus, mais de uma vez.

Rockstar Games / GTA V

Os jogos da franquia, que estão entre os melhores exemplos do gênero sandbox/mundo aberto, sempre foram conhecidos pelo seu elemento principal: o humor ácido calcado no politicamente incorreto, onde nada nem ninguém está livre de ser criticado, ridicularizado e, muitas vezes, transformado em alvo nas mãos dos jogadores.

Afinal, como um jogo tão errado se tornou tão popular?

De Race'n'Chase a GTA

A história de GTA começa com Sam e Dan Houser, dois jovens de Londres que cresceram influenciados pelo cinema norte-americano, em especial histórias urbanas e violentas, como Os Implacáveis (1972), dirigido por Sam Peckinpah e estrelado por Steve McQueen, sobre ex-presidiários planejando o roubo de um banco no Texas.

Outro filme que também exerceu forte influência nos Houser foi The Warriors: Os Selvagens da Noite (1979), que seria muitos anos depois adaptado como um jogo pela própria Rockstar Games. Em 1995, Sam e Dan foram trabalhar na BMG Interactive, uma divisão da gravadora alemã, para trabalhar com jogos, com referência por seus gostos em contar histórias.

Nesse meio tempo, os irmãos notaram um jogo que estava sendo desenvolvido por um estúdio escocês chamado DMA Design, que se chama Race'n'Chase. Nele, o jogador teria que cumprir missões para criminosos, em cenários com visão isométrica. O projeto estava empacado, mas o grau de liberdade permitida no protótipo convenceu os Houser de que este era um jogo interessante e, assim, a BMG distribui o título, já finalizado e renomeado para Grand Theft Auto, em 1997.

O primeiro GTA já era um jogo bem simples visualmente para a época: a visão aérea e os gráficos simplificados o fazia parecer um intermediário entre a terceira e quarta geração de consoles e muitos veículos de mídia o acusaram de ser muito simplista. Alguns já apontavam uma potencial "glamourização" do crime, mas outros fatores, como a trilha sonora e uma excelente jogabilidade foram muito elogiados.

Como resultado, GTA vendeu mais de um milhão de cópias, um número impressionante para a época. Pouco tempo depois, a Take-Two Interactive comprou a BMG Interactive e suas marcas (incluindo Grand Theft Auto) e os Houser reestruturam o que sobrou dela em uma nova desenvolvedora, chamada Rockstar Games. Sam assumiu a presidência, com Dan como VP e principal roteirista, tendo escrito os enredos de todos os jogos da série.

Em 2002, a subsidiária DMA Design foi renomeada para Rockstar North, e é até hoje a responsável por todos os títulos da franquia, com exceção das expansões GTA London, da Rockstar Canada (hoje Rockstar Toronto), e de GTA Advance (2004), desenvolvido pela Digital Eclipse para o Game Boy Advance.

A arte imita (e alopra) a vida

Quando GTA III foi lançado em 2001, a franquia deu um salto gráfico quando comparado aos dois anteriores (GTA II saiu em 1999): ao contar com cenários em 3D, a liberdade do jogador foi enormemente expandida, trazendo um novo nível de interação em jogos de mundo aberto. Cumprir as missões se tornaram apenas uma das várias coisas que você pode fazer no jogo e há uma série de eventos menores e coisas a fazer: roubar lojas, dirigir sem rumo, ficar em casa sem fazer nada...

Os elementos técnicos foram sendo aprimorados a cada novo jogo, culminando em GTA V, que traz uma reprodução praticamente perfeita de Los Angeles (aqui, Los Santos) e arredores.

Tecnicalidades à parte, o elemento que sempre diferenciou GTA de seus pares foi a violência, o humor absurdo, o politicamente incorreto e, principalmente, o fato de que nos jogos da série, ninguém vale o que come. Todos os personagens, dos principais aos coadjuvantes, são ou pessoas com valores morais questionáveis, ou com um histórico criminoso, ou malucos incorrigíveis. A série se vende pelo exagero, pegando casos reais e extrapolando acontecimentos para contar histórias paralelas.

Muitas dessa histórias paralelas renderam processos à Rockstar, de Lindsay Lohan a Karen Gravano, filha de um ex-chefão da Máfia e posterior dedo-duro.

O consenso é que ser bonzinho em GTA é um péssimo negócio, mas isso não quer dizer que ser "100% Vid4 Lok4" não traga consequências. Claro que ter a liberdade para fazer o que quiser é algo muito atraente e os jogos da franquia permitem que você frequente bares, participe de mini-games diversos, faça escaladas, salte de para-quedas, aprenda a pilotar aeronaves, dirija pela cidade de modo civilizado e parando nos faróis, assista TV, acesse redes sociais, ganhe dinheiro na bolsa, cace criminosos procurados, procure ETs, doe dinheiro ou entregue vítimas para seitas malucas... E claro, roube veículos para fazer uma grana, afinal esse é o nome do jogo.

Válvula de escape

Ainda assim, o elemento que talvez explique melhor o sucesso de GTA seja a catarse. Tudo no jogo é exagerado, tirado de proporção. Você pode explodir lojas, mandar inimigos para a vala, correr como um louco pela cidade, tudo sem grandes consequências. Claro, desde que você consiga fugir da polícia.

A diversão de GTA é seus jogos serem um espelho distorcido (na maioria das vezes) do mundo real, com personagens caricatos e estereotipados de todos os tipos. Ninguém escapa da zoação, tudo e todos são alvos independente de posição social, etnia, gênero, orientação sexual, se são conglomerados empresariais, emissoras de TV, estúdios de cinema ou ONGs... Dan Houser (que está deixando a Rockstar) sempre manteve um elemento comum em suas histórias, todos os personagens são ou cretinos, ou malvados, ou pirados ou todas as alternativas, como no caso de Trevor Philips.

E é exatamente essa realidade extremamente forçada e absurda que torna o jogo atraente. As pessoas vêem GTA como uma válvula de escape, onde eles podem pirar à vontade, sabendo muito bem que se trata de ficção. É a mesma relação que fãs de filmes de terror têm com suas obras favoritas. É o desejo de curtir situações catárticas, seja cenas de extremo gore a um maluco barbarizando rivais de negócios.

Rockstar Games / GTA V

Trevor é um dos piores personagens (enquanto ser humano) de toda a franquia, e exatamente por isso, um dos mais queridos pelos jogadores

Chega a ser curioso Dan Houser ter dito, tempos atrás, que um GTA VI irritaria muita gente e este pode ser um dos motivos para a sua saída da Rockstar: o público hoje tende a não tolerar obras que fazem questão de serem erradas, como a grande franquia dos ladrões de carros é desde o início. Ainda assim, GTA sempre prezou a liberdade à violência e deixa o jogador tomar o rumo que quiser, se ser um maluco ou mais comportado.

Um GTA novo "medicado" seria a sentença de morte da franquia. Logo, é capaz que não tenhamos novas aventuras em Liberty City, Vice City ou Los Santos tão cedo, o que é uma pena.

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