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8 coisas que todo mundo aprendeu errado com filmes de guerra

Os filmes de guerra costumam ter muitos erros, mas alguns são tão comuns e recorrentes que acabam passando despercebidos, criando uma visão errada

4 anos atrás

Filmes de guerra não são documentários, e claro que ninguém espera precisão histórica, mas existem algumas tropes que são repetidas em quase todo filme, formam uma série de regrinhas que acabamos achando que são verdadeiras, quando em verdade estão muito longe disso.

Nesta listinha vamos conhecer algumas dessas situações, e entender como elas se distanciam da realidade, seja por preguiça, seja por necessidade dramática.

Como sempre, as regrinhas: São conceitos errados, não errinhos de minúcia como filmes aonde o sujeito dispara o míssil usando o botão do rádio, ou o painel do caça mostra que o bicho está no chão com a capota aberta.

1 – Submarinos não fazem ping

Em quase todo filme de submarino ouve-se ao fundo um constante “ping”, associado com o sonar ativo. Na prática isso seria uma excelente forma de suicídio. Submarinos não fazem ping, não se puderem evitar.

Existem dois tipos básicos de sonar, o ativo e o passivo (ui!). O sonar ativo emite sons, pings, que são refletivos nos alvos, detectados pelo submarino e com isso conseguem determinar distância, direção etc. Só que isso é uma péssima ideia.

Imagine o sonar ativo como uma lanterna, você está numa floresta procurando o inimigo, durante a noite. Você enxerga algumas dezenas de metros com sua lanterna, já o inimigo, a Km quilômetros de distância, consegue te ver. Com o sonar ativo é a mesma coisa.

A coisa redonda na frente é o conjunto emissor de sonar do USS Thresher.

Por isso mesmo equipados com sonares ativos de milhões de dólares, submarinos nunca os usam, e mesmo que usassem, hoje em dia os sonares trabalham em frequência de ultrassom, então só o cachorro de bordo ouviria os pings.

Todos preferem usar o bom e velho sonar passivo, composto de sensores na proa, nas laterais e dependendo do submarino, um conjunto de hidrofones rebocados, um cabo com sensores a cada dois metros, que pode ter vários quilômetros de comprimento.

Compartimento do sonar rebocado de um submarino soviético Classe Akula.

Esse sonar passivo apenas escuta ruídos do ambiente, e através de extrema macumbaria digital identifica o que são baleias transando e o que são destróiers ianques imperialistas.

2 – Mísseis não voam por horas

OK, voam, mísseis de cruzeiro, mas não mísseis normais, como os de Top Gun, que aliás usa mísseis corretamente, mas Top Gun é exceção. Em geral o sujeito recebe o alarme que está sob ataque de mísseis, então começa todo tipo de manobra evasiva, com o míssil voltando para novo ataque, e a cena dura intermináveis minutos.

Na prática mísseis não são nem de longe tão manobráveis, eles não tem como reduzir a velocidade e seu motor de combustível sólido vai queimar até esgotar. No caso de um AIM-120 AMRAAM esse tempo não passa de 2 minutos. Um Sidewinder não vai voar mais de 41 segundos. Mísseis tem uma única chance de atingir o alvo, o que costumam fazer por serem muito, muito mais rápido que os seus alvos, com uma honorável exceção: O SR-71 Blackbird.

Essa cena é ridícula.

No manual do avião a instrução para caso o avião fosse alvo de mísseis soviéticos, era apenas “continuar voando em linha reta e acelerar”.  O Blackbird voava tão alto e tão rápido que nenhum dos mais de 2000 mísseis lançados contra ele sequer chegaram perto.

3 – Caças raramente enxergam o inimigo e nenhum avião usa mais canhão

Combate aéreo em filmes começa com aviões voando em formação cerrada, o que nunca fazem em combate, pois se um for alvejado de surpresa e explodir, fatalmente irá atingir o amigo com estilhaços. Em seguida geralmente partem para um combate extremamente próximo aonde alternam entre mísseis e canhões com milhares de cartuchos de munição.

Na prática 99% do combate aéreo é BVR – Beyond Visual Range, Além do Alcance Visual. Um AIM-54 Phoenix podia ser lançado de um F-14 contra alvos a mais de 190Km de distância. Hoje em dia um AIM-120D AMRAAM pode ser disparado a mais de 160Km do alvo. Tudo que o piloto vê é um pontinho em uma tela de radar.

Se o Tom Cruise decolar do Santos Dumont com seu F-14, esse é o alcance de seus mísseis Phoenix.

Há quem considere canhões a bordo até um desperdício, e no Vietnã o McDonnell Douglas F-4 Phantom II foi projetado sem canhão, apenas para os pilotos descobrirem que os mísseis usados na Guerra do Vietnã eram uma bela bosta, e eles acabaram em extrema proximidade dos MIGs inimigos, esses portadores de canhões bem funcionais.

Desde então todo caça de superioridade aérea americano, mesmo o F-22 conta com canhões, mesmo que seu uso seja extremamente improvável.

Ah sim, e por falar em canhões, todo filme sempre usa sonoplastia de metralhadora ratatatata, sendo que um canhão usado em caças modernos soa completamente diferente. Um F-22 usa um canhão General Dynamics GAU-12/U Equalizer, disparando a 3300 tiros por minuto.

Ele soa como um zíper:

Ah sim 2 – a missão: Esqueça aquelas longas cenas de aviões disparando por horas. O F-22 leva 480 cartuchos de munição. A 3300 tiros por minuto isso dá menos de 9 segundos de disparo contínuo. E antigamente não era muito melhor, na 2ª Guerra os Spitfires levavam 8 metralhadoras Browning MK-2, mas somente 350 cartuchos pra cada uma.

4 – Ninguém voa através da explosão do inimigo

Essa é especial para filmes espaciais, mas começou em filmes de guerra. É uma daquelas situações criada pela “Rule of Cool”, a regra que define que algo pode ser errado em um filme se ficar legal pra caramba. Por isso Jedis usam sabres de luz, uma arma totalmente sem-sentido depois que inventaram armas de projéteis, a China antiga.

Em filmes, você sabe da cena que estou falando: O mocinho atira no avião inimigo até ele explodir em uma grande bola de fogo e fumaça. O caça segue, atravessando triunfantemente a nuvem, emergindo vitorioso.

Tá tranquilo, foi destruído, eles cancelam a detecção de colisão, pode voar direto no meio da explosão.Se você tentar fazer isso na vida real, irá descobrir duas coisas: Primeiro, todos os pedaços do avião inimigo que estava se movendo a 700, 800Km/h na sua frente estão vindo em sua direção, e dada a velocidade relativa, estão bem rápidos. Em fracos de segundo seu avião será coberto por combustível, óleo, pedaços de tripulantes inimigos, peças de metal cortante, etc.

A segunda coisa que você vai aprender é que seus motores não reagem bem a fragmentos de metal, e quando aspirarem todos aqueles destroços, vão se desintegrar.

5 – É muito mais difícil atingir o inimigo do que parece

Em filmes há sempre uma abundância de alvos, mesmo que o inimigo esteja de frente. É quase um tiro, uma morte, mesmo com todo mundo disparando em rajada, outra coisa que só acontece em filmes. Nem em videogames você consegue mirar direito uma arma automática, elas são ótimas pra fogo de supressão, não para acertar alguma coisa.

No caso o problema é outro. Atingir o inimigo é complicado por dois motivos:

O primeiro: a maioria das pessoas não gosta muito da ideia de matar outro ser humano, e também não considera a possibilidade de ser morto uma boa expectativa, então ao invés das grandes cargas de infantaria com soldados corajosos dos filmes, os soldados tendem a se proteger. Com isso na Segunda Guerra só algo entre 15% e 20% dos soldados na linha de frente sequer dispararam suas armas. Desses, os que atiraram para matar foram menos ainda.

O segundo motivo: É danado de complicado atingir um alvo a centenas de metros, em movimento e camuflado. Você dispara muito, erra mais ainda e na soma de todos os disparos chega a números assustadores, quase tão ruins quanto os meus no BF4: Na Segunda Guerra os americanos dispararam 100 mil tiros para cada inimigo alvejado.

Na Guerra do Golfo, dadas as distâncias envolvidas, esse número chegou a 307 mil tiros de armas leves por inimigo atingido. Haja bala.

6 – O maior inimigo é o tédio

Em filmes o sujeito chega na base, recebe um rifle e vai pro combate, aonde encontra o inimigo diariamente. Aviões saem em patrulha e em dois minutos estão atirando nos alemães. Na prática guerra lembra mais minha lua de mel, longas horas de tédio seguidas de poucos minutos de terror.

Filmes de guerra tendem a condensar extremamente o tempo. Uma missão de bombardeio era um loooongo voo aonde nada acontecia, até que o Inferno estourava.

Soldados desocupados...

Decolando da Inglaterra, os aviões começavam a voar em padrões de espera, até todo mundo estar no ar e poderem rumar em grupo para Berlim. Essa espera podia levar até 90 minutos. Depois disso, ida e volta eram 1700Km, em um avião que voava a 293 km/h. Faça as contas.

Submarinos então, pior anda. Um monte de homens em um tubo de metal, às vezes semanas sem encontrar um algo, sem TV, sem Rádio, sem Internet e sem privacidade. Esse tédio todo ao contrário da Sarajane é péssimo para o moral e pro drama, então é algo que nenhum filme de guerra mostra.

Não pergunte.

O que um soldado mais faz em tempo de guerra é esperar, e a mente vazia é oficina do capeta. Doenças, depressão, suicídio surgem mais da espera do que do stress do combate. Para tentar reduzir isso treinos e simulações são constantes, mas o pessoal acaba perdendo a eficiência.

7 – Não existem mais batalhas navais

Seja em Battlestar Galactica seja em Yamato ou em qualquer filme de guerra todo mundo reconhece a cena de navios de grande porte trocando tiros com seus poderosos canhões, mas hoje o maior calibre embarcado é o canhão de 155mm do Advanced Gun System do USS Zumwalt. Uma piada perto dos canhões de 460 mm do Yamato.

Com o tempo a capacidade de atingir outros navios com canhões foi saindo de moda, fato demonstrado na Batalha de Midway, quando pela primeira vez na História duas forças navais se pegaram na porrada sem que nenhum dos dois lados tivesse contato visual com o outro.

Bons tempos...

Foi tudo decidido por aviões, que podem ir muito mais longe levando muito mais armamento com muito mais precisão. Hoje canhões são reservados para a última linha de defesa, todo o ataque é feito por aviões e mísseis, um submarino atulhado de mísseis de cruzeiro como este russo aqui:

É muito mais eficiente e seguro do que chegar a 40Km da costa do inimigo pra usar canhões.

Batalhas navais com navios colados trocando tiros são coisa do passado, por mais que os filmes de guerra de Hollywood digam o contrário.

8 – Tudo quebra, não adianta

Uma das Leis de Murphy para Combate diz que nenhum plano sobrevive ao primeiro contato com o inimigo, mas é pior que isso. Em filmes de guerra os aviões se portam como máquinas perfeitas, todas as armas funcionam sem falhas, canhões acertam de primeira.

Torpedos mesmo quando erram, só o fazem no último momento. Mísseis voam com precisão, navios passam meses em combates desgastantes, mas nada sofre desgaste.

Se quanto acontecia com a bicicleta já era chato de colocar de volta...

Na realidade boa parte dos primeiros tanques ingleses na 1ª Guerra Mundial nem conseguiam chegar ao campo de batalha, de tanto que quebravam. O F-14 do Maverick era conhecido como Rainha do Hangar, exigindo intermináveis horas de manutenção.

Os Spitfires voavam com oito metralhadoras, mas quatro costumavam travar toda hora por causa de frio excessivo; levaram um ano pra identificar e corrigir o problema.

Os nazistas também sofreram, coitados (a turma do cancelamento vai adorar tirar essa frase de contexto). Os tanques mais avançados, como o Tiger e o Panther viviam dando problema. Inicialmente somente 16% dos Panthers produzidos tinha condições de combate.

Reza a lenda que quando um tanque novo chegava os alemães deixavam o motor funcionando por algumas horas, depois drenavam o óleo, que vinha com 1Kg de aparas de metal do motor.

Quanto mais sofisticado um equipamento, mais chances ele tem de falhar, e ah, eles falham. Em todos os lugares, nações e ideologias. Falham até em condições controladas e testes, como este míssil russo que resolveu brincar de Programa Espacial Brasileiro:

Ou este Patriot americano na Arábia Saudita, que decidiu que não era mais um míssil antiaéreo...

Especialmente ruim foi esta arma antiaérea russa que resolveu travar feio no automático e, bem... os resultados falam por si só.

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