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O esforço para manter viva a história dos fliperamas

Com o setor agonizando, conheça algumas pessoas que seguem lutando para fazer com que os fliperamas que ainda restam continuem com as portas abertas

3 anos atrás

Tente imaginar o seguinte cenário: à procura de diversão, você vai a um estabelecimento mal ventilado onde pessoas estão jogando, bebendo, fumando e conversando. Ao entrar no local, você vê diversos sujeitos mal-encarados e por mais que queira aproveitar o momento, sabe que terá que tomar todo o cuidado do mundo, tentando evitar ser assaltado ou até mesmo levar uma surra. Esta bem que poderia ser uma cena de algum filme de faroeste, mas para quem frequentou fliperamas nas décadas de 80 e 90, dependendo da região este tipo de situação era comum.

Crédito: Francesco Ungaro/Pexels

Quem não viveu aquela época pode estar se perguntando, “se o que acabei de ler era verdade, o que levava as pessoas a frequentarem este tipo de ambiente?” Pois a resposta estava tanto na possibilidade de "medir força" com outros jogadores, quanto na tecnologia entregue por algumas máquinas. Outrora o ápice do que os jogos eletrônicos podiam entregar, mesmo com os consoles mais populares tentando reproduzir os títulos que víamos nos fliperamas, a diferença muitas vezes era significativa e por isso muito do que temos hoje só é possível porque empresas optaram por explorar aquele mercado.

O problema é que encontrar essas máquinas hoje em dia é uma tarefa muito difícil. Tirando uma ou outra loja presente em alguns shoppings, os fliperamas praticamente desapareceram. E foi ao perceber que com isso estávamos perdendo uma parte muito importante da história dos games, que algumas iniciativas estão surgindo para tentar, se não reverter a situação, ao menos garantir que alguns deste lugares continuem funcionando.

Entre elas está a Saving The Arcade World, campanha lançada pelo pessoal da Team17 e que visa  arrecadar fundos para três instituições: o The Strong National Museum of Play, localizado em Rochester, Nova York; o The National Videogame Museum, que fica em Sheffield, Inglaterra; e por fim o Museo del Videojuego Arcade Vintage, situado em Alicante, Espanha.

Fliperamas

Crédito: Arcade Perfect/Wikimedia Commons

Para ajudar a divulgar a campanha, a editora a vinculou ao Narita Boy, jogo com um estilo retrô e que está sendo desenvolvido pelo Studio Koba, com seu lançamento estando previsto para acontecer até o final de 2021. Além de doar para os três supracitados museus o faturamento com as vendas da música Saving The World, que foi criada para o jogo, eles pretendem vender um gabinete que virá com o título instalado. Há também o plano para um evento de caridade que deverá ser realizado durante o nosso outono.

Mas não pense que movimentos como este podem ajudar apenas as coleções mantidas em museus. De acordo com o diretor do Centro Internacional para História de Jogos Eletrônicos do The Strong National Museum of Play, Jon-Paul Dyson, a procura por ambientes com máquinas de fliperama vinha aumentando.

Embora não seja mais a força dominante que era nos anos 1970 e início dos 1980, o contínuo sucesso dos centros de entretenimento familiar tem garantido uma clientela permanente para certos jogos — especialmente os jogos de resgate de bilhetes.

[…] o movimento barcade 1 despertou o interesse não apenas em novos jogos, mas também em clássicos jogos arcade e isso combinou com o aumento no interesse por pinball. Tudo isso significa que não apenas as empresas estabelecidas estão indo bem, mas que também houve um aumento no número de companhias boutiques produzindo jogos para os setores arcade e pinball.

Contudo, o setor foi mais um que desde 2020 tem sofrido com a política de isolamento social implantada em muito lugares devido a pandemia da COVID-19. Afetando desde o mercado de lojas voltadas para dispositivos de realidade virtual, até gigantes como a Sega, que primeiro fechou seu famoso arcade localizado em Akihabara, para depois vender a divisão dedicada a este tipo de jogo, o estrago tem sido imenso.

O duro impacto do coronavirus nos fliperamas

De acordo com o CEO do British Games Institute, “a pandemia e o subsequente lockdown levou alguns fliperamas retrô a fecharem permanentemente.” Já o cofundador do Museo del Videojuego, Joaquín Litarte Maestre, afirmou que eles tem sofrido muito, pois estão com as portas fechadas desde março do ano passado e com pouca esperanças de que isso mudará em breve.

A verdade é que o negócio de arcades tem vivido por aparelhos há muito tempo e o isolamento social só ajudou a evidenciar o problema. Isso se deve ao fato de que enquanto boa parte da indústria de games conseguiu permitir que seus profissionais continuassem trabalhando remotamente e o faturamento até aumentasse durante este período, quem ainda seguia resistindo com uma loja repleta de gabinetes e contando com as moedinhas gastas pelos jogadores não teve a mesma sorte.

Uma dessas pessoas foi Mark Starkey, dono de um dos últimos fliperamas da Inglaterra, o The Heart of Gaming. Percebendo o que estava por vir, ele decidiu fechar a loja uma semana antes do governo local decretar o lockdown e a partir daquele momento começou a pensar no que precisaria mudar. Sabendo que as pessoas relutariam em voltar a frequentar locais com aglomerações, ele aumentou a higienização das máquinas, espalhou pela loja dispositivos para que os consumidores possam limpar as mãos e passou a torcer para que, apesar das adaptações, um dia tudo volte a ser como antes.

Crédito: Divulgação/Arcade UFO

Já no outro lado do Atlântico, o que impediu que Matt Laux fechasse as portas do Arcade UFO — ou que tivesse que demitir alguns funcionários — foi a ajuda financeira dada pelo governo dos Estados Unidos. Já o pessoal do Super Arcade, uma tradicional loja localizada na Califórnia não teve tanta sorte. Sem conseguir acesso ao programa de auxílio, eles tiveram que encerrar as atividades.

Mas se teve um lugar onde os donos de fliperamas sofreram ainda mais com o isolamento, foi o Japão. Com muitas lojas espalhadas pelo país e sem que os governantes tivessem tomado uma atitude no início da pandemia, o resultado foi o fechamento de diversos estabelecimentos. Mesmo sem terem passado por um lockdown nos primeiros meses, os proprietários tiverem que decidir entre manter as lojas funcionando e zelar pela saúde dos funcionários.

A saída encontrada por alguns foi recorrer a doações por parte da comunidade, como foi o caso da Game Newton, da Mikado Game Centre e da Big One Arcade. E esta proximidade com os jogadores parece ser um ponto em comum entre os fliperamas de menor porte que continuam funcionando mundo afora. Para Matt Laux, “a nossa comunidade é como a nossa família e não sinto que algo possa nos tirar isso.

E por mais que não queiramos isso, talvez chegue o fatídico dia em que será noticiado o fechamento do último saloon dos games, mas se isso acontecer, espero que as palavras de Rick Gibson, CEO do British Games Institute e que cuida do National Videogame Museum, tenham sido ouvidas e as tentativas de manter viva a história dos games tenham surtido algum efeito:

Podemos argumentar que você não sabe para onde está indo sem saber de onde veio. É sempre revelador quando jovens desenvolvedores vêm às galerias e descobrem game designs de 30 anos atrás que eles nem sabiam que existiam. Somos por definição uma indústria pioneira, mas algumas destas rodas não precisam ser reinventadas e os inventores originais ainda possuem muito a ensinar aos inovadores de hoje em dia.

1 Barcade é uma rede de bares que se espalhou pelos Estados Unidos e onde as pessoas vão para jogar games que fizeram sucesso nos fliperamas ou pinballs e tomar cervejas artesanais.

Fonte: GamesIndustry [1 e 2].

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