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Ken Levine e o turbulento desenvolvimento do BioShock Infinite

Novo livro de Jason Schreier traz relatos de jogos que passaram por grandes problemas durante seus desenvolvimentos, como foi o caso do BioShock Infinite

3 anos atrás

Pessoas terem que encarar longas jornadas de trabalho para terminar o desenvolvimento de um jogo é algo que infelizmente está se tornando cada vez mais comum. Quando se trata de grandes produções, raras são aquelas que não transformaram a vida dos profissionais num verdadeiro inferno, com as semanas antes do lançamento parecendo não ter fim, mesmo com o prazo ficando assustadoramente perto do fim. Com o BioShock Infinite a história não foi diferente.

BioShock Infinite

Crédito: Divulgação/Irrational Games

Desenvolvido pela Irrational Games, com o roteiro e a direção ficando sob a responsabilidade de Ken Levine, o projeto teve início logo após o lançamento do primeiro capítulo da franquia, lá em fevereiro de 2008. Porém, embora a 2K Games quisesse uma continuação direta para o FPS, com a aventura novamente se passando no fundo do mar, o game designer tinha outros planos, preferindo explorar outra ambientação.

Dada a sua fama, Levine conseguiu carta branca da Take-Two Interactive e pelos próximos cinco anos comandaria uma equipe formada por cerca de 200 pessoas para dar vida ao seu sonho. Tendo participado da criação de jogos como Thief: The Dark Project, System Shock 2, Freedom Force e Tribes: Vengeance, ele costuma ser tratado como um gênio, mas para aqueles que tiveram a oportunidade de trabalhar com o sujeito no BioShock Infinite, esta genialidade nem sempre foi facilmente compreendida.

Tendo uma certa dificuldade para comunicar suas ideias, era comum Levine querer mudar, recomeçar e até mesmo descartar grandes trechos do jogo ou pedaços que haviam sido criados para cidade flutuante de Columbia, sempre baseando-se no que ele imaginava ser o melhor para os jogadores.

Segundo o produtor Joe Faulstick, “[Levine] não é o melhor diante de uma página em branco. Se ele estiver numa situação em que não sabe o que quer, nem sempre é o melhor com quem se trabalhar.” Já na opinião de outra pessoa que trabalhou com o game designer, trata-se de alguém brilhante, “mas que nem sempre sabe como te contar o que quer.

Foi então que por volta de 2010, depois do jogo ser anunciado ao público, que esse comportamento se tornou constante e com os artistas, programadores e level designers vendo semanas de trabalho sendo jogadas fora, o progresso estagnou e a moral começou a cair.

Crédito: Divulgação/Irrational Games

Para piorar ainda mais a situação, executivos da 2K Games estavam preocupados com o atraso no desenvolvimento e para justificar o alto investimento em um jogo cujo escopo só aumentava, optaram pelo pior caminho, que foi torná-lo ainda maior. Imaginando que um maior fator replay faria com que o título venderia mais, a editora sugeriu a criação de dois modos multiplayer, mas logo ficou claro que eles não combinavam com a campanha principal. Percebendo o problema, o estúdio decidiu cancelar os modos e remanejar as pessoas que estavam trabalhando neles para ajudar na conclusão da campanha principal.

Novamente, a mudança de direção não foi bem recebida por parte daqueles que participavam do projeto e nos próximos meses o que se viu foi a saída de vários profissionais que estavam nos cargos mais altos da empresa. Em contrapartida, a Irrational tratou de “sair às compras" e entre as pessoas que passaram a fazer parte da equipe estava o produtor Don Roy. Tendo participado de vários lançamentos de grande porte, o que o veterano viu ao chegar na empresa em março de 2012 foi um cenário desolador.

Cheguei lá e essencialmente não havia nenhum jogo. Uma tremenda quantidade de trabalho havia sido feito. Ele apenas não tinha sido apresentado como um jogo, de nenhuma forma em particular, ao ponto em que a primeira coisa que fiz foi perguntar: ‘posso jogar uma versão do jogo?’ A resposta foi não. Eles disseram, ‘você pode jogar esses pedaços, mas não há um jogo que funcione de verdade.’

Estávamos terceirizando muitas coisas e elas nunca chegavam ao jogo porque o processo não estava estabelecido. As pessoas estavam pedindo coisas e elas eventualmente eram feitas, mas então elas seguiam adiante e quando a arte voltava, elas diziam, ‘não, na verdade não preciso mais disso.’”

Mas não foi apenas a mão de Don Roy que fez a criação do BioShock Infinite progredir. De acordo com pessoas que trabalharam no projeto, se não fosse pela contratação de Rod Fergusson, o jogo nunca teria sido lançado. Vindo da Epic Games, ele ganhou a reputação de ser “O” cara responsável por concluir desenvolvimentos e na Irrational fez isso ao dividir tarefas e principalmente, implementar um obrigatório sistema de crunch — as famosas horas extras a que são submetidos aqueles que trabalham na criação de games.

Contudo, aquilo em que Fergusson provavelmente mais acertou foi ao conseguir conversar com Ken Levine. Ao deixar o game designer aproveitar sua melhor parte, que é a criatividade, o executivo assumiu as rédeas do projeto e serviu como ponte entre as pessoas que estavam com a mão na massa e aquele que, no final das contas, ainda seria creditado como diretor do BioShock Infinite.

Crédito: Divulgação/Irrational Games

Tais revelações fazem parte do novo livro Press Reset: Ruin and Recovery in the Video Game Industry, do jornalista Jason Schreier. Assim como em sua publicação anterior, o excelente Sangue, Suor e Pixels, esta traz relatos de conturbados desenvolvimentos de games e bastou o trecho ser publicado no site Polygon para que outras pessoas envolvidas na criação da Irrational Games utilizassem o Twitter para contar suas histórias, como foi o caso do produtor Mikey Soden. Ele disse:

Enquanto esperava na fila de bebidas na festa de lançamento, escutei duas esposas de desenvolvedores da Irrational falando sobre como era bom ter seus entes queridos de volta — que o último ano tinha sido como um divórcio. Olhei para minha esposa e perguntei se ela sentia o mesmo… ‘Sim.’ Veja como o Infinite me mudou: prometi que nunca faria aquilo à ela novamente e comecei a procurar vagas fora da Irrational. Prometi a mim mesmo, como produtor, que eu nunca faria aquilo com uma equipe.

É sempre triste ouvir que um estúdio fechou… É especialmente duro quando você sabe o custo tanto para a equipe quanto para as famílias. O fechamento da Irrational era inevitável. O método de operação simplesmente não era sustentável e estou aliviado que o sucesso do jogo não galvanizou uma maneira altamente problemática e prejudicial de trabalhar através da falsa equivalência. Doeu quando o estúdio fechou, mas também iniciou um processo de recuperação.”

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