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Cidade do México, a metrópole que está afundando rápido

Entenda como um tremendo erro de planejamento faz com que certos pontos na Cidade do México afundem mais de um metro por ano

3 anos atrás

Em uma cena de Volcano — A Fúria, a geóloga interpretada pela atriz Anne Heche menciona que a parábola da casa construída sobre a rocha é a passagem bíblica favorita entre seus pares, no que ela e Tommy Lee Jones comparam o texto com Los Angeles, uma cidade erguida em cima da falha de San Andreas, que no filme, acabara de ganhar um vulcão novinho.

Há vários casos de engenharia e arquitetura que não levaram em consideração a situação do solo e arredores a longo prazo, e a Cidade do México é um dos mais clássicos, uma metrópole construída sobre um lago drenado, que está afundado desde o fim do século XIX.

Exemplo de estrutura deformada na Cidade do México (Crédito: Josh Harner/The New York Times)

Exemplo de estrutura deformada na Cidade do México (Crédito: Josh Harner/The New York Times)

Qualquer um que assistiu Você Já Foi à Bahia? conhece mais ou menos a lenda por trás da história da Cidade do México, que remonta até Tenochtitlan, a capital do Império Asteca, construída originalmente em uma ilha no antigo lago Texcoco. O que a Disney contradiz no filme, é que o plano de construção da atual cidade não veio dos nativos.

Depois que os astecas foram massacrados pelas tropas de Hernán Cortés, os espanhóis deram início aos trabalhos de ocupação da região do lago, o que incluía sumir com o antigo templo asteca (a catedral arquidiocesana foi construída em seu lugar, como era de praxe) e drenar toda a água, para viabilizar o assentamento dos conquistadores e mais colonos vindo da Espanha.

Hoje, o lago Texcoco só existe nos livros de história. O impacto ecológico de drenar um lago com uma área de 5,4 km2 e uma profundidade máxima de 150 metros foi gigantesco, causando desde a extinção de espécies endêmicas à mudança do clima, com lagos adjacentes hoje se convertendo em salares. A cidade em si sofre com problemas corriqueiros de falta d'água a séculos.

O outro grande problema que a Cidade do México enfrenta, detectado pela primeira vez e documentado no fim do século XIX, é o da subsidência do solo. Basicamente, o solo superior começa a ceder por decorrência de alterações na composição das camadas inferiores, que dão suporte às imediatamente acima. É um processo diferente da erosão, e pode ocorrer naturalmente, como por exemplo, com a dissolução gradual da litosfera, ou efeitos sazonais dada a composição do solo.

No entanto, a causa mais comum para a ocorrência da subsidência é a intervenção humana. Mineração do solo, extração de gás natural ou de aquíferos, ou no caso da Cidade do México, a drenagem do solo. Como a argila perde massa conforme seca, o solo se compacta com o passar do tempo, e a camada superior vai afundando em consequência.

Some-se a isso o fato de terem construído uma metrópole no local, que abriga 9,2 milhões de habitantes (dados de 2019) sem contar a região metropolitana, e você tem uma ideia do tamanho do problema. Para piorar, a distribuição da camada de argila na região é irregular, e por causa disso, o solo da cidade é completamente desnivelado, com áreas muito próximas apresentando desníveis agressivos, como na imagem de abertura do post.

Asfalto rachado é uma constante por lá; neste caso, um lado da rua é mais alto que o outro (Crédito: Carrie Kahn/NPR)

Asfalto rachado é uma constante por lá; neste caso, um lado da rua é mais alto que o outro (Crédito: Carrie Kahn/NPR)

Os problemas não são relativos apenas à superfície. Metrô subterrâneo, sistemas de água e esgoto, túneis, tudo está sujeito à instabilidade do solo, e de acordo com um  estudo recente, publicado  pelos geólogos Dario Solano‐Rojas e Enrique Cabral-Cano, entre outros, a situação só vai piorar.

Segundo novos modelos publicados, tendo como base o extenso histórico de registros ao longo de mais de um século, o solo da Cidade do México está afundando de forma contínua, mas em ritmos  diferentes em diversas localidades. nas mais brandas, ele cede cerca de 51 cm por ano, já nas mais críticas, até 1,65 m/ano. Na região metropolitana como um todo, há pontos onde o solo está afundando ainda mais rápido, chegando a uma velocidade anual de até 100 polegadas, ou 2,54 m/ano.

No modelo de Solano-Rojas e Cabral-Cano, o solo sob a Cidade do México levará mais 150 anos para se compactar de forma definitiva,  mas como algumas regiões estão apoiadas em rocha sólida e outras em sedimentos do lago (de  novo, a parábola), o cenário é que a situação atual ficará muito, mas muito pior dentro dos próprios anos e décadas, com a cidade como um todo podendo evoluir para um ponto onde se tornaria inabitável.

Claro que este não é um caso isolado, como já  mencionamos, e há diversas outras regiões urbanas com problemas de subsidência, incluindo o Vale de San Joaquin, que também está afundando pouco a pouco. Neste caso, a extração exagerada de água de aquíferos subterrâneos foi a principal causa.

Note a diferença na altura do solo entre 1925 e 1977 (Crédito: United States Geological Survey)

Note a diferença na altura do solo entre 1925 e 1977 (Crédito: United States Geological Survey)

Impedir o processo de compactação do solo está fora de questão, e o máximo que o governo local poderá fazer é remediar a situação, com obras de infraestrutura apenas para aplicar remendos, considerando que boa parte da população da Cidade do México pertence às classes sociais mais baixas, e não têm planos de seguro residencial.

No mais, este é um problema que a administração atual e posteriores devem ao menos reconhecer para responderem como se deve, se não para deter o afundamento da cidade, o que já foi completamente descartado como uma possibilidade, ao menos para diminuir os impactos do problema na população mais vulnerável.

Fonte: WIRED

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