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Ken Levine: o pesado fardo de uma mente brilhante

Relatos dão conta de que o novo jogo da Ghost Story, estúdio fundado por Ken Levine em 2014, está passando por sérios problemas — e a culpa seria dele

2 anos atrás

Ken Levine é um gênio e como tal, conviver com tudo o que está se passando na sua cabeça não é uma tarefa das mais simples. Isso fica claro ao sabermos detalhes dos processos de desenvolvimento de seus jogos, pois ao mesmo tempo em que a sua criatividade nos deu obras de arte como System Shock 2, Freedom Force, Tribes: Vengeance ou BioShock, quem teve a oportunidade de trabalhar com ele diz que o dia a dia é mentalmente muito desgastante.

Ken Levine

Crédito: Reprodução/Giant Bomb

As primeiras críticas públicas ao método de trabalho de Ken Levine surgiram quando o jornalista Jason Schreier publicou seu segundo livro, o Press Reset: Ruin and Recovery in the Video Game Industry. Nele diversos profissionais falaram sobre o inferno que foi trabalhar na criação do BioShock Infinite, principalmente por causa da dificuldade que o game designer tinha para expressar suas ideias e pelas constantes mudanças no desenvolvimento.

No entanto, aquela foi uma superprodução, um título de grande porte e como em 2014 Levine deixou a Irrational Games para se dedicar a um projeto menor no seu novo estúdio, a Ghost Story, havia a esperança de que a lição havia sido aprendida. Na época ele chegou a afirmar querer fazer parte de “uma equipe menor com uma estrutura mais plana e com uma relação mais direta com os jogadores... uma pequena equipe criando jogos para o público central dos games.

O problema é que, caso você não tenha prestado atenção na data, lá se vão mais de sete anos desde aquele anúncio e até agora pouco sabemos sobre o tal projeto que Ken Levine pretendia desenvolver. Mesmo para um jogo de maior porte este seria tempo suficiente para um lançamento, mas agora começam a surgir informações de que o título não só não está pronto, como se encontra numa situação bastante complicada. O motivo? Novamente a dificuldade do seu criador colocar na tela aquilo que tem na cabeça.

Dessa vez os relatos foram dados ao próprio Jason Schreier, mas publicados em um artigo no Bloomberg. Ele ouviu 15 ex e atuais funcionários ligados ao novo jogo e no geral as declarações foram parecidas, colocando parte da culpa pela demora na liderança de Ken Levine.

As ideias e as ambições eram ótimas,” afirmou Giovanni Pasteris, um dos primeiros a se juntarem ao projeto. “Mas o escopo simplesmente cresceu sem a preocupação com a capacidade da equipe em concluí-lo até o prazo do outono de 2017. O Ken queria um jogo AAA com uma equipe ‘barata’. Isso nunca irá acontecer.

Pasteris ainda falou sobre o comportamento controverso de Ken Levine, alguém que ele disse ser capaz de se mostrar bastante “charmoso e carismático” na hora de contratar um novo profissional, mas não ter o menor receio de jogar a pessoa aos leões, atacando-a duramente na frente de seus colegas de trabalho.

Outro que seguiu pela mesma direção foi Mike Snight, artista que estava encarregado de criar o mundo para o novo jogo e que trabalhou com Levine na Irrational Games. Atualmente atuando como um desenvolvedor independente, ele disse:

O Ken é uma pessoa muito difícil de trabalhar. Acho que ele tentou bastante mudar e realmente se saiu melhor nesta companhia do que na Irrational, porque é um grupo menor de pessoas.

Porém, justamente quando os envolvidos com o projeto estavam achando que tinham feito progresso e que o título estaria a uns dois anos de ser lançado, Levine novamente ordenou que quase tudo fosse descartado e o desenvolvimento recomeçasse. Aquilo resultou no pedido de demissão de metade da equipe e para Snight, “quando [isso] acontece continuamente em ciclos e você não se alinha mais, você meio que se cansa de fazer parte daquilo.

Descrito por muitos como um perfeccionista, Ken Levine sempre desejou ser um roteirista e quando começou a estudar o assunto, alguém lhe ensinou que para conseguir a melhor história possível, o autor deveria reescrevê-la inúmeras vezes. Aquilo parece ter ficado gravado em sua mente, já que o sujeito nunca está satisfeito com nada o que cria.

Ken Levine durante a Game Developers Conference 2014 (Crédito: Wikimedia Commons/GDC)

Agora some a isso o ambicioso conceito inicial do game designer, que falava sobre a criação de um jogo de tiro no estilo do BioShock e ambientado em uma estação espacial, onde três facções lutariam pelo poder. A grande sacada é que o enredo se adaptaria às escolhas do jogador, no que vinha sendo descrito como uma “narrativa LEGO”. Com os personagens reagindo diferentemente de acordo com as nossas ações, múltiplas histórias poderiam ser contadas.

Mas além desta ferrenha busca pela perfeição, os funcionários da Ghost Story ainda precisam lidar com algo que beira o absurdo: as mudanças nos gostos do seu comandante. Segundo Schreier, é relativamente comum Ken Levine descartar semanas ou até meses de trabalho simplesmente porque o game designer gostou de elementos de jogos como Dead Cells ou Void Bastards e passou a acreditar que algumas de suas mecânicas deveriam ser aproveitadas na sua atual criação.

Qualquer pessoa que já tenha trabalhado com processos que envolvem a criatividade sabe o quão frustrante é ver algo a que se dedicou por tanto tempo ser descartado por pelo ego inflado de um patrão ou cliente. Eu não duvido que alguém como Levine haja com boa intenção ao fazer isso, que esteja realmente dedicado a entregar o melhor jogo possível, mas quando estes descartes acontecem a todo momento, é impossível os funcionários não se incomodarem.

Ainda assim, mesmo com tantos supostos problemas, a Take-Two Interactive continua apoiando o desenvolvimento do jogo — cujo título nem foi revelado, vale dizer. Não sabemos até quando essa permissividade continuará, mas com relatos de que o jogo ainda está longe de ser terminado e considerando que outras mudanças de direção no desenvolvimento poderão acontecer, acredito que os executivos da editora ainda precisarão ter bastante paciência com a genialidade de Ken Levine.

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