Por que eBooks custam o mesmo (ou quase) que livros convencionais?

Bia Kunze
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• Atualizado há 1 semana

Essa é a reclamação mais comum entre os usuários ou interessados em livros eletrônicos: o preço. Faz sentido um livro eletrônico custar, para o usuário final, o mesmo preço (ou quase) de um livro de papel?

Devido aos emails e comentários queixosos que venho recebendo, decidi correr atrás de respostas. Não só pesquisando na internet — onde tenho encontrado informações equivocadas. Estou em contato com algumas lojas brasileiras que vendem livros digitais — ou que em breve, passarão a vendê-los. E também analisando a política de algumas editoras.

Quanto custa produzir um livro digital?

O que posso dizer até agora é que a coisa não é tão simples como parece. Envolve leis, direitos autorais, contratos, tributações, licenças e uma série de intermediários para que um livro digital chegue até o seu computador. Não é só pegar o conteúdo autoral e colocá-lo à venda na internet. O processo todo passa por pelo menos 7 intermediários!

Uma coisa que não existe no livro de papel é o famigerado DRM. Ou digital rights management, uma tecnologia que impede a cópia desautorizada do produto autoral, a fim de evitar a pirataria. As tradicionais grandes editoras são unânimes na exigência desse tipo de proteção caso se deseje tornar uma obra disponível digitalmente à venda. Porém, a responsabilidade pela aplicação dessa “proteção” é da loja. Ainda que se usem formatos abertos, como o ePub, uma licença para uma solução de aplicação de DRM, como a da Adobe, sai pela bagatela de R$ 80 mil. E o pior de tudo, como estamos carecas de saber: o resultado limita a maneira como o usuário final lida com o produto adquirido, trazendo muitas vezes uma experiência frustada de leitura. E inibindo as vendas.

Para uma editora, o fato de não haver custo com papel ou distribuição não vem ao caso. O trabalho de editoração existe, os gastos com marketing e divulgação permanecem e, o mais importante de tudo: os contratos com os autores, salvo se houver cláusulas específicas à parte, permitem o mesmo tratamento de uma obra independente do seu formato. Para audiobooks, por exemplo, há cláusulas à parte. Aliás, os autores são os que recebem a menor fatia do bolo na venda de um exemplar de sua obra.

E as editoras querem manter sua filosofia e seu lucro. O exemplo da indústria audiovisual, infelizmente, ainda não os atingiu. Por enquanto.

Acaba sobrando para as lojas. O modelo de negócios da Amazon é de um risco imenso para a grande varejista eletrônica. Muitas vezes, o preço menor aplicado a determinado título, como promoção ou incentivo frente às concorrentes, é bancado pela própria loja, que acaba trabalhando no prejuízo. Embora não haja gastos com logística, há o custo com servidores, que permitem o sincronismo e armazenamento de informações de conta de cada usuário. E com a rede whispernet — a internet que o usuário final usa de graça para baixar seus livros, sincronizar dados e navegar na loja online ou na web por meio do browser embutido. São gastos altos e, por enquanto, as contas estão fechando no vermelho, na esperança de que um dia o modelo se acerte.

O mercado inteiro ainda está tateando no escuro. As novas tecnologias surgem de uma maneira espantosamente rápida, de modo que as leis e a mentalidade dos publishers não conseguem acompanhar.

Quando se fala em Brasil, então, a coisa complica muito mais. Nossa carga tributária é elevada. A quantidade de impostos acumulados pela qual passa um livro (seja qual for o formato), em todas as etapas, até chegar às nossas mãos, é espantosa.

Sobre os leitores de eBooks, os eReaders, que são importados, não há esperança na isenção de impostos a fim de equipará-los a livros convencionais que igualmente vem de fora. Até que mudem de idéia, ou surja alguma jurisprudência, os eReaders são produtos eletrônicos e não meros visualizadores de livros. Afinal, eles também tocam áudio e tem navegador.

E, por fim, uma intrigante pergunta: o que é um livro eletrônico?

O mesmo debate se sucedeu quando MP3 passou a ser sinônimo de música digital. O que é música digital? Ainda há segmentos discutindo se é produto, serviço, ou “arquivo de computador”. Porque basta uma denominação diferente para tudo ficar de ponta-cabeça em termos de legislação.

Com os eBooks é ainda mais complicado defini-los. Um “livro” como Alice, no iPad, pode ser considerado “livro”? Ou é software? Ou é multimídia? Em que categoria encaixá-lo? A lei ainda não é precisa o suficiente para classificá-lo.

E para ser sincera, nem eu mesma consigo. Eu compreendo “livro” como um meio que provoca a análise crítica e a imaginação do leitor sobre determinado conteúdo. Mas Alice parece estar mais para um produto audiovisual.

E agora, José?

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Bia Kunze

Bia Kunze

Ex-colunista

Bia Kunze é consultora e palestrante em tecnologia móvel e novas mídias. Foi colunista no Tecnoblog entre 2009 e 2013, escrevendo sobre temas relacionados a sua área de conhecimento como smartphones e internet. Ela também criou o blog Garota Sem Fio e o podcast PodSemFio. O programa foi um dos vencedores do concurso The Best Of The Blogs, da empresa alemã Deutsche Welle, em 2006.

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