Ação judicial para banir loot boxes no Brasil tem apoio do Ministério Público

Em parecer, o Ministério Público concorda que loot boxes são parecidas com jogos de azar e precisam ser proibidas

Murilo Tunholi
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• Atualizado há 2 anos e 4 meses
Loot box com itens lendários de Overwatch (Imagem: Divulgação/Blizzard)
Loot box com itens lendários de Overwatch (Imagem: Divulgação/Blizzard)

A Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED) abriu sete ações judiciais contra empresas do mercado de videogames. Os processos pedem a proibição da venda de loot boxes — caixas de itens em jogos que, quando abertas, garantem prêmios aleatórios. Em março, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) publicou um parecer em resposta à petição que citava a Garena, responsável pelo Free Fire, no qual apoiava os pedidos da ANCED.

Ministério Público concordou com a ação contra a Garena
De acordo com o The Enemy, que teve acesso ao processo contra a Garena, a ANCED pediu a suspensão de vendas de loot boxes pela empresa, sob multa de R$ 4 milhões por dia. A associação ainda solicitou R$ 1,5 bilhão em indenização por danos morais e mais R$ 1 mil para cada criança ou adolescente registrado nos jogos da desenvolvedora.

A ANCED abriu a ação civil pública no Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) em fevereiro deste ano. Em seu site oficial, a associação defende que a prática das loot boxes é uma espécie de jogo de azar que pode levar pessoas ao vício ou até ao desenvolvimento de problemas de saúde, principalmente crianças e adolescentes.

Em 29 de março, o processo contra a Garena chegou à promotora de justiça Luisa de Marillac Xavier dos Passos, do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). No parecer, a promotora concordou com os argumentos da ANCED e afirmou que a ação era “uma oportunidade para inaugurar medidas que possam ampliar a proteção de crianças, adolescentes e famílias”.

Ainda de acordo com Luisa, a única solução para o problema é remover as loot boxes por completo. Além disso, ela fala que as empresas são responsáveis pelos usuários quando permitem o acesso de menores de idade aos games que usam sistemas de itens aleatórios. Free Fire, por exemplo, é indicado para maiores de 12 anos na App Store e maiores de 17 anos na Google Play.

Quanto ao aspecto de terem embutido mecanismo de jogo de azar, como não há nenhum alerta nesse sentido, não há como se exigir dos pais ou responsáveis a restrição de acesso das crianças e adolescentes sob sua guarda ou supervisão a esses produtos. Nesse sentido, o provimento jurisdicional pretendido de suspensão das vendas desses produtos (sem distinção se destinados ou não ao público infantojuvenil) é a única forma eficaz de atingir a proteção de crianças e adolescentes.

Luisa de Marillac Xavier dos Passos, em parecer do MPDFT.

Sobre a indenização pedida pela ANCED, contudo, a promotora afirmou que o valor fugia da realidade e pediu revisão da quantia. É importante dizer que o processo ainda não foi julgado pelo TJDF. Sem uma decisão judicial, a Garena ainda não pode entrar com recurso.

Loot boxes dos jogos da franquia FIFA (Imagem: Divulgação/Electronic Arts)

Loot boxes dos jogos da franquia FIFA (Imagem: Divulgação/Electronic Arts)


ANCED ainda tem processos contra mais 10 empresas
Além da Garena, a ANCED abriu outras seis ações para banir loot boxes do Brasil contra mais 10 empresas: Activision Blizzard, Electronic Arts, Nintendo, Riot Games, Ubisoft, Apple, Google, Microsoft, Konami, Valve e Tencent. Todos os processos pedem as mesmas indenizações de R$ 1,5 bilhão e mais R$ 4 milhões por dia.

Por mais que só a ação contra a Garena tenha chegado ao Ministério Público, a promotora Luisa Passos, do MPDFT, disse, no parecer publicado em março, que o apoio valia para todos os outros processos abertos pela associação.

No caso da Electronic Arts e Nintendo, a associação processou a Ingram Micro Brasil, que representa as empresas no Brasil. Na petição inicial, a ANCED citou os jogos da franquia FIFA como exemplo e destacou que o game usa o sistema de loot boxes, mas tem classificação etária livre, permitindo que menores de idade comprem as caixas.

“Isso faz com que crianças queiram comprar o item, o qual só pode ser adquirido via loot box, sempre itens aleatórios, fazendo-as gastar mais e mais dinheiro, inseridas em um sistema de caça-níqueis”, explicou a ANCED.

Em FIFA, os usuários podem comprar “FIFA Points” com dinheiro real, e usar a moeda para adquirir as loot boxes. As caixas garantem jogadores com diferentes níveis de habilidade e, em alguns casos, são a única forma de conseguir os melhores atletas.

[…] crianças e adolescentes são condicionados ao pagamento de jogos de azar para que otimizem suas condições de jogo por meio de um processo aleatório semelhante aos tipos e categorias de jogos proibido em lei, evidenciando-se o claro desrespeito e dano causado à saúde psíquica do jogador.

Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente, em petição.

O possível futuro dos jogos que têm loot boxes
Para visualizar um possível cenário no qual as loot boxes são banidas, é possível usar como referência outros países que já removeram as caixas, como a Bélgica. No país, a prática é considerada crime desde 2018 e pode resultar em multas e prisão, dependendo da gravidade do problema.

A solução em curto prazo das empresas foi desativar a venda das caixas por dinheiro real. As loot boxes, porém, ainda podem ser adquiridas de graça durante os jogos, como recompensas no final de partidas ou ao subir de nível. Caso o processo da ANCED seja aceito pelos juízes do TJDF, é possível que essa situação se repita no Brasil.

Com informações: The Enemy, ANCED, ANCED.

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Murilo Tunholi

Murilo Tunholi

Ex-autor

Jornalista, atua como repórter de videogames e tecnologia desde 2018. Tem experiência em analisar jogos e hardware, assim como em cobrir eventos e torneios de esports. Passou pela Editora Globo (TechTudo), Mosaico (Buscapé/Zoom) e no Tecnoblog, foi autor entre 2021 e 2022. É apaixonado por gastronomia, informática, música e Pokémon. Já cursou Química, mas pendurou o jaleco para realizar o sonho de trabalhar com games.

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