Quem é Marcos Pontes, ministro da Ciência e Tecnologia de Bolsonaro

Primeiro astronauta brasileiro, Marcos Pontes aceitou o convite de Jair Bolsonaro para comandar o Ministério da Ciência e Tecnologia a partir de 2019

Emerson Alecrim
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• Atualizado há 11 meses
Marcos Pontes

Na quarta-feira, 31 de outubro, o presidente eleito Jair Bolsonaro usou o Twitter para anunciar um dos primeiros ministros do seu governo: Marcos Pontes, amplamente conhecido como o primeiro astronauta brasileiro, vai comandar o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

Nas redes sociais, as reações à escolha são predominantemente positivas, inclusive entre eleitores que não votaram em Bolsonaro. Por outro lado, é fácil encontrar manifestações de desconfiança ou completo ceticismo sobre a capacidade de Pontes de lidar com uma pasta tão importante.

Um dos aspectos que preocupa é a falta de experiência do futuro ministro na administração pública. Outra é se o perfil “pop star” de Pontes é compatível com um cargo que, por conta da atual fase da economia brasileira, vai enfrentar desafios bastantes complexos.

Mas, quem é Marcos Pontes, de fato, e por que a sua escolha como Ministro da Ciência e Tecnologia causa tantas expectativas, positivas e negativas?

Quem é Marcos Pontes?

Apesar de ser conhecido quase que exclusivamente por sua atuação como astronauta, Marcos Cesar Pontes tem um extenso currículo. Nascido em Bauru (SP), ele ingressou na Força Aérea Brasileira (FAB) em 1981, aos 18 anos de idade. Ali, o então jovem militar atuou na esquadrilha de caça, foi piloto de testes e acumulou mais de 2 mil horas de voos em 25 tipos de aeronaves — como a F-15 Eagle e a MIG-29 Fulcrum — e, finalmente, se tornou tenente-coronel.

Um avião F-15 Eagle

Sua carreira deu um salto importante em 1989, quando Pontes iniciou o curso de engenharia aeronáutica no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), vindo a se formar em 1993. Em 1998, ele conquistou o título de mestre em engenharia de sistemas pela Naval Postgraduate School, em Monterrey, Estados Unidos.

Por fazer parte dos esforços multinacionais para construção da Estação Espacial Internacional (ISS), o Brasil obteve o direito de enviar um representante para o programa espacial da NASA. A já extensa formação de Marcos Pontes permitiu que, ainda em 1998, ele fosse selecionado em um concurso público da Agência Espacial Brasileira para ocupar o posto.

O primeiro astronauta brasileiro

Ao ser selecionado para representar o Brasil na NASA, Pontes teve que encerrar a sua atuação como militar. Ele passou então a receber diversos treinamentos no Centro Espacial Lyndon Johnson, em Houston, para exercer a função de astronauta.

Marcos Pontes completou seu treinamento no fim do ano 2000. A previsão era a de que ele realizasse a sua missão espacial no ano seguinte, mas restrições orçamentárias fizeram a NASA adiar o plano para 2003. Porém, nesse mesmo ano, o ônibus espacial Columbia explodiu durante um processo de reentrada na atmosfera terrestre. Por conta disso, a NASA suspendeu a realização de novas missões espaciais por tempo indeterminado.

Centro Espacial Lyndon Johnson

Como consequência, parecia não haver mais chances de Marcos Pontes marcar o seu nome como o primeiro astronauta brasileiro a participar de uma missão espacial. No entanto, em 2005, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou um contrato com o presidente russo Vladimir Putin que abriu caminho para Pontes.

Por conta da suspensão dos voos da NASA, apenas a Rússia podia chegar à Estação Espacial Internacional àquela época. A missão da qual Pontes participaria seria realizada no ano seguinte. Não havia tempo a perder. O brasileiro foi submetido a uma preparação que durou cinco meses e, em paralelo, teve que aprender russo.

Em 30 de março de 2006, a nave russa Soyuz TMA-8 partiu da base de Baikonur, no Cazaquistão, levando Marcos Pontes, o russo Pavel Vinogradov e o americano Jeffrey Williams como tripulação. Em 1º de abril, a nave se acoplou à Estação Espacial Internacional.

Batizada pelo Brasil de Centenário em homenagem aos cem anos do voo de Santos Dumont no 14 Bis, a missão de Pontes durou dez dias. Durante esse período, o astronauta realizou procedimentos de manutenção e configuração de sistemas, além de ter executado experimentos científicos para o Brasil.

As polêmicas começam aqui.

Plantador de feijão?!

O cumprimento da missão foi festejado e imediatamente transformou Marcos Pontes em celebridade. Mas não demorou para o astronauta se deparar com alguns “efeitos colaterais” — e não me refiro aqui às alterações fisiológicas que Pontes teve que lidar por consequência da viagem espacial.

Começou pelas críticas aos custos da missão. O governo brasileiro gastou pelo menos US$ 10 milhões para que o astronauta pudesse embarcar na Soyuz. Para os críticos, foi um desperdício de dinheiro porque a missão não teria tido grande relevância científica.

Em seu site, Marcos Pontes explicou que, na verdade, o custo da missão ao Brasil esteve muito abaixo dos valores praticados pela Rússia na época.

Mas a crítica mais estapafúrdia veio em tom de deboche: fala-se que Pontes teve um imenso trabalho para ir ao espaço para simplesmente plantar feijão. O astronauta classificou essa afirmação como uma “asneira” promovida por “profissionais da ciência revoltados com a própria incompetência” e por pessoas que “não têm competência para fazer algo de útil na vida”.

Os astronautas Marcos Pontes, Pavel Vinogradov e Jeffrey Williams
Os astronautas Marcos Pontes, Pavel Vinogradov e Jeffrey Williams

A Missão Centenário contou com um acordo entre a Agência Espacial Brasileira e a Academia Brasileira de Ciências que estabeleceu a execução de dez experimentos durante a viagem espacial: quatro tecnológicos, quatro científicos e dois educacionais.

Dois dos experimentos tecnológicos não puderam ser conduzidos por falta de um equipamento específico na ISS, mas todos os oito projetos restantes foram executados.

O experimento dos feijões fez parte dos projetos educacionais. Ele teve como principal objetivo estimular o interesse das crianças pela ciência, razão pela qual a experiência visava comparar o crescimento do pé de feijão no espaço com experimentos similares conduzidos em escolas baseadas em São José dos Campos (SP).

Para Pontes, o tom jocoso com o qual o experimento é tratado até hoje visa diminuir a importância da missão e, ao mesmo tempo, menosprezar o incentivo das crianças à ciência, bem como desprezar os projetos científicos e tecnológicos realizados na missão — as duas categorias receberam pouca atenção da imprensa.

De astronauta a palestrante motivacional

É Possível: Como Transformar Seus Sonhos em Realidade

Reza a lenda que, entre integrantes da FAB, Marcos Pontes não é bem visto até hoje por, supostamente, ter usado a sua carreira como astronauta em benefício próprio. Isso porque, após regressar da Missão Centenário, ele teria largado a carreira de militar para fazer dinheiro com eventos, palestras, empreendimentos e afins.

Novamente, Marcos Pontes usou o seu site para esclarecer essa polêmica. Ele explica que não se aposentou, mas que foi transferido para a Reserva Militar por determinação do então comandante da Aeronáutica, o brigadeiro Luiz Carlos Bueno, que, por sua vez, afirma ter tomado a decisão em prol dos interesses da FAB.

Pontes declarou ainda que, se dependesse da sua vontade, não iria para a Reserva Militar. Mas, com a decisão tomada, ele decidiu participar ativamente de palestras e eventos, tendo inclusive comparecido à Campus Party de 2008 — ele também esteve na Campus Party Natal, realizada em abril de 2018.

Além de palestras, Marcos Pontes vem se dedicando desde então a treinamentos corporativos, trabalhos de consultoria, cursos e outras atividades, a maioria relacionada à motivação pessoal, apesar de ele também ter feito divulgação científica.

Até autoajuda o futuro ministro publicou: trata-se do livro É Possível: Como Transformar Seus Sonhos em Realidade, lançado em 2010. Esse tipo de publicação tem forte apelo popular e, frequentemente, é visto com desdém pelos mais intelectualizados. Certamente, parte das críticas que Marcos Pontes recebe vem daí.

Marcos Pontes como político

De acordo com o Estadão, após completar a Missão Centenário, Marcos Pontes teria sido aconselhado pelo já falecido astronauta e ex-senador americano John Gleen a ingressar na carreira política. Mas o conselho só foi seguido em 2014, quando Pontes tentou se eleger deputado federal por São Paulo com o PSB. Não conseguiu: os quase 44 mil votos que ele obteve não foram suficientes.

Em 2018, Pontes voltou a tentar carreira política, agora filiado ao PSL, partido de Jair Bolsonaro. Ele chegou a ser cogitado para o cargo de vice do presidente eleito. Mas, pelo menos desde março, o PSL já falava em colocá-lo à frente do MCTIC.

O convite de Jair Bolsonaro foi aceito de bom grado. O extenso currículo faz o nome de Marcos Pontes ser condizente com o cargo, mas levanta incertezas por conta da sua falta de experiência política.

Jair Bolsonaro e Marcos Pontes

Mas isso parece não ser problema, por vários motivos: Pontes dedicou parte da sua carreira à divulgação científica (portanto, conhece pelo menos parte das necessidades do setor), aparenta ter uma rede de contatos significativa e possui formação em administração pública.

Em declarações à imprensa e nas redes sociais, Marcos Pontes já fala que, como ministro, irá incentivar a produção científica e adotar medidas para evitar a “fuga” de cientistas brasileiros para o exterior.

Não é novidade que, para isso, Pontes vai ter que lidar com a enorme restrição orçamentária que os programas de ciência e tecnologia enfrentam no Brasil. No entanto, uma das promessas de Bolsonaro é aumentar os investimentos em pesquisa e desenvolvimento, saindo dos atuais 1% (porcentagem aproximada) para algo em torno de 3% do PIB, o que deve fazer os recursos do MCTIC aumentar para um valor entre R$ 10 bilhões e R$ 15 bilhões.

Vai dar certo? Não dá para prever, mas é inegável que o histórico de Marcos Pontes pesa mais a favor do que contra em sua nova jornada.

Com informações: Folha, Estadão, Academia Brasileira de Ciências, Gazeta do Povo, Space, FAB.

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Emerson Alecrim

Emerson Alecrim

Repórter

Emerson Alecrim cobre tecnologia desde 2001 e entrou para o Tecnoblog em 2013, se especializando na cobertura de temas como hardware, sistemas operacionais e negócios. Formado em ciência da computação, seguiu carreira em comunicação, sempre mantendo a tecnologia como base. Em 2022, foi reconhecido no Prêmio ESET de Segurança em Informação. Em 2023, foi reconhecido no Prêmio Especialistas, em eletroeletrônicos. Participa do Tecnocast, já passou pelo TechTudo e mantém o site Infowester.

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