Como alunos e faculdades se adaptaram ao ensino a distância
Estudantes de universidades relatam suas experiências depois de um ano assistindo a aulas a distância devido à pandemia
Estudantes de universidades relatam suas experiências depois de um ano assistindo a aulas a distância devido à pandemia
Em março de 2021, completamos um ano em casa, o que impôs novos desafios à sociedade como um todo. É, também, o caso das instituições de ensino superior que encararam o mesmo dilema do ano passado para cá: como manter as atividades acadêmicas durante a pandemia? A solução, é claro, estava nas aulas remotas, com auxílio da internet. Mesmo assim, este não foi um trabalho simples de ser realizado.
Para muitos universitários, a transição da “sala de aula física” para a “sala de aula virtual” teve início ainda no primeiro mês de pandemia, em março de 2020. Caroline Belo, que concluiu a graduação em jornalismo na Universidade Veiga de Almeida no fim do ano passado, conta que, inicialmente, a instituição deu quinze dias para os alunos ficarem em casa. Mas, após perceberem que o retorno demoraria mais, as aulas online começaram.
Nesta universidade do Rio de Janeiro, as aulas foram realizadas com auxílio de uma plataforma para EaD (educação a distância) que já fazia parte da realidade da instituição. A jornalista conta que os professores também utilizaram outros recursos, como a ferramenta de videoconferência do Microsoft Teams e o Google Drive.
Ainda assim, nem todos começaram no mesmo momento. Inês Lopa, que estuda direito na Unirio (Universidade Federal do Rio de Janeiro), conta que suas aulas só tiveram início em outubro de 2020. Nesta instituição, as atividades foram realizadas através das plataformas Google Classroom e Google Meet.
Também é importante lembrar que esta não é uma realidade de todos. Conforme aponta um relatório da UNICEF apresentado em agosto, 463 milhões de crianças em todo mundo não conseguiram acessar o ensino a distância durante o fechamento das escolas. Além disso, segundo a TIC Domicílios 2019, 28% dos lares brasileiros não possuem acesso à internet, especialmente nas zonas rurais.
Em comum, as duas estudantes não relataram problemas durante a transição. “A princípio foi bem tranquilo fazer essa transição da sala de aula física para a sala de aula online”, afirmou Inês Lopa. “Logo de cara, eu estava até gostando por causa da facilidade de não ter que me deslocar”.
A mesma percepção é vista por Caroline Belo, que mora a duas horas de sua universidade. “Eu pegava trem todos os dias e acordava às 4h da manhã”, explica. “O tempo que eu usava para chegar até a Veiga se transformou em tempo de estudo”. A jornalista ainda diz que a maior disponibilidade de tempo lhe ajudou a preparar o seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).
Ela também diz que suas notas melhoraram depois que começou a estudar em casa. “Mas é só por conta mesmo de não ter que pegar trem, não ter que ficar tanto tempo no transporte público. Porque, antes, eu estudava menos justamente pelo cansaço”, diz.
Ainda assim, Caroline Belo também destaca a falta de contato com os amigos durante esse período de transição. “A experiência virtual foi muito focada na individualidade, porque a gente não está se vendo”, diz. “Quando a gente entra nas plataformas, parece que estamos falando com fotos, com pessoas que a gente nem sabe se estão realmente no computador prestando a atenção”.
Mas nem tudo são flores. Mesmo que não precise mais se deslocar de sua casa para a universidade, Inês observa que as aulas a distância foram se tornando cada vez mais cansativas com o decorrer do tempo. Ela também afirma que os professores passam mais tarefas nesta modalidade do que no presencial. “Nos últimos meses, tem sido um pouco complicado”, disse.
Outro ponto observado pela estudante está relacionado ao uso de equipamentos e à cadeira, itens que trouxeram um certo desconforto ao estudo no dia a dia.
“Eu uso o notebook para fazer as anotações das aulas e o computador para deixar com a câmera ligada. Mas, no computador, se eu quiser falar, eu preciso conectar o fone de ouvido. E o fone de ouvido me cansa um pouco”, conta. “Então, a maioria das minhas aulas são todas comigo, fazendo gestos, ou não falando, mesmo. Ou falando pelo chat”.
Após concluir a graduação em jornalismo no fim do ano passado, Caroline Belo ingressou em outro curso logo em seguida. No começo de 2021, a jornalista tornou-se aluna de Estudos de Mídia, com ênfase em Cinema, na PUC-Rio. Ao Tecnoblog, ela explica que sentiu um certo impacto ao mudar de uma instituição para outra.
“Na Veiga, eu já tinha alguns amigos e já estava finalizando a faculdade”, explica. “Só que, na PUC, por eu não conhecer ninguém, nenhum professor, não ter contato com o campus, com as pessoas de lá, começar assim, do zero, foi bem diferente”.
A disparidade entre os recursos usados pela nova universidade também pesou neste período de transição. Da plataforma da Universidade Veiga de Almeida, a qual já estava acostumada por ter acesso antes da pandemia, Caroline Belo passou a utilizar o Moodle, uma ferramenta aberta para aprendizagem online. Além disso, os professores recorrem sempre ao Zoom para fazer as videoconferências.
“Ano passado, 2020 todo, eu diria que não tive nenhuma dificuldade”, relata. “Agora, nesse ano, estou tendo muita dificuldade para lidar com a minha solidão, mesmo. E, por muito tempo, ficar sentada na frente do notebook. Cheguei num estado extremo de sentir dores, de ter que procurar médicos depois de um ano e pouco sentada”.
Do outro lado da sala de aula, as instituições de ensino também precisaram se preparar para manter suas atividades. Segundo a diretora regional da Kroton, Marcia Pereira Nobrega, a experiência da detentora da Anhanguera com ensino a distância (EaD) ajudou nesse processo, o que permitiu levar todos os alunos às plataformas virtuais em apenas uma semana.
“Os alunos que já estudam na modalidade de ensino a distância continuaram tendo acesso ao conteúdo por meio do Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e não tiveram suas rotinas de estudos impactadas”, explicou ao Tecnoblog. “Para os alunos dos cursos presenciais, montamos uma verdadeira operação de guerra para migrar as aulas para o ambiente de ensino remoto em 24 horas”.
Questionada sobre a percepção de alunos e professores em relação às aulas nesse período, a diretora afirma que a avaliação foi positiva. Nobrega também relata que os docentes receberam suporte e treinamento para que “pudessem preparar e ministrar as aulas de forma a garantir o engajamento dos estudantes na plataforma online”.
A Estácio iniciou suas aulas pela internet ainda na primeira semana do isolamento, de acordo com Adriano Pistore, vice-presidente de operações presenciais da universidade. O executivo explica que a instituição investiu na ampliação da capacidade dos servidores e em uma plataforma mais leve. Além disso, a experiência anterior com ambientes digitais também ajudou nesse processo, que também envolveu treinamento com professores para se adaptar à plataforma.
“Não existe impacto e distância quando nosso aluno interage com o professor em tempo real, tira dúvidas, participa ativamente da aula, troca informações com os colegas, enfim, assume seu protagonismo no processo de ensino aprendizagem”, conta.
Pistore também relata que os alunos não sofreram prejuízos em sua vida acadêmica ao estudar em casa. Em um exemplo, o executivo explica que muitos alunos que eram envergonhados se sentiram mais à vontade para perguntar via web. “Em 2020, uma pesquisa interna mostrou que mais de 90% dos alunos aprovaram o modelo, considerando a solução boa ou ótima”, afirma.
Mesmo em abril de 2021, as instituições de ensino permanecem com suas atividades a distância, enquanto a pandemia continua de pé. Mas o que podemos esperar para a educação no futuro, depois de toda essa experiência? Para o vice-presidente de operações presenciais da Estácio, a tecnologia não só continuará a marcar presença, como também vai ajudar bastante as novas gerações.
“A palavra agora é somar, no sentido de pensar como é possível entregar mais digital em uma atividade de campo e, para isso, a Estácio já vem revendo a infraestrutura de seus campi, o desenho de sala de aula, ampliando a sua de rede de Wi-Fi gratuito nas unidades, pontos que vão dar suporte para sustentar esse ambiente virtual para os nossos alunos”, diz Pistore.
O executivo contou ao Tecnoblog que a instituição está desenvolvendo novos aplicativos de aprendizagem, ferramentas de interação e novos ambientes digitais para aproximar os alunos ainda mais da experiência digital. Inclusive, os estudantes da modalidade presencial.
Maria Pereira Nobrega, da Kroton, afirma que a mantenedora aguarda as orientações dos órgãos responsáveis para retomar as aulas teóricas em todas as unidades da Anhanguera. Além disso, a diretora também demonstrou otimismo em relação ao futuro.
“O mundo sairá dessa experiência com uma quebra de paradigma em relação a educação”, diz. “Em um futuro próximo, no Brasil, a ideia de que é possível aprender com excelência mesmo fora de uma sala de aula convencional não será mais alvo de desconfiança, assim como já acontece em vários países”.