Máquina pode ter bom senso? Pesquisador explica desafios em IA

É possível ensinar bom senso para softwares? Um pesquisador explica por que isso é importante e quais são suas implicações no campo da inteligência artificial

Ana Marques
• Atualizado há 2 anos e 11 meses

Vivemos a era da inteligência artificial — e, para além das suas conversas engessadas com a Alexa na sala de estar, ainda há muito a se construir nesse campo. Uma das principais questões, de acordo com um pesquisador e professor assistente da Universidade do Sul da Califórnia, é fazer com que máquinas desenvolvam bom senso. “É extremamente desafiador”, diz Mayank Kejriwal.

Pense bem — o desenvolvimento de softwares é cheio de códigos e conjuntos de equações que resultam em respostas e estímulos. É possível programar uma máquina para responder sempre que você pergunta que horas são, ou quem fundou a Microsoft. São perguntas previsíveis, que podem ser rapidamente endereçadas aos bancos de dados que alimentam o programa em questão.

Com a evolução do aprendizado de máquina, equações mais complexas são colocadas à prova, nas situações mais específicas que você possa imaginar. Entretanto é exatamente aí que está o problema: não há especificidade para bom senso.

“A IA moderna é projetada para lidar com problemas altamente específicos, em contraste com o senso comum, que é vago e não pode ser definido por um conjunto de regras. Mesmo os modelos mais recentes cometem erros absurdos às vezes, sugerindo que algo fundamental está faltando no modelo de mundo da IA.”

Mayank Kejriwal

É possível calcular o bom senso?

O professor explica que o verdadeiro bom senso, tal como desenvolvido por humanos, é muito difícil de ser calculado. Trata-se de uma habilidade natural, que não é ensinada formalmente — e até para nós pode representar um desafio (vide o tanto de humanos sem o “bom senso padrão” que estão por aí).

Baseada em uma série de condições inerentes à nossa existência, essa habilidade está ligada à vida em sociedade, mas não somente ela — há aprendizados inconscientes de física e de conhecimentos abstratos, como o tempo e o espaço, que só são adquiridos… Vivendo.

Por tudo isso, Kejriwal explica que um dos desafios mais importantes da inteligência artificial é quebrar essa fronteira entre o aparente bom senso das máquinas e o bom senso humano. É claro, neste momento existem diversos cientistas e instituições se desdobrando para entender como passar tal habilidade a robôs. O pesquisador cita o programa Machine Common Sense, lançado pela Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa dos EUA, como exemplo.

“O programa Machine Common Sense financia muitos esforços de pesquisa atuais em bom senso de máquina, incluindo nosso próprio, Multi-modal Open World Grounded Learning and Inference (MOWGLI). O MOWGLI é uma colaboração entre nosso grupo de pesquisa da Universidade do Sul da Califórnia e pesquisadores de IA do Massachusetts Institute of Technology, da Universidade da Califórnia em Irvine, da Stanford e do Instituto Politécnico Rensselaer. O projeto visa construir um sistema de computador que possa responder a uma ampla gama de questões de senso comum.”

Mas se para alguns humanos o bom senso parece uma causa perdida, Kejriwal afirma que há boas perspectivas para as máquinas. Com a IA avançada de aprendizagem profunda batizada de “Transformers” (ou “Transformadores”, em português), é possível modelar a linguagem natural de forma altamente eficiente, o que permite responder a algumas questões simples sobre bom senso. Esse foi um dos grandes passos para permitir que robôs consigam se comunicar de forma mais humana.

A evolução dos transformadores levou a comunidade científica a questionar tópicos mais profundos e até mesmo filosóficos. Afinal, quem pode estabelecer o que é bom senso? E como saber se as máquinas estão realmente adquirindo a habilidade?

“Os pesquisadores dividem o senso comum em diferentes categorias, incluindo sociologia do senso comum, psicologia e conhecimento prévio. Os autores de um livro recente argumentam que os pesquisadores podem ir muito mais longe, dividindo essas categorias em 48 áreas de granulação fina, como planejamento, detecção de ameaças e emoções. No entanto, nem sempre está claro como essas áreas podem ser separadas de maneira limpa. Experimentos sugeriram que uma resposta clara à primeira pergunta pode ser problemática. Mesmo anotadores humanos especialistas — pessoas que analisam texto e categorizam seus componentes — dentro de nosso grupo discordaram sobre quais aspectos do bom senso se aplicavam a uma frase específica. Os anotadores concordaram em categorias relativamente concretas como tempo e espaço, mas discordaram em conceitos mais abstratos.”

Como conclusão, Kejriwal afirma que apesar de toda a evolução, tal área da inteligência artificial ainda é extremamente incerta e carece de muitos outros estudos. Para ele, o bom senso está ligado a tantas variantes e caminhos de aprendizado que é impraticável que uma máquina (ou o campo de IA, por assim dizer) chegue a um resultado confortável para este impasse sem caminhar por toda esta mesma estrada.

“Dependendo do sucesso das novas linhas de pesquisa [de aprendizado profundo, focadas em senso comum], não há como dizer como será o bom senso das máquinas em cinco anos, ou em 50”, completa o pesquisador.

Com informações: The Conversation

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Ana Marques

Ana Marques

Gerente de Conteúdo

Ana Marques é jornalista e cobre o universo de eletrônicos de consumo desde 2016. Já participou de eventos nacionais e internacionais da indústria de tecnologia a convite de empresas como Samsung, Motorola, LG e Xiaomi. Analisou celulares, tablets, fones de ouvido, notebooks e wearables, entre outros dispositivos. Ana entrou no Tecnoblog em 2020, como repórter, foi editora-assistente de Notícias e, em 2022, passou a integrar o time de estratégia do site, como Gerente de Conteúdo. Escreveu a coluna "Vida Digital" no site da revista Seleções (Reader's Digest). Trabalhou no TechTudo e no hub de conteúdo do Zoom/Buscapé.