Jony Ive teria saído da Apple porque Tim Cook não estava interessado em design

Diretor de design da Apple, Jony Ive deixou empresa após quase 30 anos para fundar seu próprio estúdio

Paulo Higa
• Atualizado há 2 anos e 11 meses
Tim Cook e Jony Ive (Foto: Paulo Higa)
Tim Cook (à esquerda) e Jony Ive

Muita gente foi pega de surpresa quando a Apple anunciou a saída de Jony Ive como diretor de design: depois de quase 30 anos trabalhando em produtos como iPhone, iMac e Apple Watch, ele deixou a companhia para abrir uma empresa independente de design, a LoveFrom. Mas uma reportagem do Wall Street Journal publicada no domingo (30) revela que, na verdade, Ive estava desanimado há anos.

Este é mais um capítulo na história da saída de Jony Ive. Na semana passada, a Bloomberg publicou que o designer britânico tinha um papel reduzido na Apple desde 2015, após o lançamento do Apple Watch: ele só aparecia na sede em Cupertino duas vezes por semana, e seu trabalho diário foi transferido para outros executivos assim que se tornou CDO (Chief Design Officer), um cargo que nunca existiu antes na Apple.

Agora, o WSJ afirma que Ive foi se frustrando à medida que o conselho de administração da Apple ganhou diretores com mais experiência em finanças e operações, em vez de tecnologia e outras áreas principais da empresa. O jornal também diz que Tim Cook raramente aparecia no estúdio de design da Apple e “mostrou pouco interesse no processo de desenvolvimento de produtos”, o que desanimou Ive.

Cook, vale lembrar, é engenheiro industrial e cresceu dentro da Apple ao aprimorar a cadeia de suprimentos da empresa: antes de ser nomeado CEO por Steve Jobs, em 2011, ele era diretor de operações (COO) da companhia e tinha como missão manter os gastos sob controle e aumentar as margens de lucro.

Uma das tentativas de Cook para manter Ive satisfeito foi oferecer “um salário que ultrapassava muito o de outros executivos do alto escalão da Apple”, segundo a reportagem, que não divulgou valores. Documentos mostram que, em 2018, considerando os bônus, Tim Cook (CEO) ganhou US$ 15,7 milhões (salário-base de US$ 3 milhões); enquanto Luca Maestri (CFO), Jeff Williams (COO) e Angela Ahrendts (vice-presidente de varejo) faturaram US$ 26,5 milhões cada (salário-base de US$ 1 milhão).

Conflitos no desenvolvimento do Apple Watch

Apple Watch

Primeira geração do Apple Watch; versão de ouro 18 quilates custava até R$ 135 mil

Além de revelar os bastidores da saída de Jony Ive, o WSJ mostrou o complicado processo de desenvolvimento do Apple Watch — o próprio Ive confessou publicamente na época que estava “profundamente, profundamente cansado” porque o ano anterior em preparação ao lançamento do Watch foi “o mais difícil” desde que ele entrou na empresa em 1992.

Ive se entusiasmou com o projeto de um relógio e enxergava o Apple Watch como um acessório de moda, enquanto outros executivos da Apple queriam vendê-lo como uma extensão do iPhone e questionavam se o produto teria algum “aplicativo matador”. Foi Ive quem influenciou na contratação do amigo e designer Marc Newson, e do ex-CEO da Yves Saint Laurent, Paul Deneve, para gerenciar o negócio.

Mas, embora a Apple seja líder isolada em smartwatches, as vendas de 10 milhões de unidades do Apple Watch no primeiro ano eram só um quarto do que a Apple esperava internamente. Além disso, milhares de versões de ouro 18 quilates (vendidas por até R$ 135.000) ficaram encalhadas no estoque.

Apesar de tudo, Ive não deverá se separar completamente da Apple por um bom tempo: a LoveFrom tem a empresa de Tim Cook como sua primeira cliente, e receberá “milhões de dólares por ano” para continuar desenvolvendo os projetos.

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Paulo Higa

Paulo Higa

Ex-editor executivo

Paulo Higa é jornalista com MBA em Gestão pela FGV e uma década de experiência na cobertura de tecnologia. No Tecnoblog, atuou como editor-executivo e head de operações entre 2012 e 2023. Viajou para mais de 10 países para acompanhar eventos da indústria e já publicou 400 reviews de celulares, TVs e computadores. Foi coapresentador do Tecnocast e usa a desculpa de ser maratonista para testar wearables que ainda nem chegaram ao Brasil.