No início da semana, a BBC liberou gratuitamente para 1 milhão de jovens britânicos o micro:bit, um pequeno computador recheado de sensores que auxilia as crianças na aprendizagem de programação. O programa é bem interessante, e é uma proposta curiosa para desenvolver o ensino dos jovens na área.

Por fora, o micro:bit parece um pouco com o Raspberry Pi, por ser um pequeno computador com milhares de utilidades. Mas, segundo a BBC, a ideia veio de muito antes: ele tem esse nome por causa do BBC Micro, um computador criado na década de 1980 (!) para incentivar crianças a entrar no mundo da computação. O micro:bit é um legado dessa máquina.

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A proposta da emissora pública britânica é inspirar os jovens de 7 anos a produzir trabalhos digitais criativos, desenvolvendo habilidades nas áreas de ciência, tecnologia e engenharia. Uma das motivações para esse projeto foi a decadência do setor tecnológico do Reino Unido, que precisa de mais profissionais capacitados.

Com a iniciativa, surge a pergunta: é uma boa ideia distribuir esse tipo de equipamento para as crianças? O que ele realmente contribui no aprendizado de um jovem? E, por último, mas não menos importante: o projeto da BBC pode inspirar esse milhão de crianças? Spoiler: sim.

Conhecendo o micro:bit

O que exatamente esse computador tem de especial para ser considerado uma grande oportunidade para mudar a forma com que crianças interajam com a tecnologia? Bom, ele é feito para ser fácil e divertido de usar, mirando aquele tipo de jovem que gosta de um brinquedo que desafia suas capacidades.

Sinead Rocks, chefe da BBC Learning, divisão de aprendizado da empresa, diz que é a iniciativa educativa mais ambiciosa da BBC em 30 anos. “O micro:bit é sobre os jovens aprenderem a se expressar digitalmente. Nós damos a crianças pincéis para elas pintarem, ainda que sem nenhuma experiência. Deveria ser o mesmo com a tecnologia”, diz.

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Medindo apenas 4×5 centímetros, o micro:bit é realmente um playground digital para as crianças, podendo desempenhar os mais variados tipos de atividade. Ele se conecta com tablets, computadores, Arduinos, Raspberry Pis e vários outros módulos e dispositivos.

Em uma comparação ambiciosa, Rocks diz que o micro:bit pode afetar a indústria da internet das coisas tanto quanto o BBC Micro afetou a indústria dos jogos, na época.

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Suas especificações incluem 25 LEDs na cor vermelha para exibir mensagens, dois principais botões para serem usados em jogos (ou até mesmo para passar/pausar a música no seu smartphone), acelerômetro e detectores de movimento. É possível ativar as luzes quando algo for movido dentro de um jogo, por exemplo.

Ainda que o micro:bit não inclua um módulo GPS (mas é possível acoplar um nos cinco anéis de entrada e saída), ele tem uma bússola que informa a direção, o movimento e a posição em que você está. Com o ímã incluso, também é possível detectar alguns tipos de metais.

Por fim, o dispositivo também vem com Bluetooth de baixo gasto energético, feito especialmente para aparelhos pequenos. Dá para conectá-lo com basicamente qualquer tipo de dispositivo com a tecnologia, fazendo o micro:bit tirar fotos remotamente, por exemplo. Também é possível construir uma guitarra que toca mais alto se você a agita mais, um gol que aumenta a pontuação se algo toca nele ou até mesmo um vaso de plantas que é regado conforme ele fica mais seco.

Alunos da escola West Yorkshire, por exemplo, prenderam o micro:bit a um balão de hélio e fizeram ele subir a uma altura de 32 quilômetros, chegando à estratosfera. Os sensores do computador coletaram dados como a temperatura, e um módulo GPS acoplado permitiu que eles achassem o micro:bit quando ele voltou à Terra.

Para usá-lo, as crianças podem acessar microbit.co.uk e programar direto do site, ou baixar o app para Android ou iOS. O projeto tem ajuda de grandes empresas, como ARM, Microsoft e até Samsung.

Os benefícios da programação

Tudo bem, a iniciativa é interessante, mas qual exatamente é o efeito prático desse projeto na vida das pessoas? Crianças precisam aprender a programar de verdade ou só devem ter uma noção básica de códigos? Qualquer lado que as pessoas defendam, o consenso é de que a conscientização sobre os meios digitais precisa aumentar.

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Como defendem algumas pessoas, a programação é meio que uma linguagem universal, e por isso aumenta a capacidade de comunicação e expressão dos cidadãos. Não é como um idioma específico, que só é entendido por pessoas de poucos países (ou um único país).

O principal argumento para ensinar código às crianças é que isso pode melhorar o raciocínio lógico deles, por um viés computacional. “O pensamento computacional te ensina a resolver problemas grandes quebrando-os em uma sequência de problemas menores e mais fáceis de gerenciar”, argumenta o Guardian.

Não que as crianças devessem aprender linguagens avançadas como PHP ou C++, mas sim uma estrutura de pensamento que façam elas entender como a base da programação funciona. De quebra, isso pode ajudá-las a ter uma noção melhor da computação pessoal e da internet.

Em entrevista à BBC, Steve Hodges, um engenheiro da Microsoft que trabalhou no micro:bit, diz que toda sua carreira de computação foi graças ao BBC Micro. “Eu implorei para que os meus pais comprassem um. Eu disse que nunca pediria mais nada se eles comprassem”, lembra.

No Reino Unido, especialistas dizem que o projeto não pode funcionar da forma como a BBC esperou por causa dos atrasos que o micro:bit levou para chegar ao mercado em relação ao ano letivo. É compreensível, afinal, um projeto para uma escala tão grande precisou passar por meses de testes antes de chegar ao produto final.

CodePhage

Por lá, pode depender dos professores das escolas selecionadas para incentivar e guiar os alunos a usar corretamente o micro:bit. Mas por que não um Raspberri Pi? Segundo Steve, o micro:bit é mais fácil de entender e “atrai os estudantes a ter contato com um estilo de aprendizagem tátil”, para enxergar o código de uma forma mais apelativa.

É inevitável que a programação desempenhe um papel fundamental na tecnologia, mas há quem defenda que nem todos se interessam com isso (por ser uma profissão como qualquer outra) e por isso não deveria ser algo obrigatório no currículo das escolas.

Por ser uma iniciativa acessível, e devido ao fato de apenas quem realmente tiver interesse comece a levar a sério a programação, parece uma proposta interessante. Melhor que, por exemplo, tratar a programação como química ou física, que muitos estudantes encontram dificuldades em aprender.

Pode ser que essa alta disponibilidade de ensino de programação ajude as crianças a encontrarem sua verdadeira paixão, mas é importante que o assunto (que já é mais difícil que o normal) não seja abordado de uma forma cansativa ou que faça os jovens odiarem mais o tema.

Países como o Reino Unido já têm várias iniciativas, além dessas da BBC, para estimular o desenvolvimento da programação. O Year of Code, por exemplo, pretende ensinar pessoas que nunca tiveram contato com código a programar.

Você acha que é importante que as crianças aprendam a programar?

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Escrito por

Jean Prado

Jean Prado

Ex-autor

Jean Prado é jornalista de tecnologia e conta com certificados nas áreas de Ciência de Dados, Python e Ciências Políticas. É especialista em análise e visualização de dados, e foi autor do Tecnoblog entre 2015 e 2018. Atualmente integra a equipe do Greenpeace Brasil.