Cadê a série completa? Netflix, Prime Video e outros fragmentam streaming no Brasil

Star Trek: Discovery teve uma estreia turbulenta no Paramount+ e deixou muitos fãs que acompanhavam pela Netflix insatisfeitos, mas não é um caso isolado

Felipe Vinha
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• Atualizado há 1 ano e 4 meses
Streamings fragmentados: realidade no Brasil ou no mundo todo? (Imagem: Guilherme Reis/Tecnoblog)

Há um problema recorrente nos catálogos de serviços de streaming no Brasil e ele não tem solução fácil. Recentemente uma polêmica com a série Star Trek: Discovery acendeu a discussão sobre como os streamings facilitam a vida de muita gente, mas também podem trazer alguma dor de cabeça aos fãs, que buscam ver séries e filmes que estão espalhados por diversas plataformas – e em alguns casos até incompletos e faltando temporadas anteriores. É a realidade fragmentada que nos leva a ter que pagar mais do que gostaríamos ou leva pessoas de volta à pirataria

O caso Star Trek

Tudo aconteceu em novembro. A série Star Trek: Discovery, a mais recente da saga, estava prestes a estrear sua mais nova temporada no mundo todo. Faltando apenas alguns dias a conta oficial da série publicou que ela seria removida da Netflix e seria exclusiva do Paramount+ onde ele estivesse disponível – apenas no início de 2022.

Veja o tamanho do problema: o Paramount+ já chegou ao Brasil, mas quem assistia Discovery na Netflix ia ficar sem a série e teria que assinar mais um streaming para ver a nova temporada com, pelo menos, dois meses de atraso. Enquanto isso a pirataria provavelmente já teria legendado todos os episódios sem nenhum atraso, “dançando” na cara de quem prefere pagar por serviços legalizados.

Claro que isso gerou enormes reclamações, de fãs em diversos países, e a Paramount+ voltou atrás: decidiu estrear a nova temporada quase junto de sua exibição original, nos EUA, mas ainda mantendo a exclusividade. Um dos problemas foi solucionado, mas o principal deles não.

Star Trek: Discovery nasceu em 2017 e foi produzido pela rede de TV CBS, nos EUA. A exibição por lá ficou para a TV e também para o streaming CBS All Access, que não tinha planos para se expandir internacionalmente, mas que depois foi rebatizado para o Paramount+.

Naquela época, porém, a Netflix era uma das líderes do mercado de streaming e não tinha tantas grandes concorrentes de hoje em dia, como HBO Max, Disney+ e derivados. Por este motivo a CBS fez um acordo internacional para lançar Discovery pela plataforma vermelha fora dos EUA, onde ela era exibida como “Original Netflix”, como o serviço adora chamar seus produtos exclusivos, ainda que não necessariamente signifique que seja uma produção só sua.

Mas as coisas mudam, o mercado muda e, principalmente, os planos de empresas gigantescas e bilionárias também mudam. ViacomCBS e Netflix decidiram encerrar a parceria que se iniciou em 2017, especialmente pelo fato de que a Netflix estava pagando pela maior parte dos custos de produção de Discovery e isso poderia render poder demais ao streaming sobre a produção. As coisas foram favoráveis à CBS, que agora controla a marca da série e não corre o perigo de perder sua “filha mais nova”.

É claro que, com isso, eles veem a chance de aumentar o número de assinantes do Paramount+ no mundo todo, tendo em vista que 2022 também vai trazer outra saga Star Trek exclusiva do serviço, a novíssima Star Trek: Strange New Worlds, spin-off de Discovery. Eu mesmo fui um dos que assinou a plataforma, via Amazon Prime Video Channels, para não ficar por fora de uma das minhas séries favoritas da atualidade. Ao mesmo tempo surgiram alguns problemas e questionamentos…

Star Trek: Strange New Worlds chega em 2022 no Paramount+ – ou assim se espera (Imagem: Divulgação/CBS)

Onde foi a série que estava aqui?

Star Trek: Discovery deixou a Netflix por inteiro. No Paramount+ é possível ver apenas a quarta temporada e seus novos episódios. As três anteriores? Ninguém sabe, ninguém viu, ainda que o mais provável é que cheguem mais tarde por lá também.

Ao mesmo tempo é tudo muito estranho, já que todos os outros shows de Star Trek, bem como seus filmes, ainda estão na Netflix e sem previsão para serem removidos. Por mais que uma saga não tenha relação direta com a outra, um “Trekker” (como é chamado o “nerd” da marca) teria que assinar os dois serviços para ter acesso a todos os produtos a hora que quiser, sem muito trabalho.

Ou melhor, até mais!

Star Trek: Picard, uma espécie de continuação do seriado de Star Trek dos anos 80-90, é exclusiva do Amazon Prime Video fora dos EUA, inclusive no Brasil, onde é vendida como “Amazon Original”. Tudo parte de outro acordo costurado pela CBS, desta vez com a Amazon, que eventualmente também pode expirar e deixar os assinantes órfãos, sem mais nem menos, porque uma empresa rica decidiu.

Em termos de Star Trek, estamos assim:

  • Star Trek: Discovery Temporada 4: Paramount+
  • Star Trek: Discovery outras temporadas: Fora do ar
  • Star Trek: Lower Decks (Animação): Paramount+
  • Star Trek: Picard: Amazon Prime Video
  • Todas as outras séries Star Trek: Netflix
A bagunça que é Star Trek nos streamings… (Imagem: Reprodução/Felipe Vinha)

Outra casa, caso parecido

Acordos comerciais similares aconteceram com outras produtoras e estúdios, o que levou a situações igualmente bizarras e que duram até hoje. O conglomerado Warner, por exemplo, chegou a assinar com a Netflix para lançar seus seriados da DC Comics e outras produções da casa por lá, bem antes de existir qualquer plano para o HBO Max existir – e substituir o péssimo HBO Go.

Assim a Netflix conta com The Flash, Supergirl, Legends of Tomorrow, Arrow e até Titãs, enquanto a HBO Max exibe Batwoman, Superman & Lois, Patrulha do Destino, Stargirl, entre outros.

O grande problema é que isso pode trazer algumas incongruências narrativas para quem prefere acompanhar tudo. Batwoman e a série do Superman fazem parte do mesmo universo de Supergirl, The Flash e outros que estão na Netflix. Existem eventos que unem todas as séries em episódios sequenciais, como foi com Crise nas Infinitas Terras, e para vê-los por completo a pessoa precisa pular de streaming em streaming, isso se tiver uma assinatura ativa.

Arrow e outros heróis estão na Netflix, mas muitos estão na HBO Max (Imagem: Reprodução/Felipe Vinha)

Titãs é um caso à parte, inclusive. A série nasceu como exclusiva do finado DC Universe Online, que já não existe mais e nunca chegou ao Brasil. Depois migrou para o HBO Max nos EUA e é lançada por lá como um “Original” da plataforma. No Brasil ela é “Original Netflix” e chega por aqui com um enorme atraso de vários meses, enquanto outras produções da DC Comics do HBO Max estreiam no Brasil de maneira simultânea em relação à América do Norte.

Isso sem falar em outros problemas menores e mais contornáveis, com produções que partilham de um mesmo universo, supostamente, mas que não se encontram na mesma plataforma por questões estratégicas ou de diferenças de estúdios. Sim, estou olhando para você, Universo Marvel Cinematográfico e seus pequenos filhotes. Séries exclusivas da Netflix, produções atuais no Disney+, filmes de personagens que são do Universo Marvel mas que foram produzidos por outros estúdios, como o Incrível Hulk da Universal e a saga Homem-Aranha da Sony.

Como deixar menos doloroso?

Assinar vários streamings pesa no bolso, isso é verdade. Se você resolver ter todos os que existem hoje, no Brasil, a conta pode passar fácil de R$ 300, o que até equivale a antigas TVs por assinatura e que que não eram nada acessíveis. Sem falar que os fãs podem ficar perdidos, não entender onde está cada produção, os motivos pelos quais elas estão lá – que geralmente nunca são explicados pelos estúdios ou plataformas, a não ser que você procure.

Para tentar ajudar e deixar menos doloroso, existem algumas soluções bem práticas. O próprio Tecnoblog tem várias listas e artigos que explicam ordens de filmes e séries de vários destes universos, como Homem-Aranha, Star Wars, Star Trek, Universo Marvel, séries da DC, entre outros – só clicar aí no nomezinho e escolher seu favorito.

O Universo Marvel: junto nas telas, fragmentado nos streamings (Imagem: Reprodução)

Também existem plataformas que informam onde cada filme ou série pode ser encontrada, catalogando streamings disponíveis no país, como o JustWatch, que é gringo, e o Chippu, nacional. Este último, aliás, é gerenciado por Thiago Romariz, sócio-fundador, que já trabalhou com alguns dos principais nomes do entretenimento geek e cultural do Brasil e sabia onde estava se metendo quando decidiu continuar seus projetos autorais, vendo a necessidade que algumas áreas ainda precisavam de cobertura, como a própria existência do Chippu.

Ainda que a proposta seja similar a serviços existente, Romariz garante ao Tecnoblog que o Chippu é diferenciado por trazer curadoria humana, seguindo alguns critérios e servindo também como rede social com perfis e notícias diárias. “Não é só sobre ter o catálogo. Você passa 30 minutos para procurar alguma coisa para assistir na Netflix, no Prime Video e tudo o mais. A gente tem uma curadoria que mistura o critério humano com o algoritmo que te encaixa nos perfis e com isso damos dicas do que assistir, onde assistir”, disse.

Hoje o Chippu conta com cerca de 200 mil usuários, desde que foi lançado em 2020, cobrindo todas as plataformas que estão no Brasil. Mas, mesmo com ferramentas facilitadoras, Romariz não vê uma solução breve ou rápida para o problema das “séries picotadas” ou os “streamings fragmentados”, como citei aqui. “Isso é um problema grande de indústria, vai levar bastante tempo para ser resolvido, mas não acho que vai acabar. Existem séries que vão ter empresas servindo de produtoras, mas a distribuição vai acabar ficando com outra marca. É uma briga por direitos e a solução mais prática acabam sendo os ‘Originais'”, complementou.

Plataformas como Chippu tentam ajudar na confusão de streaming, mas não resolvem (Imagem: Reprodução/Felipe Vinha)

Mas não pense que é só no Brasil que acontece esse tipo de coisa. Thiago Romariz hoje vive no Canadá e diz que lá é como cá, ou até pior. “É a mesma coisa, igualzinho. No Canadá por exemplo não temos HBO Max, então várias séries de lá vão para um serviço chamado Crave. Na Europa por exemplo é um caos, a engenharia jurídica que HBO e Warner tiveram que fazer pra lançar o HBO Max lá é uma coisa de louco. A indústria é caótica neste sentido pois ela funciona com base em acordos que foram assinados há 10, 15, 20, 30 anos, então vai demorar muito para que esse novo modelo de distribuição seja aceito”, explicou.

No fim das contas, a solução é: organize-se como puder. Os fãs de Grey’s Anatomy vão terminar o ano tristes, com sua despedida da Netflix, por exemplo. Quem acompanhava Parks & Recreation no Prime Video também vai ficar triste depois de janeiro. Ao menos temos a liberdade de cancelar um streaming para assinar o outro, sem necessariamente criar uma montanha de assinaturas e um estouro na fatura do seu cartão de crédito.

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Felipe Vinha

Felipe Vinha

Ex-autor

Felipe Vinha é jornalista com formação técnica em Informática. Já cobriu grandes eventos relacionados a jogos, como a E3, BlizzCon e finais mundiais de League of Legends. Em 2021, ganhou o Prêmio Microinfluenciadores Digitais na categoria entretenimento. Foi autor no Tecnoblog entre 2020 e 2022, escrevendo principalmente sobre games e entretenimento. Passou pelos principais veículos do ramo, e também é apresentador especializado em cultura pop.

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