Parece que o modelo de jogos “freemium” decolou de vez

Colunista discute se o novo modelo é positivo ou negativo para os gamers.

Izzy Nobre
• Atualizado há 1 ano e 7 meses

Lá em 2010, escrevi aqui no Tecnoblog um texto sobre o modelo freemium. De lá pra cá, o formato de games gratuitos com microtransações aparentemente deu tão certo que se expandiu além dos joguinhos casuais de celulares e começaram a ser adotados por grandes marcas, como o mais recente simulador de vôo da Microsoft ou Star Trek Online.

Sim, eu seria relapso se não mencionasse que o modelo já existia antes dos Farmvilles e Colheitas Felizes da vida (a propósito, MMOs foram o berço do modelo freemium). Acontece que eu tenho a impressão de que recentemente está acontecendo uma espécie de “corrida do ouro” em direção ao formato. Não devo ser o único, aliás: há quem diga que 2011 foi o ano do freemium.

Quando escrevi meu primeiro texto sobre o modelo, eu estava um pouco mais otimista sobre freemium do que estou hoje. Eu estava maravilhado com a ideia da distribuição digital (que eu considero o pai do modelo freemium), e particularmente empolgado com a ideia de um sistema de distribuição digital completamente sem fios e que te acompanha no seu bolso, como a App Store. Eu acreditava piamente que esses modelos não apenas eram o futuro, mas que eles em breve tornariam mídia física uma coisa do passado em relação aos games.

Como a maioria dessas mudanças dramáticas, a coisa não vai acontecer assim de repente. Estamos provavelmente muito longe de um futuro em que todos os seus games sejam baixáveis. Se nem mesmo os consoles portáteis dessa geração apostaram completamente na distribuição digital (uma plataforma onde o modelo é perfeito), acho que teremos que aceitar as mídias físicas por mais um tempo.

Mas divago.

De lá pra cá, perdi um pouco um pouco da boa vontade que tinha com o modelo freemium. Inicialmente, minha aceitação deste método devia-se por achar que era uma solução bastante elegante contra a pirataria. Especialmente no contexto brasileiro, no qual boa parte da turma que apela para a pirataria o faz frequentemente por não ter meios pelos quais adquirir games de forma legítima.

Não que eu considere “não tenho dinheiro” como uma justificativa para perpetuação de pirataria; é só uma análise pragmática do fenômeno. Enquanto existirem garotos de 14 ou 15 anos desempregados, haverá pirataria.

Com o modelo freemium, esse demográfico (adolescentes sem renda e sem a inclinação criminosa necessária pra surrupiar o cartão de crédito paterno) não precisaria se abster dos games. E, tornando-se usuários fieis do serviço, existem boas chances de que se tornem futuramente uma fonte de vendas para o serviço.

Perfeito, não é?

Talvez fosse enquanto o modelo ficasse nos joguinhos sociais que são na realidade passatempo para a fila do banco. O problema é que, como falei antes, estamos presenciando uma corrida do ouro em direção ao freemium. E existem alguns jogos que sofrem muito com a introdução dos elementos necessários a este formato que, se você parar pra pensar, se assemelha um pouco demais com aquele usado pelo narcotráfico.

“Quer um pouquinho só, pra ver como é? Tomaí na faixa. Ah, quer mais? Vai ter que pagar agora!”.

Hipérbole? É claro. Mas diz aí se não faz sentido.

A partir do momento que a indústria passa a saber que 40% dos jogadores de games freemium pagam por conteúdo através de microtransações (e que o restante ainda pode ser monetizado através de anúncios publicitários, se o público tiver a massa crítica necessária pra que banners se tornem lucrativos), a ideia de estender o modelo a outros gêneros de jogos pode se tornar perigosamente atraente.


(Vídeo do YouTube)

Vide o caso de Flight. A icônica série Flight Simulator da Microsoft não via novos jogos desde 2006, o que me faz imaginar que a franquia não estava rendendo mais. A migração pro modelo freemium (junto com uma espécie de rebranding da série) me soa como um “Ei, a Zynga e a EA estão tirando uma grana legal com esse negócio de microtransações, né? Hmmm… E se a gente experimentasse esse modelo com uma propriedade intelectual em relação a qual não temos nada a perder?”

Não sou alarmista o bastante pra sugerir que corremos risco de um Halo “free-to-play“. Entretanto, se o modelo continuar rendendo como está, começaremos a vê-lo sendo usado cada vez mais, e a influência desse tipo de fenômeno costuma agir como ondas numa lagoa: se alastra em todas as direções e acaba tocando a todos.

Mas sabe de uma coisa? Talvez haja sim causa para alarme. Espremer a carteira do jogador por conteúdo extra já atingiu os chamados títulos “AAA”, e com resultados às vezes lamentáveis (ou vocês já esqueceram a confusão a respeito do DLC de Mass Effect 3?); agora que o mercado tem a certeza que estamos dispostos a pagar por conteúdo adicional (ainda por cima, por conteúdo adicional em joguinhos triviais), temo que essa moda realmente não vai parar.

E acho que esse é o legado do modelo freemium. Não sei se os produtores de games hardcore vão resistir à tentação de apelar pra esse tipo de jogada quando nós já mostramos pra eles que estamos dispostos a gastar dinheiro até com os Colheitas Felizes da vida. “Não, não. Tira isso aí da versão final do jogo, e vamos distribuir por DLC. Se esse pessoal compra até moedas verdes…”

Leia | O que é um Game as a Service, também conhecido como Gaas?

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Izzy Nobre

Izzy Nobre

Ex-autor

Israel Nobre trabalhou no Tecnoblog entre 2009 e 2013, na cobertura de jogos, gadgets e demais temas com o time de autores. Tem passagens por outros veículos, mas é conhecido pelo seu canal "Izzy Nobre" no YouTube, criado em 2006 e no qual aborda diversos temas, dentre eles tecnologia, até hoje.