O carro elétrico não é nenhum santo

Produção de baterias para veículos elétricos gera grande impacto ambiental; reciclagem é um caminho para maximizar o potencial da modalidade

Josué de Oliveira
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O carro elétrico não é nenhum santo (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog
O carro elétrico não é nenhum santo (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog

Todas as conversas sobre um futuro mais sustentável passam pela diminuição ou mesmo eliminação do veículo à combustão. Ele é um dos grandes responsáveis por jogar os gases do efeito estufa na atmosfera.

Em seu lugar, o veículo elétrico se apresenta como a alternativa que resolveria todos os problemas. Um carro que faz tudo que os tradicionais fazem, mas com o bônus de não contribuir para o aumento da poluição. Todo mundo ganha.

Montadoras já vislumbram o momento em que deixarão de produzir veículos à combustão. A Volvo, por exemplo, sinaliza que, a partir de 2030, só venderá carros elétricos, “independentemente do mercado.” A Mercedes-Benz também mira o final da década, ainda que com um asterisco: “se as condições do mercado permitirem”.

A União Europeia quer que todos os carros produzidos a partir de 2035 sejam livres de emissões de CO2. A Inglaterra quer chegar lá em 2030. Mas ninguém é tão firme quanto a Noruega: o país nórdico pretende interromper a venda de carros a combustão em 2025, e 80% dos veículos vendidos em 2022 no país já eram elétricos.

Diante dessas movimentações, a demanda por veículos elétricos tem aumentado muito nos últimos anos. É uma corrida por um futuro mais limpo.

Mas há um problema. Em se tratando de emissões prejudiciais ao meio ambiente, o carro elétrico não é nenhum santo.

Tudo tem impacto

Amilton Barbosa é doutor em Engenharia Química e pesquisador na área de recuperação de metais. Atualmente, seu foco de pesquisa é a reciclagem de baterias de íons de lítio. No Tecnocast 302, ele contou um pouco mais sobre a produção deste componente.

Como o nome indica, o lítio é a principal matéria-prima das baterias. Trata-se de um metal que precisa ser extraído do solo. E esse processo é agressivo ao meio ambiente, gerando inclusive os gases de efeito estufa que o carro elétrico, já pronto, não emite.

Para extrair o lítio do solo, pode ser necessário explodir o minério. Processos químicos também são utilizados, várias etapas de purificação com ácido concentrado até chegar ao lítio comercializável. Além disso, há processos térmicos, com temperaturas podendo atingir os 1000º C.

E isso é antes do carro elétrico estar pronto. Quando ele já está em circulação, há que se considerar a matriz elétrica de cada país. O Brasil tem uma matriz considerada limpa, já que mais de 60% da energia elétrica é produzida por hidrelétricas. Em países com maior incidência de usinas termelétricas, no entanto, o carro elétrico é alimentado por energia gerada pela queima de carvão.

Ou seja: os veículos elétricos podem não emitir CO2, mas isso não significa que não sejam responsáveis, em alguma medida, por emissões. Como Barbosa destaca no Tecnocast, toda ação que tomamos na área de energia gera impactos negativos. Não é sensato, portanto, olhar para o carro elétrico como um salvador do meio ambiente.

Não existe uma solução única

É por isso que a reciclagem de baterias de íons de lítio se mostra tão urgente. Com a alta demanda por veículos elétricos, há cada vez mais necessidade pelo metal, o que significa mais extração, e, com isso, mais danos ao meio ambiente.

Além disso, o preço da matéria-prima subiu, e poucos países no mundo concentram a maior porcentagem da produção. Reciclar é importante não só do ponto de vista ambiental, mas também econômico, podendo ser uma arma contra a dependência.

No entanto, a reciclagem de baterias de íons de lítio caminha muito devagar, com estimativas de cerca de 5% em países como os Estados Unidos. É difícil imaginar as metas de governos e montadoras sendo alcançadas sem que esse número cresça substancialmente.

E, por uma questão técnica, é essencial que suba. Segundo Amilton Barbosa, outras tecnologias de baterias sendo estudadas no momento – as de sódio e nióbio, por exemplo – não se mostraram tão promissoras. Em sua opinião, a médio ou mesmo longo prazo, as de íons de lítio não serão substituídas.

Visualizando o carro elétrico dentro de seu contexto, podemos perceber que sua popularização não representa o fim de nossos problemas. Por essa razão, Barbosa sinaliza que o futuro deve ser marcado pela diversificação de soluções.

Eu vejo um futuro mais diversificado. Não só o veículo elétrico como solução, mas tendo também ao seu lado o veículo híbrido, alguns veículos à combustão eu acho que ainda vão continuar, (…) e você tem na reciclagem uma maneira de recircular esse material.

Amilton Barbosa

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Josué de Oliveira

Josué de Oliveira

Produtor audiovisual

Josué de Oliveira é formado em Estudos de Mídia pela UFF. Seu interesse por podcasts vem desde a adolescência. Antes de se tornar produtor do Tecnocast, trabalhou no mercado editorial desenvolvendo livros digitais e criou o podcast Randômico, abordando temas tão variados quanto redes neurais, cartografia e plantio de batatas. Está sempre em busca de pautas que gerem conversas relevantes e divertidas.

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