Estão os tablets em perigo de extinção?
As vendas de tablets estão caindo progressivamente, mas isso não é exatamente o prenúncio do fim
Talvez você se lembre dos netbooks. Esses laptops de tamanho reduzido e baixo custo viraram febre há alguns anos. Quase todo mundo queria um. Mas não demorou para esse tipo de computador cair no esquecimento. Embora em um ritmo bem mais lento, parece que o mesmo está acontecendo com os tablets, tanto que há gente especulando que esses dispositivos irão sumir do mercado. Será?
Sumir de verdade, ao ponto de não haver mais interesse de nenhum fabricante, é pouco provável. Mas é inegável que o segmento de tablets está passando por uma fase de readaptação: as vendas desse tipo de produto continuam expressivas, mas vêm caindo em escala global.
Essa percepção fica mais clara se analisarmos a situação da linha iPad. Na terça-feira (26), a Apple divulgou os resultados financeiros referentes ao primeiro trimestre fiscal de 2016 (encerrado em 26 de dezembro de 2015), dando motivo de sobra para os investidores comemorarem: no período, a companhia teve receita de US$ 75,9 bilhões, dos quais US$ 18,4 bilhões correspondem a lucro.
O pivô desses números tão impressionantes é a linha iPhone. Só no último trimestre de 2015, quase 75 milhões de unidades do aparelho foram vendidas no mundo todo, um total que gerou receita de US$ de 51,7 bilhões.
Com a linha iPad, porém, os resultados não foram nada animadores: 16,1 milhões de unidades do tablet foram vendidas no mesmo período. É um número importante, não há dúvidas, mas no primeiro trimestre fiscal de 2015, 21,4 milhões de unidades haviam sido comercializadas.
Se olharmos para o restante do segmento — aquela fatia que concentra tablets com Android — veremos que a situação não é melhor. Companhias como Samsung, LG e Asus também estão enfrentando reduções nas vendas de tablets.
Ainda não há dados oficiais, mas o IDC estima que as vendas do semento caíram pelo menos 8% em 2015. Para 2016 as coisas não devem ficar mais confortáveis: a CTA, entidade que organiza a feira CES, prevê queda também de 8% nas vendas globais de tablets na comparação com o ano passado.
Afinal, o que se passa?
O principal atrativo de um tablet é o tamanho da tela. A maioria dos modelos conta com displays cuja dimensão varia entre 7 e 10 polegadas. O problema é que, aos poucos, os usuários foram percebendo que tela maior não implica, necessariamente, em melhor experiência de uso.
Assistir a vídeos, visualizar fotos e jogar certamente são atividades que ficam mais interessantes nos tablets. Por outro lado, há uma infinidade de aplicativos que não aproveitam o tamanho mais generoso da tela de um dispositivo do tipo, fazendo com que a experiência de uso pouco mude na comparação com um smartphone. Isso acontece principalmente no universo do Android.
Esse aspecto, por si só, já é suficiente para muita gente desistir de ter um tablet (é o meu caso). Mas há outro que, provavelmente, influencia mais nessa decisão: o tamanho da tela dos smartphones aumentou.
Mesmo entre modelos de custo intermediário, é cada vez mais difícil encontrar smartphones com tela medindo menos de 5 polegadas. Para muita gente essa é uma troca bastante razoável: uma ou duas polegadas a mais já é suficiente para que o tablet não faça falta.
Dá para dizer que Coreia do Sul e Japão foram os países que iniciaram o movimento em prol dos smartphones grandalhões. Por lá, o consumo de conteúdo audiovisual no celular é uma prática bastante disseminada. Usar um tablet para isso enquanto você está no metrô, por exemplo, não é muito cômodo, mas um smartphone com tela grande consegue cobrir essa lacuna. Daí a preferência por esses dispositivos.
Há pelo menos mais um fator que contribui para a perda de ritmo do segmento: novos tablets oferecem pouca inovação em relação a modelos mais antigos, logo, é comum consumidores que já possuem uma unidade não terem pressa para trocá-la.
Nem tudo está perdido
Os netbooks “morreram” porque, no final das contas, os usuários viram que esses equipamentos não são tão práticos e os substituíram por laptops ultrafinos ou mesmo por dispositivos móveis. Os tablets, porém, enfrentam uma readequação no mercado: a demanda por esse tipo de produto está caindo, mas não a ponto de empurrar o segmento para o limbo.
Um levantamento da J. Gold Associates mostra, por exemplo, que o uso de tablets nas empresas deve crescer até 155% em três anos, pelo menos nos Estados Unidos. Pudera: há muitas atividades que são mais bem atendidas com esses dispositivos. É o caso de vendedores que visitam clientes. Exibir detalhes de produtos no tablet pode ser muito mais conveniente do que em um laptop.
Nesse sentido, a aposta da Apple no iPad Pro, aquela versão com tela de 12,9 polegadas que, como o nome indica, foi pensada para atividades profissionais, é bastante coerente. O modelo é de nicho, portanto, não deve ter muita saída. Em contrapartida, o iPad Pro tende a ter um ritmo de vendas mais estável.
A Microsoft trilha um caminho parecido com os tablets Surface. A linha não é um fenômeno de vendas, mas encontra espaço significativo no meio da clientela corporativa.
Entre os consumidores finais os tablets continuarão tendo espaço. Tem gente que vê utilidade neles para estudar, para trabalhar ou simplesmente para assistir vídeos antes de dormir, por exemplo. No entanto, esses dispositivos estão passando a fazer parte da categoria de produtos que despertam interesse, mas não têm prioridade. Aí as vendas caem mesmo.
Como muita gente ainda encontra utilidade nos tablet, é realmente pouco provável que esse tipo de gadget desapareça das prateleiras, pelo menos nos próximos meses. Porém, no longo prazo, o cenário pode ficar mais tenebroso se a lição de casa não for feita: a indústria precisa trazer mais inovação para o segmento, mas só conseguirá isso se parar de tratar os tablets como versões estendidas dos smartphones.