Vale expõe documentos internos no Google que mostram como lidar com acidentes
Documentos internos da Vale ficaram expostos na internet; vazamento foi resposta à tragédia de Brumadinho (MG)
Documentos internos da Vale ficaram expostos na internet; vazamento foi resposta à tragédia de Brumadinho (MG)
A Vale deixou uma série de documentos internos expostos ao público, mostrando como ela lida com acidentes pessoais ou ambientais, e as medidas adotadas para evitar que eles se repitam. Os arquivos estavam disponíveis via Microsoft SharePoint e podiam ser encontrados através de uma busca no Google. Recentemente, uma barragem da mineradora se rompeu e causou a tragédia de Brumadinho (MG).
Uma fonte anônima entregou 500 MB em documentos internos da Vale para Felipe Payão, do Tecmundo. São cerca de 40 mil arquivos detalhando incidentes de segurança ocorridos entre 2017 e 2019 no Brasil, Canadá, Moçambique, Indonésia e Nova Caledônia (um arquipélago na Oceania).
O Tecnoblog encontrou referências a alguns desses arquivos na busca do Google. Eles estavam armazenados no domínio vale.com e não podem mais ser acessados. Ao clicar no link, você se depara com uma mensagem de erro do Microsoft SharePoint, ferramenta usada em portais e intranets empresariais.
No entanto, o conteúdo foi armazenado no cache do Google. Os documentos claramente não deveriam ser públicos, pois incluem o aviso “USO INTERNO: Esta apresentação é de propriedade da Vale e deve ser usada somente em comunicações internas”.
O Google indexou até mesmo o link para realizar buscas dentro do SharePoint da Vale. A versão em cache menciona documentos reunindo incidentes com potencial crítico ou catastrófico:
No entanto, ao acessar a versão original, nota-se que todas essas referências foram removidas:
A Vale diz em comunicado que “não houve falha técnica no site SharePoint ou invasão de seu ambiente de TI”. Ela nota que “os arquivos de uso interno que foram atribuídos a um vazamento, na verdade, estavam disponíveis em área pública do nosso site vale.com”.
Os hackers explicam ao Tecmundo que os arquivos foram descobertos por meio de uma URL oculta que estava aberta ao público. Segundo eles, o método envolveu a “indexação de documentos secretos em um subdomínio oculto, por meio de motores de busca”. A tática para descobri-los é chamada de Google hacking.
Os documentos foram divulgados em protesto ao rompimento da barragem de Brumadinho, que matou pelo menos 99 pessoas; 259 ainda estão desaparecidas. Os rejeitos de mineração atingiram todo o município e podem chegar ao rio São Francisco.
Documento interno da Vale exposto no Google:
Mensagem de erro do SharePoint ao tentar acessá-lo:
Entre os documentos expostos, há uma apresentação no formato PDF intitulada “Incidentes com Potencial Crítico/Catastrófico de SSMA”, sigla para Saúde, Segurança e Meio Ambiente. Sua data é 26 de junho de 2017.
Em gestão ambiental, existem pelo menos cinco níveis de severidade para incidentes: leve, moderada, grave, crítica ou catastrófica. O pior caso envolve danos irreparáveis, seja aos equipamentos, ao meio ambiente ou aos funcionários (incluindo morte ou lesão grave).
A Vale usa três categorias para avaliar a severidade de incidentes: saúde e segurança; meio ambiente; e social e direitos humanos. Além disso, ela considera a severidade potencial — imaginando o pior cenário possível — e a real, já levando em conta todos os desdobramentos.
O documento lista casos em que a severidade potencial era crítica ou severa. Por exemplo, o pé de um funcionário foi esmagado em uma mina de Ontario, no Canadá; um trem na estrada de ferro Carajás atropelou uma pessoa em Marabá (PA); e empregados foram assaltados a mão armada no acesso de uma obra em São Luís (MA).
Outra apresentação foi usada em uma reunião semanal de SSMA, e menciona a mina de Mariana (MG) — onde ocorreu um desastre ambiental após um rompimento de barragem da Samarco.
O incidente é descrito assim: “durante atividade de montagem e calibragem de um pneu de caminhão CAT785, utilizando empilhadeira de garfo, o pneu caiu sobre o empregado prensando-o contra o chão”. O funcionário havia trabalhado 18 anos na Vale. O caso ocorreu em fevereiro de 2015 — antes do rompimento da barragem — e sua severidade foi classificada como “crítica”.
Depois do incidente, os empregados foram orientados a sempre manter uma distância segura dos equipamentos; e a não deixar pneus soltos na posição vertical. Aos supervisores, cabe acompanhe a montagem e calibragem; e garantir que o transporte seja feito “por manipuladores de pneus ou dispositivos com cintas que garantam a fixação do pneu”.
Apresentação da Vale “deve ser usada somente em comunicações internas”; a formatação foi perdida porque o documento está no cache do Google:
Documento da Vale menciona o lema “Que todo trabalhador retorne para casa íntegro após um dia de trabalho”:
“Maquinista realizou procedimentos de segurança e aplicou emergência, porém não conseguiu evitar o atropelamento”
Acidente fatal de 2015 em Mariana, antes do rompimento da barragem, envolveu a montagem de um pneu de caminhão:
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