Big Techs com carinha de banco

Cartão de crédito, cashback, até conta poupança: serviços financeiros entraram de vez no leque de negócios das maiores empresas de tecnologia

Josué de Oliveira
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A bancarização das Big Techs (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog)
A bancarização das Big Techs (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog)

Na terça-feira, dia 08 de agosto, a Amazon oficializou o lançamento de seu cartão de crédito no Brasil. Com ele, usuários ganharão cashback em compras feitas na varejista, mas também em estabelecimentos como farmácias e restaurantes. A empresa chega oferecendo um produto com muitas vantagens, e, ainda por cima, com anuidade grátis.

É uma jogada agressiva, como tudo que vem da Amazon. Se você é um comprador assíduo da plataforma, fica até difícil pensar num motivo para não pedir o cartão de crédito. Se for assinante do Prime, então — o que garante cashback ainda maior —, é quase impossível.

Olhando para o quadro maior, esse lançamento da Amazon dialoga com um movimento mais amplo. Grandes empresas de tecnologia entraram na era dos serviços há muito tempo. Dentro desse contexto, os produtos financeiros se mostram uma frente importante para atração e retenção de usuários.

E a Amazon não está sozinha nessa.

Poupança melhor que nos bancões

O cartão de crédito da Amazon, com seu cashback pra lá de atraente, já existe lá fora. A principal diferença é a forma de resgatar o dinheiro acumulado. Por aqui, será na forma de pontos a serem gastos na loja, enquanto nos EUA pode ser em dinheiro, gift cards ou viagens.

Como a Amazon é uma loja, faz todo sentido ofertar um cartão. Mas mesmo para players de fora do varejo essa estratégia pode ser interessante. Basta olhar o exemplo da Apple, que também lançou o seu cartão de crédito em 2019.

Além do Apple Card, a empresa de Tim Cook oferece outro serviço bem tradicional em instituições bancárias: uma conta poupança. A Apple Savings — batizada carinhosamente no Tecnocast 299 de ApplePança — estreou este ano, e em apenas quatro dias já tinha atraído US$ 1 bilhão em depósitos. O número mais recente, divulgado pela Apple em agosto, é de US$ 10 bilhões.

O principal atrativo é, sem dúvida, o rendimento. No Apple Savings, ele chega a 4,15%, mais do que muitos bancões americanos conseguem entregar.

Cartela com cartão de crédito da Amazon, na cor preta
Leitor do Tecnoblog recebeu cartão de crédito da Amazon antes do lançamento oficial (Imagem: Reprodução/Tecnoblog)

Isso não significa que estas empresas estejam passando sistema bancário tradicional para trás. O cartão da Amazon nos EUA é emitido pelo Synchrony Bank, e, no Brasil, pelo Bradesco/Bradescard; já a Apple tem como parceiro o banco Goldman Sachs, tanto para seu cartão de crédito quanto para a conta poupança.

No entanto, é bastante claro que os bancos estão presentes apenas por uma questão de necessidade. Por maiores que sejam, Amazon e Apple não são instituições financeiras, de modo que precisam da assistência de empresas desse setor.

Isto é, por enquanto. Dado o tamanho e alcance destas empresas, não é impossível que, no futuro, elas abram oficialmente vertentes bancárias. Afinal de contas, os clientes já estão lá. E o prestígio também.

Quem confia nos bancos?

Há poucos meses, a economia americana testemunhou a segunda maior quebra de um banco do país. As consequências da falência do Silicon Valley Bank vão além da dor de cabeça para os órgãos regulares e empresas afetadas; elas também se manifestam num agravamento da desconfiança nas instituições financeiras tradicionais.

Esse fenômeno já ocorre há algum tempo. Uma pesquisa realizada no ano passado mostra que apenas 27% dos americanos afirma confiar fortemente em seus bancos. No final dos anos 1970, esse número era 60%.

Em meros dois dias, o banco das startups afundou (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog)
Em meros dois dias, o SVB, conhecido como o banco das startups, afundou (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog)

Por outro lado, marcas como Apple e Amazon tendem a ser mais confiáveis aos olhos dos usuários. Tanto é assim que a taxa de lealdade ao iPhone ultrapassa os 90% nos EUA; já o Prime, da Amazon, tem uma taxa de renovação de assinatura de 95%. É fidelização das mais altas.

Ou seja: estas empresas já têm uma forte presença na vida de seus clientes, e os números mostram que estes estão satisfeitos com a relação. Os bancos, por outro lado, são encarados com um pouco mais de suspeita.

Um cartão de crédito da Amazon ou da Apple, portanto, tende a ser visto como um produto identificado com estas empresas, mesmo que haja bancos tradicionais envolvidos. É fácil perceber qual das instituições goza de maior valor aos olhos do consumidor.

Presos no ecossistema

É esse valor, no fim das contas, que leva o usuário em direção aos serviços financeiros de empresas de tecnologia. Se Amazon e Apple já fazem parte da sua vida na forma de compras, serviços, entretenimento e gadgets, um cartão de crédito ou conta poupança é só um laço a mais.

Do lado das empresas, essas frentes de negócio fortalecem a relação com o cliente, que ganha mais um motivo para permanecer. Além disso, servem como mais um chamariz para quem está do lado de fora. Basta olhar para os 5% de cashback para membros do Prime, contra 3% para não membros. Nessa brincadeira, o serviço ganha mais assinantes.

Amazon no celular (Imagem: Christian Wiediger/Unsplash)
Amazon no celular (Imagem: Christian Wiediger/Unsplash)

O que ocorre, no fim das contas, é uma ênfase ainda maior no ecossistema. O usuário fica ainda mais “preso” no agrupamento de serviços de uma só empresa, que tende a ser vista como mais competente do que um banco, por exemplo.

Resta verificar se, ao longo do tempo, as Big Techs continuarão oferecendo boas condições aos usuários que utilizam seus serviços financeiros. E se esses serviços manterão o mesmo nível de qualidade das demais frentes de negócio da empresa. Como chama a atenção o usuário gfcunha na Comunidade do Tecnoblog, “não dá para ser bom em tudo”.

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Josué de Oliveira

Josué de Oliveira

Produtor audiovisual

Josué de Oliveira é formado em Estudos de Mídia pela UFF. Seu interesse por podcasts vem desde a adolescência. Antes de se tornar produtor do Tecnocast, trabalhou no mercado editorial desenvolvendo livros digitais e criou o podcast Randômico, abordando temas tão variados quanto redes neurais, cartografia e plantio de batatas. Está sempre em busca de pautas que gerem conversas relevantes e divertidas.

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