Cancelaram 20 vezes: as dificuldades para pedir Uber em 2022

Usuários da Uber se queixam de demora no atendimento, da tarifa dinâmica e até relatam caso com cerca de trinta cancelamentos

Bruno Gall De Blasi
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• Atualizado há 11 meses
Cancelaram 20 vezes: as dificuldades para pedir Uber em 2022 (Imagem: Vitor Pádua/Tecnoblog)
Cancelaram 20 vezes: as dificuldades para pedir Uber em 2022 (Imagem: Vitor Pádua/Tecnoblog)

Tinha acabado de sair do cinema quando peguei o celular para pedir um Uber em uma sexta-feira, por volta das 22h. Na porta de um shopping da Barra da Tijuca, região do Rio de Janeiro (RJ) onde as pessoas dependem de carro até para ir à esquina, apertei o botão “Confirmar UberX”. Um, dois, cinco, dez minutos, nada. De repente, o app me notificou: “No momento, o UberX não está disponível”. E foi assim que começou a longa saga para eu conseguir uma corrida e chegar ao meu destino.

Esta não foi a primeira e nem a única vez que isso aconteceu. Dias depois, tentei ir ao Centro do Méier de Uber. Neste momento, chegaram a aceitar e cancelar a minha corrida cerca de vinte vezes após ter que refazer o meu pedido mais de uma vez. A demora foi tanta que desisti e pedi um táxi, serviço que me atendeu em menos de cinco minutos e que ainda saiu mais barato.

Usuários da Uber relatam dificuldades para conseguir uma corrida (Imagem: Priscilla Du Preez/Unsplash)
Usuários da Uber relatam dificuldades para conseguir uma corrida (Imagem: Priscilla Du Preez/Unsplash)

As duas histórias retratam o “novo normal” da Uber no Brasil. Pelas redes sociais, diversas pessoas reclamam das demoras e, principalmente, dos cancelamentos. Há até quem se queixe dos preços que, em alguns momentos, disparam devido à tarifa dinâmica. Enquanto isso, o passageiro só tem duas opções: desistir ou buscar uma outra opção, como o táxi.

“Gente, pedir Uber tá virando mesmo uma saga, né? Passei por essa peleja há pouco e já tinha visto reclamações a respeito”, disse uma pessoa pelo Twitter em 11 de janeiro. “Sem contar que o preço do táxi que pedi após não conseguir motorista deu praticamente o mesmo.”

“Tá impossível pedir Uber hoje em dia sem ser cancelada 500 vezes”, disse uma usuária do serviço na sexta-feira (14). “A meta era sair uns 20 minutinhos antes do horário, mas como corria o risco de ninguém aceitar a corrida, já comecei a pedir o Uber uma hora antes”, brincou outra pessoa na quarta-feira (12) pela mesma rede social.

A situação até ganhou uma paródia de programa de auditório:

Os relatos do Tecnoblog

A equipe do Tecnoblog, é claro, não ficou de fora dessa saga. Além dos meus relatos, houve um momento em que um dos nossos autores perdeu a sessão do cinema pois a corrida do UberX se aproximava de R$ 70 em um dia de chuva, sendo que, geralmente, os valores ficam na casa dos R$ 15. E olha que o preço estava com um desconto oferecido pelo seu cartão de crédito.

Outro integrante passou por uma situação parecida em São Paulo. Ele contou à reportagem que, mais de uma vez, uma corrida que custa entre R$ 9 e R$ 12 passou a cobrar mais de R$ 30. “Valia a pena chamar um táxi”, disse. Ele também conta que, dos últimos meses para cá, tem demorado demais para encontrar motoristas, mesmo em regiões com muito movimento.

Rio de Janeiro

De volta ao Rio de Janeiro, uma pessoa da equipe lida com situação parecida desde o início da pandemia de COVID-19. Ele relata que, em regiões mais afastadas do Centro e da Zona Sul, fica ainda mais difícil conseguir uma corrida pelo aplicativo. “Quando passa de 22h, por exemplo, chega ao cúmulo de simplesmente não achar carro”, disse. “Dá para entender o lado dos motoristas, mas se o app não mudar alguma coisa, vai ficar impraticável usar em pouco tempo.”

Outro usuário da Uber destaca a dificuldade para conseguir corridas para outras cidades da Região Metropolitana. Neste caso, os motoristas até aceitam a corrida. Mas depois de ver a cidade, cancelam antes mesmo de perguntarem a localização exata. “Já bati um recorde pessoal, certa vez, de quase 30 cancelamentos até conseguir pegar um carro”, afirmou. “O que tenho feito nesses casos, quando noto que a Uber está com muitos cancelamentos, é alternar entre ela e a 99.”

Mas também há quem tenha uma experiência positiva com o aplicativo pois não lidou muito com cancelamentos recorrentes. Ainda assim, o usuário do serviço também notou algumas diferenças nos últimos tempos: “senti que as tarifas aumentaram”, afirmou. “Afinal, antes eu pagava cerca de R$ 7 para ir à casa de uma amiga aqui perto e agora pago até uns R$ 14”.

Relatos de usuário reúnem queixas por cancelamentos recorrentes, demora no atendimento e mais (Imagem: Reprodução)
Relatos de usuário reúnem queixas por cancelamentos recorrentes, demora no atendimento e mais (Imagem: Reprodução)

São Paulo

Em São Paulo, uma pessoa da equipe enfrentou a mesma situação com a sua esposa. Os dois encararam problemas com cancelamentos e atrasos nos últimos meses a ponto de tornar-se um obstáculo a uma simples ida ao médico. “Em duas das situações, acabamos pegando ônibus e chegamos em cima da hora da consulta”, disse.

A realidade é similar com a de outros usuários do app na região. Um deles conta que estava acostumado a conseguir um carro do UberX em até 5 minutos. “Mas hoje em dia não é raro um motorista estar a 10 minutos de mim”, afirmou. Devido aos problemas, ele tem usado o app menos que o normal e até apela para o táxi em alguns momentos. Outra pessoa também relatou um episódio em que encarou oito cancelamentos consecutivos.

Não é só Rio e São Paulo

Os problemas não são exclusividade do eixo Rio-São Paulo. Em Minas Gerais, um usuário da Uber relatou que “é comum esperar mais de 15 minutos por um carro”. Além dos cancelamentos, muitos motoristas não aceitam a corrida ou até aceitam, mas não se locomovem. “Minha alternativa foi o táxi, que custou mais caro”, afirmou.

Em uma cidade no interior do Rio Grande do Sul, uma pessoa relatou que o preço flutua bastante para se locomover entre os bairros. “Se eu for pegar Uber para ir a algum restaurante, via de regra fico acompanhando o preço por uns dez minutos”, disse. “Com cinco minutos esperando você já pode ver o preço dobrar ou cair pela metade.”

A situação se agrava ao ir para uma cidade vizinha, pois nota-se a falta de motoristas disponíveis, o que resulta em longos períodos de espera. Em sua cidade, o usuário não lidou com muitos problemas relacionados a cancelamentos recorrentes. Mas o mesmo não pode ser dito quando foi à Santa Catarina. “Por aqui a gente já está até criando costume de pedir 99”, relatou. 

Uber chegou ao Brasil como uma alternativa bastante competitiva ao táxi (Imagem: Fernando Oda/Núcleo Editorial/Flickr)
Uber chegou ao Brasil como uma alternativa bastante competitiva ao táxi (Imagem: Fernando Oda/Núcleo Editorial/Flickr)

A Uber nem sempre foi assim…

Mas essa não era a realidade dos últimos anos, período em que a Uber se tornou um serviço essencial para grande parte dos brasileiros. E não é para menos: pelo menos no meu dia a dia carioca, por volta de 2014, lidar com o serviço de táxi era complicado. Além dos valores muitas vezes proibitivos, o atendimento deixava a desejar em muitos detalhes. Até conseguir um carro com maquininha de cartão era difícil.

Este cenário começou a mudar após a chegada da Uber. Seja no Rio de Janeiro (RJ), em São Paulo (SP), Brasília (DF) ou em qualquer outra cidade do Brasil, a empresa não só resolveu a questão do atendimento como popularizou um serviço que era bem restrito. Além disso, simplificou dois processos com um único aplicativo: a procura por um carro para iniciar a corrida e o pagamento. 

A fama foi se prolongando pelo país à fora depois do lançamento nas capitais. Hoje em dia, há quem peça um carro para viajar de uma cidade para outra. E não para por aí: devido aos preços convidativos, algumas pessoas passaram a usar mais a Uber do que transporte público, especialmente durante a pandemia. Até as empresas deixaram o táxi de lado e deram prioridade ao serviço da Uber aos seus funcionários.

O problema é que o nível de satisfação da Uber vem caindo com o tempo nos dois lados. Em agosto de 2021, o Tecnoblog retratou as dificuldades dos motoristas com a plataforma após observar as queixas de usuários do serviço. Na época, o presidente da AMASP (Associação dos Motoristas de Aplicativo de São Paulo) destacou alguns fatores, como os valores baixos pagos por viagens, a insegurança e até mesmo o aumento no preço dos combustíveis.

Ao lado da 99, a Uber até chegou a ser multada em R$ 5 milhões pelo Procon Carioca em janeiro. No anúncio do auto de infração, o órgão da Secretaria de Cidadania da Prefeitura do Rio de Janeiro (RJ) informou que o tempo usual de espera estava “se multiplicando e chegando a até uma hora por conta dos recorrentes cancelamentos de corridas pelos motoristas”. Na época, a empresa afirmou que iria recorrer da autuação assim que fosse notificada.

Enquanto isso, a busca pelo táxi segue em alta. Segundo o Sindicato dos Taxistas Autônomos do Município do Rio de Janeiro (Stamrj), a procura por táxis na capital fluminense cresceu 60% nos meses anteriores à dezembro de 2021. Parte desse pico é explicado pelo aumento do preço dos apps de transporte. Os cariocas ainda contaram com um aliado inesperado nesta nova aventura: o aplicativo Táxi.Rio, que foi desenvolvido pela Prefeitura do Rio de Janeiro exclusivamente para chamar os amarelinhos, conforme mostra uma reportagem do Rest of World.

Motoristas de Uber listam preço da gasolina, insegurança e outros fatores como problemas (imagem: Victor Xok/Unsplash)
Motoristas de Uber listam preço da gasolina, insegurança e outros fatores como problemas (imagem: Victor Xok/Unsplash)

O que dizem as citadas?

Tecnoblog entrou em contato com a Uber, Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia) e a 99 para tratar sobre o assunto. Confira os posicionamentos das companhias e da associação.

Uber

A Uber orientou entrar em contato com a Amobitec (veja o posicionamento da associação que representa o setor na seção abaixo). Além disso, a companhia relembrou a existência da opção para pedir táxi pelo seu próprio aplicativo em São Paulo e deu mais explicações sobre o funcionamento da tarifa dinâmica. Confira a nota na íntegra a seguir:

“Quando a demanda por viagens, em uma determinada área, é maior do que o número de motoristas parceiros circulando na região naquele momento, o preço se torna dinâmico e o valor da viagem pode se tornar mais caro do que o habitual para aquele mesmo trecho. O preço dinâmico é aplicado para incentivar que mais motoristas se conectem ao aplicativo e assim os usuários tenham um carro sempre que precisar. Quando a oferta sobe novamente, os preços voltam ao normal. De qualquer forma, o preço dinâmico é informado ao usuário no momento em que a viagem é solicitada.”

Amobitec

A Amobitec ressaltou que o “aumento exponencial da demanda” está por trás do maior tempo de espera. Além disso, a associação disse que as empresas estão atuando para preservar o equilíbrio entre a oferta e a demanda. Leia na íntegra o posicionamento da associação em relação ao cancelamento de corridas:

“As associadas têm políticas próprias relacionadas aos cancelamentos de corridas, porém, em linhas gerais, comportamentos intencionais que prejudiquem a experiência dos demais membros das plataformas, como cancelar viagens reiteradamente (seja o motorista ou o usuário), são analisadas pelas empresas tendo em vista seus Termos de Uso e podem resultar em ações nas contas envolvidas.

Os motoristas parceiros de aplicativos são profissionais independentes e, assim como os usuários, podem cancelar viagens quando julgarem necessário. Quando uma corrida específica é cancelada pelo motorista, os aplicativos rapidamente redirecionam o chamado para outro parceiro disponível. Quando é o usuário quem cancela, da mesma forma o sistema dos aplicativos procuram redirecionar o motorista para atender um outro chamado rapidamente.”

A associação ainda ressaltou que as empresas têm diretrizes e estratégias de preços próprias, “já que se trata de um setor dinâmico e competitivo”. Ainda assim, as companhias “levam em conta uma série de fatores”, como as condições de trânsito, demanda por viagens no horário e local específicos, distância, congestionamentos, o tempo para os deslocamentos, entre outros.

99 informa que seu índice de cancelamento dos últimos doze meses está abaixo de 5% (Imagem: Ana Marques/Tecnoblog)
99 informa que seu índice de cancelamento dos últimos doze meses está abaixo de 5% (Imagem: Ana Marques/Tecnoblog)

99

A 99 afirmou que “o índice de cancelamento na plataforma registrado em todo o Brasil nos últimos 12 meses está abaixo de 5%, a menor porcentagem do setor”. A companhia ainda ressaltou que este resultado é “reflexo da política da empresa que garante mais autonomia e transparência para quem dirige pela plataforma”.

A empresa também disse que é “a única em seu segmento que não limita a quantidade de corridas que podem ser rejeitadas”. Esta medida, segundo a 99, permite que o motorista “tome a melhor decisão” com base no valor, origem, destino e dados sobre o passageiro. Mas ela ressalta que pode ocorrer um tempo de espera maior quando a demanda está alta.

“A empresa trabalha constantemente para equacionar a disponibilidade de motoristas parceiros e garantir um transporte acessível e seguro aos usuários”, afirmaram. A 99 também ressaltou que reajustou os ganhos dos motoristas parceiros entre 10% e 25% e que lançou um pacote de ações chamado Mais Ganhos para beneficiar os parceiros da plataforma.

A 99 também relembrou que possui uma opção para solicitar corridas de táxi.

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Bruno Gall De Blasi

Bruno Gall De Blasi

Ex-autor

Bruno Gall De Blasi é jornalista e cobre tecnologia desde 2016. Sua paixão pelo assunto começou ainda na infância, quando descobriu "acidentalmente" que "FORMAT C:" apagava tudo. Antes de seguir carreira em comunicação, fez Ensino Médio Técnico em Mecatrônica com o sonho de virar engenheiro. Escreveu para o TechTudo e iHelpBR. No Tecnoblog, atuou como autor entre 2020 e 2023.

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