Após um dos mais longos suspenses do mundo da tecnologia, a Apple finalmente revelou ao mundo o seu tão aguardado tablet – o iPad, ou “iPod touch de Itu” como foi rapidamente apelidado dois segundos após ser mostrado por Steve Jobs. E as piadinhas dos nerds não pararam por aí; talvez apenas deram um pause rapidinho enquanto carregavam o Photoshop pra parodiar mais ainda o gadget.
O mundo geek soltou um coletivo “…é isso aí que estivemos esperando esse tempo todo?” quando Steve terminou de vender seu peixe. Confesso que eu mesmo tive essa reação, até pensar um pouco na filosofia Jobsiana e entender que o iPad talvez seja uma sacada de mestre que redefinirá a forma como a maioria das pessoas usa computadores.
Não vou perder o meu nem o seu tempo tentando te explicar a minha teoria; ela é tangente ao ponto de vista desta coluna, e muitos outros sites de tecnologia já cantaram essa ladainha a exaustão na última semana. E a despeito de todos os argumentos contra ou a favor do tablet da Apple, eloquentes ou não, o sucesso real do aparelho é algo que só poderemos quantificar daqui muitos meses.
Entretanto, numa coisa todos nós podemos concordar – o iPad não é pra mim nem pra você, fanático por gadgets, gente ligada no mundo da tecnologia. O iPad é um semi-computador que tem como alvo gente como minhas tias ou minha avó, gente que precisa usar computadores aqui ou ali, mas os odeia ou os acha intimidantes. Um não-computador pra quem não gosta de computadores.
Eu estava pensando sobre essa mudança de paradigma em que o Steve resolveu apostar, quando outro gadget que tinha um público similar veio à minha mente – o Nintendo Wii.
Lembram do lançamento do Wii? Os nerds que aguardavam uma revolução (afinal, o codinome “Revolution” e hoaxes bem produzidos como este levaram as expectativas à estratosfera) torceram o nariz ao ponto de fratura ao verem o controle simplificado e os jogos com gráficos de geração passada. Até o nome foi alvo de piadinhas – a pronúncia de “wii” em inglês soa como a forma infantil de se referir ao ato de urinar -, veja você como a história se repete.
Nerds detestaram, mas a turma que não era consumidora de videogames achou interessante. Acharam tão interessante, aliás, que o console passou um ano inteiro como um artigo completamente esgotado em todas as lojas. Menos de quatro anos após o lançamento, o console que nerds previram que seria a falência da Nintendo vendeu 67 milhões de unidades – mais do que as vendas combinadas do Xbox 360 e do PS3.
Ou seja – um aparelho desinteressante pros amantes de tecnologia acabou se tornando um incrível sucesso justamente por interessar a outro público. Soa familiar?
E aí entram os games. O Wii levou controles às mãos de gente que nunca havia pensado em gastar dinheiro com videogame antes. O iPad talvez repita a mesma proeza.
Imagine a cena que provavelmente se repetirá muitas vezes ao redor do mundo daqui a 2 meses, quando o iPad for lançado – sua tia (que frequentemente precisa de ajuda pra dezipar arquivos ou mover pastas de um thumbdrive) ganhou ou comprou um iPad, com o propósito de simplificar suas poucas interações com um computador. Esse pessoal raramente faz mais na frente de um monitor que ler emails ou acessar sites de relacionamento, e ninguém precisa de algo mais complicado que o iPad pra isso.
Lá está ela com um aparelho que traz a loja virtual que se tornou um fenômeno absoluto na forma como facilitou o consumo de joguinhos baratos pra dispositivos móveis. Com preços a partir de 99 centavos e instalação que se resume em clicar num único botão, não será um espanto quando sua tia começar a jogar alguma coisa em seu iPad.
Antes que você perceba, ela terá comprado outro, e outro, e mais outro jogo. Com a popularidade do aparelho, não será improvável que ela tenha amigas que também o possuam, e quem sabe elas comecem a conversar sobre os jogos que andam comprando e jogando. Com as capacidades online do iPad, não seria surpreendente se sua tia um dia passasse a jogar games multiplayer com as amigas – enquanto senta no sofá da sala, tomando um chá.
Um xadrezinho, forca, talvez Scrabble? Todos esses games já existem na AppStore, e a galera mais velha já os joga nos sites de relacionamento. Imagina-los migrando o hábito pro iPad não é nenhum salto.
Há outras possibilidades, também – o tamanho da tela torna perfeito pra jogos de tabuleiro, ou jogos de estratégia em tempo real. Assim como o iPhone ou o iPod touch, NINGUÉM comprará o iPad pensando em games. Mas, bastará entrar na AppStore uma vez só pra se tornar um consumidor frequente de jogos. Aconteceu comigo, aconteceu com meu irmão, aconteceu com minha noiva. O apelo da AppStore é irresistível.
A falta de visão dos nerds os impediu de prever o sucesso estrondoso do Wii no mercado gamer casual. Estaria o iPad trilhando o mesmo caminho?