O feed do Instagram não é mais como antigamente

Diante de fotos e vídeos incríveis compartilhados por influenciadores e criadores de conteúdo, muitos usuários não se sentem mais à vontade para postar no feed

Josué de Oliveira
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As regras (não ditas) de estética no Instagram (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog)
As regras (não ditas) de estética no Instagram (Imagem: Vitor Pádua / Tecnoblog)

No ano passado, o Instagram mudou. Adam Mosseri, chefão da companhia, comunicou que vídeos curtos e recomendações estariam muito mais presentes na plataforma.

Houve reação de usuários descontentes, e até mesmo uma campanha pela volta dos bons e velhos tempos em que as fotos eram o principal apelo do aplicativo. Não deu em nada. O Instagram virou outra coisa e não olhou para trás.

O motivo dessas mudanças é o TikTok. A plataforma chinesa mudou o jogo, capturando a atenção de usuários jovens de um jeito que sacudiu a Meta. Algo precisava ser feito, gostassem os mais saudosistas ou não.

No entanto, explicar tudo a partir de decisões monocráticas de executivos seria um erro. As alterações também são resultado direto de como os usuários vêm se relacionando com o Instagram nos últimos anos. E, se quisermos entender essa dinâmica, basta olhar para o lugar onde tudo começou: o feed.

Os profissionais tomaram conta

No interessante artigo Social Media is Dead, publicado na Business Insider, as jornalistas Sydney Bradley e Amanda Perelli apresentam um quadro curioso: as pessoas estão postando menos no feed do Instagram.

O motivo seria uma ruptura com a lógica mais básica de postagem na plataforma. Nos primeiros anos de funcionamento, o Instagram era um local que celebrava fotos espontâneas, não necessariamente bem produzidas. Pedaços do dia a dia de cada um.

Nesse contexto, seguir alguém na rede tinha um aspecto de sociabilidade. Queríamos ver o que amigos e familiares andavam fazendo e postando. Porém, essa proposta foi mudando pouco a pouco.

Bradley e Perelli apontam a chegada de recursos como filtros, hashtags e a possibilidade de salvar fotos de amigos como o início de tudo. Cada uma dessas funcionalidades, à sua maneira, mexia um pouco com aquela ideia inicial de espontaneidade.

Agora, na hora de postar, você começava a se fazer mais perguntas. Qual filtro usar para deixar essa foto mais bacana? Quais hashtags inserir na legenda para que outros usuários a encontrem? Não é que antes todo mundo fosse 100% despretensioso na hora de postar, mas agora a plataforma sugeria uma curadoria maior do que você compartilhava no feed.

O argumento das autoras é que o ambiente do feed acabou se tornando menos aberto a essas postagens mais naturais. E a chegada dos criadores de conteúdo e influencers à plataforma sacramentou essa tendência. O feed passava a ser dominado por fotos e vídeos super bem produzidos, onde a estética vale tanto ou até mais quanto o conteúdo.

Resultado: usuários comuns, pessoas que antes compartilhavam as clássicas fotos de comida, passam a postar menos. O conteúdo mais profissional é o que reina nos feeds, e aquele intento original de acompanhar familiares e amigos foi perdendo seu sentido.

Ou melhor: acabou indo para outros lugares.

Stories, DMs e aplicativos de mensagens

Voltemos a Adam Mosseri. No ano passado, em meio aos anúncios sobre mudanças no Instagram, o executivo compartilhou que usuários andavam usando mais os stories do que o feed para compartilhar fotos e vídeos. E que as DMs eram mais utilizadas que ambos para este fim.

Essa mudança na forma de usar o Instagram diz muito sobre o cenário mais amplo das redes sociais. Em primeiro lugar, conteúdos mais fragmentados e curtos (stories) são os que prendem os usuários; por outro, a sociabilidade se desloca do feed (curtidas, comentários) para espaços mais fechados (DMs).

Esse pode ter sido o destino de conteúdos mais simples, até mesmo bobos, que no passado talvez fossem parar no feed. Como comentamos no Tecnocast 304, muitos usuários não se sentem mais à vontade para postar esse tipo de coisa, já que todo o ambiente parece dominado por produções mais sérias e elegantes estas, sim, dignas de atenção e engajamento.

Assim, um meme é compartilhado por DM com um amigo ao invés de ir parar no feed. Ou então vai para grupos fechados em aplicativos de mensagens, como WhatsApp e Telegram, lugares mais “seguros” para esse tipo de conteúdo.

O que o Instagram se tornou, então? Uma hipótese presente no artigo da Business Insider é que, em sua atual fase, e ecoando o que acontece com o TikTok, o Instagram se tornou uma plataforma voltada para o entretenimento. O aspecto social da rede social não está mais no centro.

R.I.P. redes sociais?

Como o próprio título do texto já indica, Bradley e Perelli parecem enxergar no fenômeno uma evidência do que certos analistas entendem como a morte das redes sociais.

Esse discurso tem soado pelo menos desde o ano passado (chegamos a comentar a respeito em nossa retrospectiva de 2022 no Tecnocast). O entendimento é que, se uma rede não se propõe mais a privilegiar as interações humanas, o social se perde. Cria-se, então, outra coisa.

O tão citado algoritmo também integra esse novo contexto, com cada rede empurrando sobre seus usuários publicações de pessoas que eles não seguem na esperança de gerar mais engajamento. Basta olhar o TikTok: sequer é necessário seguir ou adicionar amigos para receber por algum tipo de conteúdo.

Ao tentar copiar esse modelo com o Reels, o Instagram confirmou que a mudança de paradigma. O que temos, portanto, são vídeos curtos sugeridos o tempo todo, e um feed lotado de belas fotos e vídeos super bem editados. Você vai querer mesmo postar essa foto de comida para todo mundo ver? Pense melhor. Ela é instagramável?

Podemos não gostar, mas o modelo de interações sociais parece estar dando lugar ao de transmissão. E, por mais que usuários estejam postando menos, a perspectiva para o Instagram não é ruim. Uma rede onde influenciadores se sentem em casa provavelmente irá atrair anunciantes.

Nossas fotos bacaninhas no feed podem ser até legais, mas, no fim do dia, não são elas que pagam a conta.

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Josué de Oliveira

Josué de Oliveira

Produtor audiovisual

Josué de Oliveira é formado em Estudos de Mídia pela UFF. Seu interesse por podcasts vem desde a adolescência. Antes de se tornar produtor do Tecnocast, trabalhou no mercado editorial desenvolvendo livros digitais e criou o podcast Randômico, abordando temas tão variados quanto redes neurais, cartografia e plantio de batatas. Está sempre em busca de pautas que gerem conversas relevantes e divertidas.

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