Seu relógio sabe muito sobre sua saúde. E agora?
Smartwatches são capazes de monitorar batimentos cardíacos, saturação de oxigênio e outros indicadores de saúde; mas qual é a serventia de todos esses dados?
Smartwatches são capazes de monitorar batimentos cardíacos, saturação de oxigênio e outros indicadores de saúde; mas qual é a serventia de todos esses dados?
Os wearables estão por todos os lados. Sejam nos ouvidos ou nos pulsos, estes dispositivos ganham cada vez mais popularidade, expandindo as possibilidades da tecnologia para além dos celulares. É o caso de smartwatches e pulseiras fitness que não apenas dão mais uma telinha, como também são aliados a quem se preocupa com a saúde e quer algo para acompanhar os seus exercícios no dia a dia.
E as histórias desses dispositivos não deixam a sua popularidade em vão. Já falamos sobre como esses relógios inteligentes podem salvar vidas em situações de emergência aqui no Tecnoblog. Mas e antes disso? Como eles podem nos ajudar a descobrir riscos à nossa saúde antes mesmo de os problemas virem à tona? E nos exercícios? Vem comigo e descubra as respostas para essas perguntas a seguir.
Antes de mais nada, é preciso entender o quão grande é a indústria de wearables. Segundo a consultoria IDC, só no primeiro trimestre de 2021, 104,6 milhões de relógios inteligentes, fones de ouvido sem fio e afins foram vendidos no mundo todo. O crescimento é de 34,4% em relação ao mesmo período do ano anterior, quando 77,8 milhões de unidades foram comercializadas.
A Apple é a grande “vencedora” dessa corrida, com 28,8% de participação de mercado. A companhia é responsável pelo Apple Watch, que ganhou duas opções novas no ano passado, sendo uma delas com oxímetro embutido. A Samsung, fabricante do Galaxy Watch 3, vem em segundo lugar, acompanhada pela Xiaomi, que comercializa a pulseira fitness Mi Band 6, na terceira colocação.
Os recursos desses relógios e pulseiras inteligentes variam. Em comum, o usuário geralmente conta com o contador de passos e os sensores para monitorar a sua frequência cardíaca. Mas, em alguns casos, esses dispositivos trazem algumas funções mais avançadas, como a opção de eletrocardiograma (ECG) do Apple Watch e do Galaxy Watch.
Alguns fones de ouvido também são voltados para a prática esportiva e ao bem-estar. Em julho de 2021, a Amazfit revelou o Amazfit PowerBuds Pro com sensores para monitorar os batimentos cardíacos. Mas o destaque do acessório fica mesmo pela detecção de ângulo sentado da coluna cervical, que avisa quando o usuário está sentado com uma postura ruim.
Além disso, estes não são os únicos dispositivos capazes de monitorar a saúde. Ainda que não seja um vestível, a G-Tech comercializa um medidor de glicose capaz de transmitir os dados de testes glicêmicos para o celular. A Omron também conta com uma linha de produtos com a mesma proposta, como um monitor de pressão arterial de pulso e uma balança. A conexão com o smartphone é feita via Bluetooth em todos os casos.
A aplicação desses dispositivos no dia a dia depende do interesse dos consumidores. Mas há quem aproveite as ferramentas dos relógios inteligentes para, além de receber notificações e afins, ficar mais atento ao seu bem-estar. É o caso de Matheus Leone, cientista político de 28 anos, que utiliza um Samsung Galaxy Watch Active 2 no dia a dia.
Além de concentrar somente as notificações mais importantes no wearable, Matheus acompanha as informações sobre batimentos cardíacos e de estresse. De vez em quando, Leone também faz eletrocardiogramas pelo relógio. Mas são os dados sobre o sono que ganham destaque no cotidiano do cientista político, pois costuma a ser um indicativo para saber quando não está dormindo bem e de que pode estar agitado.
“Somando isso com os dados de estresse que o relógio tem, às vezes eu consigo parar e pensar: ‘não, estou muito agitado, estou muito estressado, agora eu preciso dar uma relaxada'”, disse. “Eu uso muito para isso”.
O Tecnoblog conversou com o coordenador do setor de arritmias e estimulação cardíaca dos hospitais Pró-Cardíaco e Samaritano de Botafogo, Dr. Eduardo Saad. Para ele, os smartwatches podem ser bons aliados neste assunto, especialmente devido à capacidade de se descobrir algum problema de saúde de maneira mais ágil. “A tecnologia evoluiu de uma forma que, hoje, é possível [utilizar] algumas formas de monitoração que antes eram impensáveis”, explica.
O médico explica que estes dispositivos podem ajudar a antecipar um diagnóstico de algo que está acontecendo de maneira assintomática no corpo do usuário, por exemplo. Saad ainda demonstrou a utilidade da função para fazer eletrocardiogramas do Apple Watch para beneficiar a saúde dos usuários.
É o caso de uma arritmia cardíaca conhecida como fibrilação atrial, uma das maiores causas de AVC e derrame cerebral para quem tem mais de 70 anos. Segundo o coordenador, este tipo de arritmia tem uma prevalência esperada na população de 2%. O número, porém, pode subir para 4% ou 5% na faixa etária acima dos 70 anos. E é aí que entra o papel dos wearables, que podem ajudar a adiantar um tratamento antes de algum tipo de incidente.
“Quando você começa a entender que 1/3 das pessoas têm isso de maneira assintomática – ou seja, ele não sabia que tinha e o relógio avisa –, você pode tomar medidas preventivas e fazer um tratamento antes de acontecer o evento clínico”, concluiu. “Esse é um exemplo claro, muito potente, de como essa tecnologia está fazendo a gente repensar os nossos princípios anteriores”.
Os wearables também contemplam recursos para acompanhar atividades físicas, o que pode beneficiar atletas de diversas modalidades. Para utilizar estas ferramentas, a jornalista Luana Vitória Ucha, de 23 anos, possui um Garmin Forerunner 45, além de outro dispositivo da mesma marca para a sua bicicleta. Ela conta que adquiriu o relógio pois precisava gerar mais dados sobre seus exercícios quando fazia triatlo em 2018.
“Era importante analisar como é que eu estava, ver o meu desempenho”, disse. “Eu sabia que só com o relógio normal não bastaria”.
Luana explicou que utiliza os dados do relógio, apresentados no app Garmin Connect, para acompanhar o seu desempenho em atividades físicas. É o caso do indicador de VO2 máximo, que estima a quantidade máxima de oxigênio captada em uma corrida, por exemplo. Os detalhes sobre o sono também ajudam a informar sobre a sua recuperação após um período de repouso.
“Se eu me sinto cansada, às vezes pego esses gráficos [com dados gerados pelo relógio] e vejo: ‘ah, aqui está explicando porque eu estou me sentindo cansada’, porque dá para ver, de fato, o quanto de esforço você faz”, conta. “Pelo menos, para mim, funciona bastante”.
O diretor técnico da Bodytech, Eduardo Netto, conta ao Tecnoblog que esses equipamentos podem ser úteis principalmente para controlar a intensidade do exercício, já que ajuda a garantir eficiência nas atividades físicas. Além disso, os wearables também são capazes de motivar o usuário a se movimentar.
“É uma ferramenta não só motivadora e engajadora para o cliente, mas para o profissional, também, que está orientando e pode prescrever uma modalidade de exercício mais adequada”, disse.
Entre os dados mais relevantes obtidos pelos wearables, está a frequência cardíaca. O diretor da rede de academias explica que este indicador pode mostrar se a pessoa está treinando com a intensidade adequada ou não. Além disso, também é possível aferir o gasto calórico. O contador de passos é outra ferramenta que merece destaque, pois auxilia quem quer melhorar a saúde e perder peso.
A frequência cardíaca de repouso também requer atenção, pois ajuda a encontrar sinais de sobrecarga. Netto explica que, se a frequência cardíaca de repouso de uma pessoa é de 60 batimentos por minuto (bpm) e o indicador sobe para 65 bpm ou 70 bpm por três dias consecutivos, é sinal de que não há repouso suficiente. “Quanto mais bem treinado você está, a sua frequência de repouso tende a ser mais baixa”, explicou.
Os dados dos relógios inteligentes e pulseiras fitness não precisam ficar restritos aos celulares de seus proprietários. Além de apurá-los, no geral, as plataformas também oferecem meios para compartilhá-los com outras pessoas. Estas informações podem ser repassadas tanto para médicos quantos para treinadores, por exemplo.
Luana Vitória Ucha conta que já encaminhou estes dados a um treinador e a um médico. “Eu acho que é uma ótima ferramenta para você acompanhar, por exemplo, exames de sangue”, disse. “Você tem ali todos os exames todos certinhos. E se tem alguma coisa que, talvez, não esteja como deveria estar, você pode apresentar esses dados, mostrando ‘olha, mas quando eu estou correndo, meu coração chega a tal’, para um cardiologista”.
Matheus Leone também já apresentou os dados de seu Galaxy Watch Active 2 a um cardiologista. “É lógico que um eletrocardiograma feito numa clínica vai ser muito melhor do que um eletrocardiograma feito num relógio, mas pode te dar alguma noção se tiver algo muito fora do padrão”, disse. “Por exemplo, se ele estiver registrando arritmias constantes, então, é possível que tenha um problema a ser investigado mais a frente”.
Ele também relatou um episódio de febre ocorrido no ano passado, quando o seu smartwatch avisou que seus batimentos cardíacos ficaram elevados por alguns minutos. “Esse tipo de alerta pode ajudar a identificar alguns problemas que às vezes você nem sabe que tem”, relatou. “Às vezes, o seu batimento é rápido e você nem sabe. Ou seu estresse é muito alto e você não sabe. E o relógio talvez te ajude a identificar um problema que você não sabe que tem”.
As tecnologias empregadas nestes dispositivos são inovadoras e evoluem cada vez mais. No começo do ano, por exemplo, falava-se sobre uma possível implementação de um medidor de glicose na próxima geração de relógios da Apple, solução que ainda não está presente em nenhum smartwatch da atualidade. Mas será que dá para confiar completamente nestes recursos? Ou será que é preciso fazer alguma ressalva antes de tirar conclusões a partir destes dados?
O Tecnoblog entrou em contato com algumas fabricantes para responder estas perguntas. A Samsung informou que as informações encontradas, obtidos ou acessados por meio do Samsung Health Monitor “são disponibilizadas apenas para a comodidade do usuário e não podem ser consideradas como orientação médica”. A mesma observação é encontrada no site de outras fabricantes, como a Apple e a Xiaomi, em relação aos dados do oxímetro, por exemplo.
A Garmin segue o mesmo tom. A empresa afirmou ao Tecnoblog que as informações fornecidas pelos seus wearables “têm o objetivo de ser uma estimativa aproximada de sua atividade e métricas monitoradas, mas podem não ser precisamente precisos”. Eles também reforçaram que os dispositivos “não são dispositivos médicos e os dados fornecidos por eles não se destinam a ser utilizados para fins médicos e não se destinam a diagnosticar, tratar, curar ou prevenir qualquer doença”.
“Os recursos de monitoramento de saúde e bem-estar encontrados nos smartwatches Garmin podem apoiar os esforços para melhorar e manter sua saúde, mas não se destinam a substituir os cuidados médicos”, explicaram. A fabricante também disponibiliza uma página com informações sobre a precisão das métricas de seus dispositivos: garmin.com.
Mas isto não significa que os dados devem ser deixados de lado, muito menos descartados. De acordo com o Dr. Eduardo Saad, um estudo conhecido como Apple Heart Study, feito com pessoas monitoradas por um Apple Watch, mostrou que mesmo a versão antiga do relógio, sem eletrocardiograma, era capaz de ter uma boa acurácia no diagnóstico. Mas o coordenador do setor de arritmias e estimulação cardíaca dos hospitais Pró-Cardíaco e Samaritano de Botafogo faz uma ressalva.
“O relógio é muito bom. O algoritmo dele foi desenhado para não perder episódios de fibrilação”, disse. “O que eu estou querendo dizer é: quando ele fala que não tem nada, é excelente. Mas quando ele fala que tem arritmia, a revisão daquele eletro[cardiograma] por um médico é fundamental, porque tem outras alterações nos batimentos que causam irregularidade que às vezes ele classifica como fibrilação para não perder”.
O diretor da Bodytech segue na mesma linha. Para Eduardo Netto, estas informações podem ser utilizadas como um sinal de alerta. “O objetivo não é diagnóstico”, disse Eduardo Netto. “Mas, talvez, se você está usando o oxímetro, e ver que a sua capacidade de absorver oxigênio está baixa, acho que é um sinal de alerta para você fazer um check-up ou procurar o seu médico”.
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