Após caso Fox, ouvidoria da Anatel diz que lei da TV paga precisa mudar
Anatel decidiu que Fox não pode vender canais ao vivo pela internet; medida cautelar prevê multa diária de R$ 100 mil
Na semana passada, a Anatel decidiu que a Fox não pode vender canais ao vivo pela internet através de seu serviço de streaming Fox+, por acreditar que isso viola a lei da TV paga (SeAC). A medida cautelar prevê multa diária de R$ 100 mil, limitada a R$ 20 milhões, em caso de descumprimento. A ouvidoria da Anatel defende a decisão da agência, mas diz que a lei “se tornou obsoleta e precisa ser alterada”.
A lei do SeAC (serviço de acesso condicionado) foi sancionada em 2011 para regulamentar o mercado de TV paga. Ela prevê que empresas como a Fox e a Globo só podem vender canais lineares — ou seja, com uma programação contínua — através de uma operadora de TV por assinatura. Conteúdo on-demand e streaming ficam fora dessa lei porque não são canais lineares.
Ou seja, a Fox pode tranquilamente oferecer streaming de séries, filmes e eventos esportivos. Mas, no momento em que passa a transmitir canais ao vivo, ela encontra o obstáculo da lei do SeAC.
Ouvidoria da Anatel apoia decisão e critica lei
A ouvidoria da Anatel apoia a medida cautelar contra a Fox, decidida pela área técnica da agência. O ouvidor Thiago Botelho lembra em comunicado que as áreas técnicas têm como missão preservar a lei, e o serviço Fox+ poderia estar burlando a lei do SeAC ao fazer venda direta de canais ao vivo pela internet.
No entanto, Botelho acredita que essas regras devem mudar: “a lei se tornou obsoleta e precisa ser alterada, mas até lá a Anatel não pode deixar de fazer com que ela seja cumprida”, explica o ouvidor em nota. “A legislação estabelece barreiras injustificadas à livre concorrência em prejuízo ao consumidor, mas a cautelar preserva o modelo de competição que a lei criou.”
Botelho continua: “a lei é atrasada, restringe a competição, impede novos negócios e limita a liberdade de escolha dos consumidores. Ou seja, está na contramão da realidade internacional”.
Lei da TV paga “morreu” e Anatel tenta mudá-la
Em termos técnicos, a lei do SeAC proíbe a propriedade cruzada entre conteúdo e distribuição. A ideia é impedir a concentração verticalizada, ou seja, evitar que canais da Globo só sejam distribuídos pela Globo; canais da Fox sejam vendidos apenas pela Fox; e assim vai.
No entanto, essa já é uma tendência no mercado de streaming há alguns anos: a Netflix produz séries originais e as distribui com exclusividade por streaming, assim como o Amazon Prime Video e Hulu; o Disney+ fará o mesmo quando for lançado em novembro.
Essa prática também vem aparecendo em canais de TV: a Globo oferece o Combate Play e o Premiere Play sem vínculo com operadoras; e a ESPN, da Disney, tem o WatchESPN.
O advogado Marcos Bitelli, especializado em comunicações, disse em dezembro ao Convergência Digital que a lei do SeAC “morreu”, e que não é adequada ao cenário atual por tentar dividir setores — operadoras, internet e TV— que estão cada vez mais interligados.
A Anatel está trabalhando para que a lei do SeAC seja alterada. O presidente da agência, Leonardo de Morais, enviou em abril uma carta ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), pedindo para “revisitar as limitações” do controle cruzado entre operadoras de TV paga e programadoras de conteúdo.