Mídia impressa abraça o iPad. E os leitores?
O iPad demorou para chegar oficialmente no Brasil, mas quando estreou, foi recebido com festa pelos macmaníacos e, principalmente, pelos grandes veículos de comunicação.
A mídia tradicional impressa tem um interesse muito grande no tablet da Apple. A brasileira também. Isso ficou às claras quando, na semana em que o grande destaque da imprensa mundial eram as fofocas diplomáticas espalhadas pelo WikiLeaks, duas das principais revistas semanais brasileiras preferiram estampar o iPad em suas capas.
A Veja aproveitou o lançamento para publicar uma grande reportagem de capa destacando o produto, que merecidamente já foi capa de muitas outras publicações no mundo todo. Sabemos que a imprensa escrita passa por uma crise, e, pela primeira vez, avista-se no fim do túnel uma esperança para transformar a informação digital em algo outra vez rentável. Na era digital, ninguém estava mais interessado em pagar por conteúdo, até nascerem o iPhone, o iPad e as cifras astronômicas da App Store.
Mesmo antes do iPad desembarcar no Brasil, Veja e Época já haviam lançado a versão eletrônica de sua revista, a exemplo do que fizeram algumas publicações internacionais. Iniciativas que se revelaram um sucesso. As assinaturas parecem estar ressucitando.
A sanha em promover a versão eletrônica da Veja foi tão grande que a matéria se empenhou em mostrar como o aparelho é revolucionário, o sucesso nas vendas e exemplos de alguns fãs brasileiros de carteirinha. Confesso que fiquei frustrada, pois sabemos como a revista gosta de levantar polêmicas e escancarar nossas feridas políticas e econômicas – essa seria uma grande chance para suscitar uma discussão em cima de nossa absurda carga tributária. Mas não: a Veja preferiu focar nos aspectos positivos, enaltecendo a genialidade de Steve Jobs e mostrando as inúmeras ferramentas que fazem do tablet um canivete suíço de informação, cultura e diversão.
Os impostos são um dos grandes vilões da democratização do conhecimento e do progresso no país, uma vez que é implacável com equipamentos e serviços de telecomunicações. Só me restou lamentar que uma revista tão influente, popular – e por que não, belicosa – tratasse do problema como algo menor, parecendo mais preocupada em assanhar o consumismo dos leitores para vender mais exemplares digitais.
A Folha de São Paulo também está empolgada com os tablets, tanto que lançou versões eletrônicas tanto para o iPad quanto o Galaxy Tab. Eu entendo a empolgação desses grandes veículos frente à possibilidade de tirar a informação online do vermelho, mas às vezes eles exageram. Eu quase caí da cadeira quando li um artigo do Clóvis Rossi, defensor do jornalismo tradicional e um tanto avesso às novas tecnologias, defendendo o iPad. Soou excessivamente parcial.
Resta saber se a excitação da grande mídia contaminará os leitores. Como sempre, foi dado grande destaque jornalístico ao início das vendas do iPad, com festas badaladas à meia-noite e fotos dos primeiros compradores, algo que parece ter virado moda. Mas depois disso, a impressão é que o tablet “esfriou”. Tive a oportunidade de passar em 3 grandes lojas de Curitiba antes do Natal, e em todas, havia iPad sobrando – de todos os modelos e capacidades de armazenamento. Embora as pessoas fizessem fila para experimentar a novidade, isso não estava se refletindo em vendas, segundo os desanimandos vendedores. Minha impressão é que quem queria o iPad já deu um jeito de comprar ou mandar trazer de fora. O preço aqui é, realmente, de espantar até assombração.
Quem mais sai perdendo com isso são os próprios publishers, que deixaram de lado uma excelente oportunidade de exigir uma tributação mais justa sobre aquele que pode ser seu salvador.