Justiça obriga Uber a contratar motoristas pela CLT e pagar R$ 1 bi em danos morais

Decisão emitida por juiz do TRT reconhece vínculo trabalhista entre Uber e motoristas; empresa informou que recorrerá da decisão e que não adotará medidas

Felipe Freitas
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Uber
4ª Vara do Trabalho obriga Uber a contratar motoristas "pela CLT" (Imagem: Vitor Pádua/Tecnoblog)

A 4ª Vara do Trabalho de São Paulo julgou que a Uber é obrigada a reconhecer o vínculo empregatício com motoristas do aplicativo. A decisão exige que a empresa contrate todos os motoristas que utilizam sua plataforma. A 4ª Vara ainda multou a Uber em R$ 1 bilhão por danos morais coletivos.

O juiz Maurício Pereira Simões, responsável pela sentença, explicou em sua decisão que a Uber “sonegou direitos mínimos, deixou colaboradores sem proteção social e agiu dolosamente no modo de se relacionar com seus motoristas”. A empresa tem até seis meses após o trânsito em julgado (quando esgotar todos os recursos) para assinar a carteira de trabalho de todos os motoristas

Essa interpretação do vínculo entre a Uber e seus motoristas é mais um capítulo na batalha jurídica da empresa no Brasil, que enfrenta diferentes visões sobre a relação empregatícia com os motoristas desde que chegou ao país, em 2014. A maioria delas negou o vínculo, mas não há uma decisão uniforme do Tribunal Superior do Trabalho (TST) ou uma legislação sobre o tema.

O Tiago Alvarenga Caravela, advogado do escritório Benício Advogados Associados, explicou porque a decisão da Justiça do Trabalho de São Paulo tem efeitos sobre todo o território nacional.

“Na hipótese da Ação Civil Pública movida contra a Uber, o Ministério Público do Trabalho, autor da ação, alegou a existência de vínculo de emprego entre a Uber e os Motoristas, sem o devido registro da carteira de trabalho e previdência social, em todo o território nacional, motivo pelo qual a ação foi distribuída na sede do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (São Paulo/SP), e a sentença adotada na ação abrange todas as relações entre a Uber e os motoristas em território nacional”, Tiago Alvarenga Caravela

Uber informou que recorrerá da decisão

Em nota recebida pelo Tecnoblog, a Uber informou que recorrerá da decisão. A empresa disse ainda que não adotará nenhuma das medidas da sentença (como pagar multa ou iniciar a contratação dos motoristas por CLT) até que “todos os recursos cabíveis sejam esgotados”.

“A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 4ª Vara do Trabalho de São Paulo e não vai adotar nenhuma das medidas elencadas na sentença antes que todos os recursos cabíveis sejam esgotados”

Na nota, a Uber diz que a decisão “representa um entendimento isolado”, citando decisões do TRT, STF e do Tribunal Superior do Trabalho. Porém, não há unanimidade no TST: a 3ª e 8ª Turmas do TST já votaram pelo reconhecimento de vínculo. No total, houve votações sobre o tema em quatro de oito turmas desse tribunal.

A Uber também citou no texto o decreto 11.513 de 2023, que institui a criação de um grupo de trabalho “com a finalidade de elaborar proposta de regulamentação das atividades executadas por intermédio de plataformas tecnológicas”, que visa também definira natureza jurídica do serviço de motorista de aplicativo.

Novela da Uber já virou uma Soap Opera

Uber Black (Imagem: Divulgação/Uber)
Debates sobre a relação do trabalho entre Uber e motoristas existe desde 2014, quando empresa chegou no Brasil (Imagem: Divulgação/Uber)

As “batalhas jurídicas” da Uber no Brasil deixaram de ser uma “novela” e viraram uma “soap opera”. Enquanto uma novela dura alguns meses, as soap operas duram anos. Desde que entrei no jornalismo de tecnologia em 2021, escrevi algumas notícias sobre o tema.

No ano passado, o Tecnoblog publicou sobre as discordâncias da Justiça do Trabalho em relação ao vínculo trabalhista entre Uber e motoristas parceiros. Alguns tribunais de instâncias inferiores julgaram ações favoráveis aos motoristas, enquanto outros negaram a relação.

No TST, a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) é o órgão responsável por uniformizar a jurisprudência do Tribunal. Todavia, a SDI-1 ainda não terminou a análise sobre esse vínculo. Enquanto isso, segue a soap opera.

Mozar Carvalho, sócio-fundador do escritório Machado Carvalho, explicou porque não há unanimidade nas decisões:

A diferença de uma decisão da Vara de Trabalho de São Paulo e decisão do TST é que a da Vara vincula somente aquele processo, aquele reclamante, aquele motorista do Uber que foi diretamente pedir vínculo empregatício. Já a decisão do TST, dependendo das circunstâncias que foi dada, se for uma decisão em ação coletiva de motoristas de Uber ou de uma associação de motorista de Uber, ela pode vincular a todo o território nacional. Porém, a tendência é que se foi uma decisão no TST vinculado a um processo específico, vincula só aquele processo.

Leia a resposta da Uber

“A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 4ª Vara do Trabalho de São Paulo e não vai adotar nenhuma das medidas elencadas na sentença antes que todos os recursos cabíveis sejam esgotados. 

Há evidente insegurança jurídica, visto que apenas no caso envolvendo a Uber, a decisão tenha sido oposta ao que ocorreu em todos os julgamentos proferidos nas ações de mesmo teor propostas pelo Ministério Público do Trabalho contra plataformas, como nos casos envolvendo Ifood99Loggi e Lalamove, por exemplo.

A decisão representa um entendimento isolado e contrário à jurisprudência que vem sendo estabelecida pela segunda instância do próprio Tribunal Regional de São Paulo em julgamentos realizados desde 2017, além de outros Tribunais Regionais e o Tribunal Superior do Trabalho.

A Uber tem convicção de que a sentença não considerou adequadamente o robusto conjunto de provas produzido no processo e tenha se baseado, especialmente, em posições doutrinárias já superadas, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal.

Na sentença, o próprio magistrado menciona não haver atualmente legislação no país regulamentando o novo modelo de trabalho intermediado por plataformas. É justamente para tratar dessa lacuna legislativa que o governo federal editou o Decreto Nº 11.513, instituindo um Grupo de Trabalho “com a finalidade de elaborar proposta de regulamentação das atividades executadas por intermédio de plataformas tecnológicas”, incluindo definições sobre a natureza jurídica da atividade e critérios mínimos de ganhos financeiros.

No comunicado, a Uber também enviou uma parte sobre a jurisprudência. Optamos por não publicar por já falarmos sobre outros julgamentos ao longo da notícia.

Com informações: O Globo

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Felipe Freitas

Felipe Freitas

Repórter

Felipe Freitas é jornalista graduado pela UFSC, interessado em tecnologia e suas aplicações para um mundo melhor. Na cobertura tech desde 2021 e micreiro desde 1998, quando seu pai trouxe um PC para casa pela primeira vez. Passou pelo Adrenaline/Mundo Conectado. Participou da confecção de reviews de smartphones e outros aparelhos.

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