Precisamos tomar cuidado com o “Dr. Google”
Pesquisar na internet sobre problemas de saúde é uma prática comum, mas que não deve substituir o médico
Uma dor de cabeça duradoura, uma mancha na pele, um desconforto abdominal, enfim, quando você nota alguma coisa estranha, logo pesquisa pelos sintomas no Google, estou certo? Esse comportamento é comum e não representa nada proibitivo. Mas você precisa ter cuidado: dependendo do assunto pesquisado, você pode acabar tendo preocupações desnecessárias ou, pior, tratar como insignificante um problema potencialmente sério.
O corpo humano é uma máquina complexa que, por consequência, está sujeita a diversos tipos de “falhas”. Além disso, diariamente seu sistema imunológico trava batalhas para defender o seu corpo de vírus, bactérias e outros agentes nocivos. Eventualmente, uma batalha é perdida. Aí o seu organismo começa outra para expulsar o invasor. Os sinais dessa luta podem aparecer como dor de cabeça, cansaço, febre, diarreia e por aí vai.
Se os sintomas forem conhecidos e indicarem um resfriado, por exemplo, provavelmente você não se preocupará. Você sabe que dentro de alguns dias estará curado. Mas, no caso de um problema até então inédito ou que não some com o passar dos dias, talvez você não resista ao impulso de pesquisar pelos sintomas no Google, mesmo que já tenha marcado consulta no médico.
Por que procuramos o “Dr. Google”?
Há várias razões que explicam esse comportamento. Uma delas é a conveniência. Muita gente se habituou a fazer pesquisas online para resolver todo tipo de problema ou simplesmente para se informar melhor sobre diversos assuntos. Com tamanha praticidade, não há razão para o mesmo não ser feito em relação à saúde.
Mas existe também o fator ansiedade. Há pessoas que tendem a se preocupar com mais facilidade e, portanto, pesquisam na internet para identificar a gravidade de um problema. Para esse perfil, muitas vezes a preocupação não está necessariamente nas limitações resultantes — uma dor no joelho que atrapalha a caminhada, por exemplo —, mas no temor de que o problema represente algo mais grave, como um tumor. Nessas circunstâncias, a pesquisa online pode ser uma forma de descartar logo essa preocupação.
Outra causa é a dificuldade de atendimento. Todo mundo sabe que nos serviços públicos de saúde a marcação de consultas ou mesmo de um simples exame pode demorar meses. Até nos planos de saúde não são raras as queixas de usuários sobre a dificuldade de marcar consultas dentro de um prazo razoável.
Junte a esse cenário outro problema bastante comum: quando a pessoa finalmente consegue uma consulta, acaba se deparando com um atendimento médico apressado, frio e que sequer dá margem para esclarecimento de dúvidas. Muitas vezes o médico mal olha para o paciente. A tentativa de escapar dessas experiências desagradáveis também faz o “Dr. Google” ser muito requisitado.
Os perigos de buscar informações médicas na internet
Todo site sério sobre saúde ressalta, de uma forma ou outra, que as informações contidas ali não substituem uma consulta médica. Aqui mora o principal problema das pesquisas na internet: as informações acerca de uma condição de saúde ou doença disponíveis online muitas vezes são tratadas como diagnóstico pelo usuário.
A pessoa lê as informações, se identifica com os sintomas descritos e, por conta disso, acredita que a condição ou enfermidade abordada ali corresponde ao seu caso. Isso é perigoso porque estimula uma prática que, infelizmente, é muito comum: o da automedicação.
Suponha, por exemplo, que você esteja com dor de garganta. Você faz uma pesquisa na internet, descobre que o problema pode ser uma infecção bacteriana e decide tratá-lo com antibiótico. Só que a dor de garganta também pode ter origem viral ou ser sintoma de um quadro alérgico. Nessas circunstâncias, o antibiótico não tem efeito benéfico, pelo contrário: pode causar problemas por conta de efeitos colaterais ou de reações alérgicas inesperadas.
Mas talvez o aumento do estresse ou da ansiedade seja o problema mais frequente. Com uma simples busca, a pessoa descobre que aquele sintoma está associado a um tipo de câncer ou a um problema cardíaco sério, só para exemplificar.
Apavorada, essa pessoa pode não conseguir dormir, ter problemas psicossomáticos ou mesmo entrar em um ciclo vicioso: ficar horas e horas pesquisando sobre o sintoma, inclusive em sites voltados para a comunidade médica, o que acabará alimentando ainda mais a ansiedade em vez de trazer alívio. Só mais tarde, no médico, é que ela percebe que não precisava ter se preocupado tanto.
É preciso ficar atento quanto a isso: buscas na internet sobre saúde são extremamente comuns, por isso, muitos sites potencializam a gravidade de determinados problemas porque essa é uma forma de prender o visitante em suas páginas. Como se não bastasse, o conteúdo desses sites pode não ter sido elaborado por especialistas, resultando em informações incorretas.
Convém considerar ainda que a interpretação da informação, mesmo quando esta é correta, também pode causar ansiedade. Se você pesquisar por “dor de cabeça”, descobrirá que o problema pode ter várias causas, desde um simples quadro de tensão até um tumor no cérebro. O problema é que muita gente acaba se prendendo às possibilidades mais catastróficas, ainda que elas sejam muito menos frequentes.
Informações imprecisas ou interpretações equivocadas também podem ter efeito contrário: fazer a pessoa acreditar que determinado sintoma não é algo que requer atenção.
É melhor parar de pesquisar sobre saúde, então?
Diante de tudo isso, pesquisar na internet sobre sintomas e condições médicas soa como uma prática abominável, né? Mas não é assim. Basta termos em mente que páginas com temática médica servem para nos deixar informados, não para diagnósticos. Nesse sentido, elas podem inclusive assumir o importante papel de divulgar informações preventivas e a necessidade de fazermos determinados tipos de exames regularmente, por exemplo.
Temos que considerar, porém, que por mais que uma página sobre saúde seja detalhada e precisa, ela não consegue reproduzir os efeitos de uma consulta médica. Essas páginas precisam ser generalizadas, mas cada pessoa é diferente da outra, logo, deve ser tratada de forma individualizada. A avaliação física é importantíssima nessas circunstâncias. É por essa razão que o Conselho Federal de Medicina proíbe atendimentos feitos exclusivamente pela internet.
Para oferecer atendimento individualizado, o médico faz uma série de perguntas ao paciente (anamnese), realiza avaliações físicas e, se achar necessário, pede testes clínicos ou exames de imagem. Com base nessas informações e nas descrições dos sintomas é que o tratamento é definido. Nesse ponto, a experiência do médico conta muito. Novamente, nenhum site consegue reproduzir isso.
Nesse contexto, as pesquisas online contribuem para que você possa compreender melhor o que se passa e, eventualmente, estar mais preparado para discutir o assunto com o médico. Se você ficar inseguro sobre o que foi recomendado ou achar que o atendimento não correspondeu às expectativas, convém procurar outro médico, se possível, mas nunca chegar a conclusões próprias.
Só fontes confiáveis
Se é para se manter bem informado, que seja a partir de sites confiáveis, obviamente. Para encontrá-los, a dica é dar preferência a páginas ligadas a hospitais de referência, a organizações especializadas e a médicos com boa reputação. Deve-se ter cautela com fóruns e redes sociais porque nem sempre as informações presentes ali servem para você. Já páginas com dados escassos e escrita ruim, bom, simplesmente evite-os.
Felizmente, o próprio Google vem dando uma forcinha para encontrarmos informações de saúde confiáveis. Graças a uma parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein, o buscador exibe desde março no Brasil cards com informações verificadas sobre diversas doenças e condições, como enxaqueca, catapora, gripe, conjuntivite, arritmias cardíacas, diabetes e por aí vai.
Ter cuidado com a fonte de pesquisa não é exagero. O Google e outros buscadores usam uma combinação de numerosos critérios de classificação para listar páginas, mas isso não significa que os primeiros resultados são os mais confiáveis.
Mas lembre-se de que a palavra final é sempre do médico. É verdade que, para muita gente, não é fácil conseguir atendimento na rede pública e, não raramente, o atendimento dos profissionais nos serviços particulares deixa a desejar. Mas chegar a conclusões com base no que há na internet pode ser tão arriscado quanto não procurar atendimento. No final das contas, o bom senso continua valendo.