O engenhoso plano da Dell para voltar à bolsa de valores e reduzir dívidas

A companhia vai voltar a ter capital aberto, mas de um jeito que ainda deixa Michael Dell no comando

Emerson Alecrim
• Atualizado há 3 meses

Cincos anos se passaram desde que a Dell decidiu fechar o seu capital, mas, em breve, tudo pode mudar: nesta semana, a companhia confirmou o plano de voltar a negociar as suas ações na bolsa. O processo não vai ser feito por meio de uma oferta inicial de ações (IPO), porém.

Atualmente, 72% das ações da Dell estão nas mãos de Michael Dell, fundador e líder da companhia. Outra parte significativa, de 24%, pertence à Silver Lake, uma empresa de private equity, ou seja, que investe prioritariamente em companhias não listadas nas bolsas. Com a abertura de capital, ambos os lados esperam que a Dell consiga diminuir a dívida que acumula desde a compra da EMC, em 2015.

Não é uma dívida pequena. A Dell gastou cerca de US$ 25 bilhões quando fechou o seu capital. Some esse montante ao valor desembolsado para a aquisição da EMC: US$ 67 bilhões. De lá para cá, a companhia já repassou alguns bilhões de dólares, mas a dívida continua alta: algo próximo de US$ 53 bilhões.

Voltando à bolsa de valores, mas de um jeito incomum

A nova fase vai ser viabilizada com uma manobra complexa. A Dell não pretende participar de uma IPO porque esse processo pode fazer, entre outras obrigações, com que a companhia tenha que dar explicações sobre a situação da sua dívida, o que pode afastar investidores em potencial. A saída vai ser usar papéis da VMware.

Neste ponto, vale frisar que a EMC era dona de mais de 80% da VMware, uma das mais conhecidas empresas de virtualização do mercado. Consequentemente, a aquisição da EMC fez a Dell se tornar detentora da maior parte da VMware.

Pois bem, a VMware possui duas variedades de ações: 18% são convencionais, enquanto os 82% restantes são tracking stocks, tipo de ação que representa uma divisão ou segmento de uma empresa. Com tracking stocks, a companhia pode acompanhar o desempenho da divisão separadamente, em vez de incluí-la na performance de suas operações como um todo.

Identificadas como DVMT, as ações tracking stocks da VMware foram criadas justamente para ajudar a financiar a compra da EMC. Os investidores desta foram pagos com uma parte em dinheiro e outra em ações DVMT.

Basicamente, o que a Dell vai fazer é propor a compra dessas ações tracking stocks. Haverá duas opções de pagamento. Uma é o dinheiro: a Dell vai destinar até US$ 9 bilhões para esse fim de um montante que receberá por sua participação na VMware. Cada investidor que optar por dinheiro receberá US$ 109 por ação DVMT — atualmente, um papel do tipo vale pouco mais de US$ 90 (e valia cerca de US$ 85 na semana passada).

A outra opção de pagamento são ações da própria Dell classificadas como classe C. Elas foram criadas recentemente. O investidor que escolher essa opção receberá 1,36 ação do novo tipo para cada papel DVMT.

O que torna as ações classe C interessantes aqui é que elas poderão ser negociadas na Bolsa de Valores de Nova York. É assim que a Dell vai voltar a ser uma companhia de capital aberto.

Um plano bem orquestrado

Esse é um plano complexo, mas bem orquestrado. Uma IPO é muito mais do que uma estreia na bolsa. As companhias que a fazem geralmente usam a primeira operação de venda pública de ações para obter dinheiro para sustentar as suas operações ou pagar os acionistas anteriores.

Não raramente, uma IPO exige que um volume considerável de ações seja colocado à venda para levantar uma quantidade expressiva de dinheiro. Além disso, é necessário seguir alguns procedimentos que ajudam a proteger os novos investidores, mas que podem tornar todo o processo mais complicado, como obter financiamentos para trazer mais segurança ao negócio (em troca de aumentar a dívida).

Porém, a Dell não está fazendo uma IPO. De modo geral, a manobra é só uma troca de ações tracking stocks por papéis que podem ser negociados na bolsa. Com isso, Michael Dell e Silver Lake continuarão tendo controle substancial da companhia.

Michael Dell deverá deter entre 47% e 54% das ações da Dell após o processo, enquanto a Silver Lake ficará com algo entre 16% e 18%. Já os donos de ações classe C terão entre 21% e 31% da companhia.

No fim das contas, a Dell gastará quase US$ 22 bilhões com a compra de ações DVMT (incluindo aqui os US$ 9 bilhões citados anteriormente) e a troca destas por papéis classe C. Mas, se tudo der certo, a operação fará o patrimônio da companhia variar entre US$ 60 bilhões e US$ 70 bilhões. A negociação na bolsa deve ajudar na valorização das ações e, assim, permitir que a Dell obtenha capital para liquidar a sua dívida mais rapidamente.

É um plano que vai depender principalmente dos atuais acionistas. Mas como Michael conseguiu tirar a Dell da fase negra ocasionada pela queda da demanda no mercado de PCs, são grandes as chances de que a maioria dos investidores não veja problemas em deixar o executivo no controle e tope receber as ações negociáveis.

Com informações: Bloomberg, Fortune, Telecompaper.

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Emerson Alecrim

Emerson Alecrim

Repórter

Emerson Alecrim cobre tecnologia desde 2001 e entrou para o Tecnoblog em 2013, se especializando na cobertura de temas como hardware, sistemas operacionais e negócios. Formado em ciência da computação, seguiu carreira em comunicação, sempre mantendo a tecnologia como base. Em 2022, foi reconhecido no Prêmio ESET de Segurança em Informação. Em 2023, foi reconhecido no Prêmio Especialistas, em eletroeletrônicos. Participa do Tecnocast, já passou pelo TechTudo e mantém o site Infowester.