Um longo rastro de concorrentes deixados para trás
Há produtos tão dominantes que é difícil imaginar um momento em que não estiveram no topo, mas essa época existiu — e não faz tanto tempo assim
Há produtos tão dominantes que é difícil imaginar um momento em que não estiveram no topo, mas essa época existiu — e não faz tanto tempo assim
Quando olhamos para Google e WhatsApp, enxergamos gigantes que se tornaram praticamente sinônimos dos mercados em que se situam. Outros players existem, e talvez sejam até bons produtos, mas não alcançaram o patamar em que estes dois se encontram.
O efeito gerado por essa posição dominante é uma dificuldade de visualizar um cenário diferente. Conscientemente sabemos que Google, WhatApp, Netflix e outros líderes de mercado nem sempre ocuparam esse lugar, mas como é que o mundo funcionava antes deles?
Essa percepção é refém do momento, é claro. Todo produto dominante percorreu um longo caminho até se consolidar como a solução mais natural para o público. E, nesse percurso, concorrentes foram deixados para trás. Outras empresas e produtos que talvez tenham sido, eles próprios, os dominantes de sua época.
Mercado pressupõe disputa. Empresas colocam seus produtos na rua e aplicam estratégias para fazê-los se sobressair em relação aos competidores. Dentro dessa dinâmica, sempre há alguém melhor colocado que os demais. É o player que todos querem destronar.
E muitos, de fato, perdem o trono. Há pelo menos dois movimentos que contribuem para isso. De um lado, a ameaça externa: a concorrência pode simplesmente revelar competidores à altura, produtos que conseguem entregar algo semelhante ou superior àquele que lidera o mercado.
De outro, há problemas internos. Decisões equivocadas, problemas de gerenciamento, a falta de um plano coeso para manter a superioridade. Uma empresa pode ficar confortável demais num certo modelo de negócios e não pensar além dele. Ou parar de inovar com um produto que já foi inovador um dia.
Como falamos no Tecnocast 277, quando uma empresa dominante perde a dianteira, normalmente é devido a uma combinação desses fatores. Se as falhas internas e a concorrência externa se encontram na hora certa, as chances de perda da liderança sobem consideravelmente.
Pense na Blockbuster, um império que chegou a ter 9000 lojas. A insistência no modelo das locadoras físicas, combinada ao aparecimento da Netflix, foram ingredientes decisivos da derrocada da empresa.
Os ventos do mercado já apontavam na direção das assinaturas e da digitalização, mas a empresa não soube ler o momento. Assim, foi vencida pela concorrente que oferecia DVDs pelo correio, num modelo de recorrência. A Blockbuster não aproveitou sua posição para explorar outros modelos de negócio, e o mercado não perdoa. A dominante foi ultrapassada.
Há outros casos ainda mais emblemáticos, daqueles que, olhando para trás, fica até difícil de entender como uma empresa pôde perder tanto espaço.
A Nokia é um dos maiores exemplos disso. A gigante finlandesa lançou alguns dos celulares mais emblemáticos dos anos 1990 e 2000. Chegou, inclusive, a ter uma fatia considerável do mercado de smartphones em 2007, com 48,7%. Considerando que hoje Apple e Samsung, juntas, possuem 54,73% do mercado, é um feito extraordinário.
Mas a empresa errou muito. Focou excessivamente em hardware e não deu a atenção devida ao software. Insistiu num sistema operacional próprio, o Symbian, enquanto os consumidores iam mostrando preferência pelos superiores iOS e Android. Demorou muito para entender que estava perdendo tempo com seu OS proprietário.
Quando reagiu, a empresa foi na direção contrário da tendência que se desenhava. Enquanto Motorola e Samsung faziam a escolha pelo Android, a Nokia iniciou uma parceria com a Microsoft, que acabou comprando a divisão de celulares da empresa.
Apesar de ter seus fãs, o experimento do Windows Phone simplesmente não deu certo. Em 2013, a participação da Nokia no mercado havia caído para 3,1%. Os erros de estratégia e os movimentos dos concorrentes selaram o destino da empresa finlandesa.
Mas ela esteve lá, ditando tendências muito antes do iPhone despontar não apenas como um fenômeno cultural e de vendas. Assim como o AltaVista, buscador lançado em 1995, andou antes que o Google pudesse correr, e programas como MSN e Skype nos mostraram o que era comunicação instantânea antes do WhatsApp.
As histórias desses produtos e empresas que ficaram para trás serve como lembrete: ninguém é imbatível, e o dominante de hoje pode perder o posto amanhã.