Gigante chinesa quer brigar com Samsung e frear celular ilegal no Brasil

Oppo é a quinta maior empresa de smartphones do planeta. Ela aposta na fabricação em Manaus e promete dois anos de garantia.

Thássius Veloso
Por
• Atualizado há 2 semanas
Ilustração com retrato de homem sorrindo. Ao fundo aparece a marca da Oppo.
Marco Vorrath, diretor de vendas da Oppo no Brasil, concede entrevista exclusiva ao Tecnoblog (Imagem: Vitor Pádua/Tecnoblog)
Resumo
  • A Oppo retornou ao mercado brasileiro com produção local, em parceria com o Grupo Multi, e já iniciou vendas em varejistas como Magalu. A empresa está focada em estabelecer uma presença significativa no varejo físico.
  • A gigante chinesa pretende desafiar a Samsung e combater o mercado de celulares irregulares, oferecendo produtos com garantia de dois anos para ganhar a confiança dos consumidores e garantir assistência local.
  • A empresa busca se posicionar entre as três principais marcas de smartphones no Brasil, apostando na qualidade de seus produtos e em uma estrutura robusta de vendas e marketing. A Oppo monitora de perto o mercado e as vendas para ajustar suas estratégias e crescer de forma sustentável.

Uma empresa desconhecida de boa parte dos brasileiros fez sua estreia no mercado nacional: a Oppo, que figura entre as maiores vendedoras de celulares do planeta. Aliás, talvez o termo reestreia fosse mais pertinente, já que alguns modelos foram vendidos por aqui há dois anos. Tudo mudou de lá para cá: a ambição da companhia chinesa agora é de peitar a Samsung, ter uma posição de relevo e ainda frear a febre dos celulares ilegais.

Esta é a visão do diretor de vendas Marco Vorrath. Numa conversa exclusiva, ele me contou os bastidores da estruturação da Oppo, com direito a fabricação em Manaus e garantia de dois anos. Confira nas linhas a seguir. O material foi editado para fins de clareza e brevidade.

Celular azul
Oppo A58 se conecta à internet 4G (Imagem: Divulgação/Oppo)

Thássius Veloso – Esta é a segunda investida da Oppo no país. O que mudou de lá para cá?

Marco Vorrath (Oppo) – Aquilo em 2022 foi um experimento com um lote pequeno de produtos e que não tem nada a ver com a operação de hoje. Nós tínhamos um intermediário que fazia a relação comercial. De lá para cá, nós nos prepramos para entrar de forma competitiva no Brasil, começamos a produção com o Grupo Multi (antiga Multilaser) no mês passado e já estamos realizando vendas no Magalu e em lojas online. Este primeiro momento se propõe a ter um varejo com muita presença em loja física. O mercado pode esperar muitos promotores nos pontos de venda.

A liderança da empresa mudou? Quais os aprendizados do que deu certo e errado na primeira investida?

A liderança atual é completamente diferente. Contamos com o David Yuan, nosso CEO no Brasil, e outros executivos que vieram da matriz na China. Não consigo te dizer os aprendizados porque não tínhamos departamentos de vendas ou de marketing, por exemplo. Isto estava sob controle de um intermediário. A nossa estrutura prevê executivos cuidando de várias regiões do Brasil. Embora o mercado de celulares esteja caindo, a Oppo notou que o mercado carece de uma segunda ou terceira marca. Isso vale tanto para o consumidor final quanto para as operadoras e os varejistas, que não querem estar na mão de apenas dois players na categoria intermediária. Eles querem ter mais um coadjuvante forte para poder sacudir o mercado.

A meta é chegar a que posição?

A nossa ambição é figurar no top 3, talvez top 2 nos próximos anos. A gente sabe que não é fácil porque tem marcas muito fortes, como a Samsung, com por volta de 49% de market share, e ainda a Motorola, com a sua capilaridade muito grande e presença no varejo físico. Também tem marcas entrantes, que aspiram este mercado. Nós conhecemos as fortalezas  e qualidades dos produtos da Oppo para encarar este desafio.

Até porque a Samsung abocanha sozinha quase metade das vendas. A minha leitura é de que vocês estão mirando no lugar da Motorola. Acertei?

A gente olha mais para a Samsung! (risos) Se a gente mirar na Motorola, não vai conseguir ultrapassá-la, por isso estamos olhando o líder. Os smartphones da Oppo têm design, câmera, performance e velocidade de recarga com uma proposta mais próxima dos clientes que hoje estão com a Samsung.

A Samsung tem um caminhão de dinheiro. É bizarro o que eles conseguem fazer…

Eu sei, já trabalhei lá, já dirigi esse caminhão.

Se era um caminhão, agora você está dirigindo qual veículo?

Um drone! (risos) Realmente a Samsung tem muitos recursos do ponto de vista institucional, mas eu ouço que eles têm investido menos. A ideia da Oppo é fazer a construção de marca no corpo a corpo, na loja, onde conseguimos propor ofertas mais interessantes. Isso não é viável no online porque ou você mexe no preço, ou dá desconto no Pix. O importante é que o consumidor esteja ciente de que é um bom produto, que dura mais, tem garantia de dois anos.

Essa garantia maior costuma ser paga em alguns lugares.

Os lojistas gostam disso. O pessoal do Magazine Luiza me disse que essa característica seria ruim para eles, pois deixam de vender esse serviço. Nós explicamos que a Oppo precisa disso para que o consumidor confie na marca, além de ser um argumento para desmontar o contrabando de smartphones, que não têm assistência local, garantia muito menos. Sabemos de marcas cujo número de vendas no Brasil é praticamente todo oriundo do mercado irregular.

Fontes da indústria me disseram que a Xiaomi faz brand washing. Ou seja, dão um verniz institucional e oficial para a marca, mas na verdade a expectativa é de que role contrabando porque, no fim das contas, os produtos saíram da mesma fábrica e os chineses foram remunerados. Como é para vocês?

Isso não funciona pra gente porque fizemos um investimento altíssimo. Temos a fabricação local, o time de vendas, o time de marketing, de trade, os investidores… tem muita energia, gente e dinheiro da Oppo no mercado brasileiro para sequer pensar dessa forma. Vamos trabalhar com nossos parceiros para mitigar esta rota. Essa governança foi conversada com Magalu, Amazon e outros aliados.

Essas lojas que você citou possuem market place. Elas vão derrubar as ofertas ilegais?

Eles se comprometeram a fazer isso. Nós estamos começando agora e vamos monitorar a situação. Por exemplo, o Magalu é o nosso parceiro exclusivo em âmbito nacional. Eles já encomendaram e os smartphones estão no inventário. Agora é interessante vender esses dispositivos pois a nossa nota fiscal já foi emitida. É bom pra gente, pra eles, pra indústria e pro mercado como um todo.

Algumas pessoas ficam realmente revoltadas com essa história dos celulares irregulares. Elas admitem que compram mesmo porque custa metade do preço. Se der problema, jogam fora e compram outro. Essa possibilidade te assusta?

Eu monitoro os market places e não tenho encontrado descontos tão agressivos. Normalmente vejo R$ 300 de diferença, algo nessa faixa. Pensando com a minha cabeça de consumidor, te digo que ficaria mais tranquilo em pagar um pouco mais e saber que terei garantia, software brasileiro e mais segurança.

Celular
Detalhes da câmera do Oppo Reno 11 F (Imagem: Divulgação/Oppo)

Qual é o papel da Multi nessa história?

Ela cuida de toda a importação dos componentes, que vão para Manaus (AM) e passam pela produção da placa SMT. Depois eles vêm para Extrema (MG) para a parte mecânica e acabamento. A Multi também cuida da parte fiscal, faturamento e entrega aos varejistas. Nós desenhamos os contratos, preços, prazos de pagamento. Compartilhamos isso e a Multi operacionaliza o fluxo.

Por que vocês escolheram a Multi?

Não posso responder isso com tanta propriedade porque a decisão foi tomada antes da minha chegada à empresa, em janeiro de 2024. Eu sei que ela está localizada em Extrema, com fácil acesso a várias regiões do país. Tem o Ale, que é expert em questões tributárias. Também é uma revenda com canal aberto com varejistas e operadoras. Empresas como Compal e Foxconn não faturam, apenas executam a fabricação. A única outra empresa com toda essa capacidade seria a Positivo, que já está comprometida com um concorrente: a Infinix.

Como será feito o controle de qualidade? Pergunto isso porque muita gente critica os produtos fabricados pela Multi por serem de má qualidade ou estragarem rápido. Mesmo assim, o CEO dela me disse numa entrevista recente que estava feliz com o índice de satisfação dos clientes.

Nós fizemos um investimento pesado num maquinário que a Multi não possuía, mas que era necessário para a fabricação dos aparelhos. Tem engenheiros da Oppo em Manaus acompanhando tudo. Nós até mesmo passamos por algumas intercorrências na primeira fornada, que foram sanadas e os produtos hoje em dia têm o padrão esperado da Oppo. Nós faremos o controle de qualidade e acompanharemos o feedback dos compradores. Além disso, não há vinculação entre a marca deles e a nossa, muito menos uma joint venture. Na traseira do smartphone consta apenas Oppo. Toda a construção do aparelho deve seguir o projeto internacional, fosse ele fabricado na Multi, Compal, Foxconn ou na Flex.

Por que não importar os modelos?

Ninguém dá certo no Brasil quando faz isso. O mainstream depende de grande escala. Essa é uma complexidade adicional do país: ele exige essa manufatura local de quem quer ser grande por aqui. Em outras regiões da América Latina, como Colômbia, Chile, México e Peru, bastaria importar os aparelhos e oferecer o sistema traduzido.

Vocês fazem parte do Grupo BBK, que também possui a Realme, com produtos à venda no Brasil. Existe integração entre as duas empresas? Minha impressão é de que eles até tentam, mas não conseguem decolar.

A nossa operação não tem contato com a da Realme. Não compartilhamos nada. O time da Oppo está focado no sucesso dos smartphones da Oppo.

Pretendem abrir quiosque ou loja em shopping?

Primeiro a gente precisa ser bem-sucedido no que estamos fazendo agora: a chegada no varejo e, em mais alguns meses, numa operadora de telefonia. Isso será determinante para os próximos passos. Agora, é fato que a Oppo possui muitas lojas físicas na China. Ainda estamos ponderando sobre canal direto de market place, mas não batemos o martelo.

O mercado de smartphones passa por turbulências. Nós testemunhamos a ida e vinda da Nokia/HMD e da Xiaomi no Brasil. Já no cenário internacional, a LG saiu totalmente deste negócio e a Sony tem uma atuação super limitada. Como o brasileiro pode ter a tranquilidade de que não é mais um aventureiro que chega, fica um tempo, faz as malas e vai embora?

Eu penso que o mercado é soberano e decide quem fica e quem sai. Se você pegar a lista das maiores empresas da Forbes há 20 anos e comparar com as de agora, vai perceber que 90% dos nomes são diferentes. Isso mostra que o mundo está muito dinâmico. A Oppo é uma empresa jovem, com duas décadas, que está em ascensão. Nós temos um plano muito forte de crescimento, tanto que patrocinamos a Champion’s League, o torneio de Wimbledon e Roland Garros. Estamos investindo pesado também no Brasil, conforme te relatei. Portanto, não estamos entrando para sair. É um projeto muito sério, cheio de tensão e expectativa. A gente monitora vendas por unidade, no dia a dia. Queremos liderar o mercado.

Qual deve ser o contra-ataque da Samsung e Motorola?

Conhecendo como eu conheço, diria que o primeiro ponto é o preço. Todo mundo sabe que a Samsung lança um smartphone por R$ 2.000 e seis semanas depois ele já está 30% mais barato. Talvez a gente tenha que fazer alguns movimentos parecidos. Inicialmente, o comportamento da Oppo deve ser mais próximo da Apple, que dropa menos, principalmente por causa da nossa força no ponto de venda. Eles também podem pressionar intermediários, como varejistas e operadoras. Nós estamos pensando pouco nisso para não nos distrairmos com o que os outros podem fazer. Nosso foco é no nosso plano.

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